Perfil

Quem é Tarcísio de Freitas, o candidato de Bolsonaro ao governo de São Paulo

Em três anos e meio, ‘Tarcisão do Asfalto’ foi de técnico desconhecido do DNIT a um dos ministros mais populares do governo

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Tarcísio de Freitas (à esq.), o candidato de Jair Bolsonaro (à dir.) ao governo de São Paulo / Crédito: Alan Santos/PR

Apadrinhado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), o ex-ministro Tarcísio de Freitas (Republicanos) abraçou um desafio grande para quem disputa pela primeira vez uma eleição: eleger-se governador de São Paulo. Para convencer o eleitorado do estado mais rico do país – e comandado pelo PSDB há 28 anos –, ele pretende se apresentar como um homem pragmático, bom gestor e realizador de obras.

Nos últimos três anos e meio, Tarcísio de Freitas foi de técnico desconhecido do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) a um dos ministros mais populares do governo de Jair Bolsonaro. Militar da reserva formado pelo IME e mestre em Engenharia de Transportes pela mesma escola, o engenheiro chegou ao Ministério da Infraestrutura como um nome técnico e aprendeu rápido a fazer política.

Na pasta, optou pela continuidade de projetos e obras iniciados nos governos anteriores porque sabia que grandes obras de infraestrutura costumam demorar mais do que um mandato para ficarem prontas. A estratégia gerou ao ministro a fama de concluir projetos inacabados. E ele soube trabalhar bem essa narrativa.

Fazia questão de registrar cada inauguração nas redes sociais “por transparência”, mesmo que fosse uma simples entrega de um trecho asfaltado de estrada nos confins do Brasil. “Consegui montar bons times e transformar ideias em realidade. Esse é meu diferencial. Eu me tornei um realizador”, disse Tarcísio de Freitas ao JOTA.

Acabou ganhando dos seguidores do presidente o apelido de “Tarcisão do Asfalto”. Já críticos o chamam jocosamente de “Odorico Paraguaçu”, em referência ao personagem fictício de um prefeito populista. “É dor de cotovelo da oposição”, diz, ao ser questionado pelo JOTA. “Tenho um estoque de realizações para mostrar.”

Dos governos Dilma e Temer ao cargo de superministro de Bolsonaro

Grande parte das estradas inauguradas pelo ex-ministro, muitas vezes em viagens nas quais acompanhava o próprio presidente Bolsonaro em clima de campanha, estão sob responsabilidade do DNIT. Foi neste órgão que, durante o primeiro governo da presidente Dilma Rousseff (PT), o hoje pré-candidato bolsonarista destacou-se como um bom gestor. Chegou ali para fazer a “faxina” prometida pela presidenta após suspeitas de corrupção.

Anos depois, Michel Temer (MDB) assumiu o Planalto, e o engenheiro tornou-se o número dois no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), um centro de governo criado para desenvolver a infraestrutura do país em 2016. Quando Bolsonaro venceu as eleições de 2018, das quais Tarcísio de Freitas sequer participou, ele procurou a equipe de transição para tentar manter o programa.

Após a desistência de alguns militares cotados, acabou ele mesmo nomeado ministro pelo presidente. “[O Tarcísio de Freitas é] uma pessoa fantástica que foi descoberta por nós por acaso”, elogiou Bolsonaro neste mês de julho durante um evento com representantes do agronegócio em São Paulo. Os elogios entre os dois costumam ser recíprocos.

Perfil político mais moderado

Tarcísio de Freitas integra a ala militar do governo Bolsonaro, mas, diferente de grande parte da militância bolsonarista, evita declarações polêmicas e tenta manter distância da guerra ideológica. Na candidatura ao Palácio dos Bandeirantes, o ex-ministro tem nas mãos a tarefa de defender o bolsonarismo e, ao mesmo tempo, afastar-se de radicalismos para conquistar o eleitor mais moderado.

Por isso, costuma voltar-se ao meio termo quando questionado sobre temas polêmicos. Enquanto seu padrinho político vocifera contra as urnas eletrônicas, o ex-ministro tem dito, por exemplo, que acredita nelas, mas que a Justiça Eleitoral precisa dialogar com a parcela da sociedade que desconfia do processo. Tarcísio de Freitas tem afirmado que, durante a campanha, marcará também as diferenças entre o presidente e ele. “O presidente tem um perfil mais combativo, eu sou mais conciliador. Mas queremos a mesma coisa”, diz.

Nos bastidores políticos de Brasília, comenta-se que Tarcísio de Freitas tentou convencer o presidente Bolsonaro da importância da vacinação contra a Covid-19. Ele também buscou diálogo com o então colega de ministério, Sergio Moro, para evitar sua saída do governo. Não obteve sucesso em nenhuma dessas missões, mas já comentou publicamente que o Governo pecou na narrativa em algumas questões. “A narrativa muitas vezes se dissocia do que aconteceu na realidade”, disse em entrevista ao Estadão.

Tarcísio de Freitas é descrito por aliados como um gestor de perfil conciliador e disciplinado. Na sua primeira eleição, ele aparece bem nas pesquisas: está empatado em segundo lugar com o tucano Rodrigo Garcia, atual governador, atrás apenas do petista Fernando Haddad. Em um eventual segundo turno, o petista também lidera, seja na disputa com Tarcísio ou com Garcia, conforme a pesquisa Exame/Ideia, divulgada no início do mês.

Os planos de Tarcísio de Freitas para São Paulo

Como pré-candidato, o ex-ministro diz estar preparado para governar São Paulo porque já foi testado e se sente preparado para resolver problemas. Costuma dizer que o pensamento da esquerda não cabe em São Paulo, estado que ele diz ter vocação para o empreendedorismo e o capital. Questionado então sobre a razão de Haddad liderar as pesquisas, avalia que o petista  tem muito recall. “A última eleição que ele disputou foi de presidente da República. Mas observe que ele não tem muito para onde crescer agora.”

Um integrante de sua equipe de campanha disse ao JOTA que Tarcísio de Freitas deseja desenvolver um programa alinhado com a política econômica federal em São Paulo. Também abraçará o discurso em prol do cuidado com as pessoas e da geração de emprego. A ideia é, como tem divulgado a campanha do ex-ministro, “fazer São Paulo voltar a ser a locomotiva do país”. Ele também tem acenado para os policiais. Sobre a câmera de segurança nos uniformes da polícia, tem defendido que “é mais eficaz vigiar bandido”. A adoção de câmeras nas fardas da PM paulista foi responsável por uma redução de 85% na letalidade policial, no comparativo entre os últimos sete meses do ano passado e o mesmo período de 2020.Em 18 batalhões estudados, o número de mortes passou de 110 para 17.

Antes mesmo de ter sua candidatura oficializada, Tarcísio de Freitas já viajava pelo interior paulista em busca de apoios. Na última semana, foi difícil agendar uma entrevista em razão da intensa agenda. Ele viajou por uma dezena de cidades.

Cada passo era devidamente registrado nas redes sociais, fosse com os adesivaços em veículos, os vídeos cantando um jingle em apoio ao presidente ou nas inúmeras chamadas telefônicas para Bolsonaro durante encontros com apoiadores. “Sempre mando uma mensagem: presidente, tá tranquilo? E aí, quando dá, faço a chamada online. A galera vai à loucura”, contou ao JOTA, entre um compromisso e outro, na véspera da convenção.

A popularidade de Tarcísio de Freitas nas redes sociais

É no ambiente digital, aliás, que Tarcísio de Freitas mantém vantagem sobre seus concorrentes. Ele apareceu à frente de Haddad e Garcia no desempenho nas redes sociais quase todo o tempo nos últimos três meses, segundo o Índice de Popularidade Digital (IPD), criado pela consultoria Quaest.

Tarcísio de Freitas tem 1,3 milhão de seguidores no Twitter. No Instagram, são 1,7 milhão de seguidores, menos que os dois milhões de Haddad e bem mais que os 103 mil de Rodrigo Garcia. Mas Tarcísio guarda ali anos de memória de entregas de obras e faz questão de interagir. No quadro “Tarcisão na Padoca”, por exemplo, está sempre respondendo perguntas feitas pelos internautas, repletas de montagens e memes. O ex-ministro parece conseguir falar bem para os jovens.

Nascido no Rio de Janeiro, Tarcísio de Freitas é casado e tem dois filhos. Flamenguista fervoroso, diz gostar de ouvir sertanejo e de cantar ao som do violão de sua filha. “Canto mal pra caramba”, ri. Aliados o descrevem como um político conciliador, mas também um gestor que gosta de colocar a mão na massa. Católico, disse na sua posse como ministro que Bolsonaro havia sido “escolhido por Deus”.

Foi convidado para disputar o governo de São Paulo pelo presidente num período em que se sentia prestigiado por empresários por conta dos leilões de aeroportos. “Ó, capita, você vai ser meu candidato. Você é a cara de São Paulo”, ouviu de Bolsonaro. A princípio, não acreditou. Mas, aos poucos, viu que ele falava sério e resolveu encarar o desafio. “Nunca pensei em virar político. É algo completamente inusitado”, diz.

A troca do domicílio eleitoral de Brasília, onde morava, para São Paulo com o intuito de seguir a indicação de Bolsonaro gerou questionamentos na Justiça Eleitoral, que acabou permitindo sua candidatura. “É só para inquietar e criar problema”, minimizou ele no início deste mês, durante o evento que concretizou o apoio do PSD à sua candidatura.

A costura política com o partido de Gilberto Kassab agradou Bolsonaro, mas deve colocar como vice de sua chapa um antigo crítico.  Felicio Ramuth (PSD), ex-prefeito de São José dos Campos, chegou a dizer à CBN em abril que Tarcísio “começou mal” ao declarar um domicílio eleitoral que não seria verdadeiro. Agora, as arestas parecem ter sido aparadas.

Tarcísio de Freitas estudou na Academia Militar das Agulhas Negras, a mesma frequentada por Bolsonaro. Mas não é só isso que o aproxima do ex-chefe. Sua postura pragmática ao lidar com comunidades indígenas e ambientalistas que questionam projetos de infraestrutura também o aproximam da visão bolsonarista, a quem ele promete lealdade.

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