Márcio Falcão

Matheus Teixeira

Um dos pareceres utilizados pelos advogados para reforçar a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai defender que o petista está elegível a partir de decisão liminar do Comitê de Direitos Humanos da ONU que deu recomendação para que o Brasil “tome todas as medidas necessárias” para permitir que o petista desfrute e exercite seus direitos políticos da prisão como candidato nas eleições de outubro.
Assinado pelo professor titular da Faculdade de Direito da USP André Ramos Tavares o documento sustenta que se o Brasil não se dobrar ao entendimento do comitê, estará assumindo abertamente o “desprezo com os direitos humanos e com o Estado de Direito”.
O texto, obtido pelo JOTA, afirma ainda que a determinação do órgão não representa “qualquer violação da autonomia dos magistrados ou à independência do Judiciário”, além de fazer um alerta de que o país poderá ser alvo de diversas restrições, por exemplo, de ordem diplomática e comercial nas relações com outros países.  A tese é de que a determinação do comitê vincula diretamente os tribunais nacionais.
“O Brasil inegavelmente submete-se à autoridade do Comitê devendo cumprir suas decisões, mesmo que algum de seus órgãos discorde do comando de alguma decisão (o que pode revelar a pretensão de impugnar a decisão em âmbito internacional, mas não a sua violação doméstica imediata). A violação a essa decisão seria contrária ao direito interno brasileiro, além de poder acarretar sanções contra o Brasil na esfera internacional”.
“O Poder Judiciário age com autonomia na interpretação do Direito, no entanto, essa autonomia não o autoriza a ignorar o Direito vigente nem os tratados de direito internacional que passaram a integrar  a ordem jurídica nacional, nos termos já explicitados”, completou.
O professor da USP compara a decisão do comitê à previsão da própria Lei da Ficha Limpa para suspender a inelegibilidade. “A suspensão da inelegibilidade nos termos do referido artigo da Lei Ficha Limpa é a única forma de leitura juridicamente adequada desse diploma legislativo ao caso concreto, a partir da decisão proferida pelo Comitê de Direitos Humanos.”
Responsável pela defesa do registro de Lula no TSE, o advogado Luiz Fernando Pereira sustenta que uma das principais teses da defesa é sobre a vinculação da ONU. “Não existe pacto em direitos humanos sem submissão ao comitê. Seria o mesmo que conferir à Venezuela dizer o que é ou não Direitos Humanos”, disse
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No texto, Lula sustentará que há precedentes de diversos países que respeitaram pronunciamentos similares da ONU e que apenas nações com baixíssimos níveis de democracia costumam ignorar as decisões deste comitê.
"O Tribunal Eleitoral do México já se defrontou com uma liminar do Comitê de Direitos Humanos da ONU, desse mesmíssimo colegiado e respeito”, diz uma das advogados de Lula no TSE, Maria Claudia Bucchianeri.
Além de Ramos Tavares, também será anexado ao processo pareceres de Fabio Konder Comparato e Marcelo Pelleegrino. Além disso, os advogados de Lula vão citar decisões de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e pareceres da Procuradoria-Geral da República que defendem o efeito vinculativo de tratados internacionais.
A defesa ainda suscitará uma preliminar em que alega não haver previsão legal que permita o julgamento de uma liminar para proibir a aparição em propaganda eleitoral antes da análise do pedido de registro da candidatura.
A peça tem cerca de 200 páginas e deve ser protocolada à noite. Nas preliminares, os advogados sustentarão ser impossível julgar o pedido de liminar apresentado pelo Partido Novo para que Lula não possa praticar nenhum ato de campanha, inclusive aparecer no programa eleitoral, mesmo antes da análise do registro.
“A lei nos assegura isso, o artigo 16-A é muito claro, que fala inclusive a participação em programa de rádio e televisão. Não há registro histórico no TSE de decisão liminar nesse sentido, seria inédito. Ao contrário, quando tribunais regionais se animavam a dar liminares nesse sentido, o TSE revogava as decisões”, disse.
“É exatamente por entender que a tese é profunda, ela levanta muita divergência, que o TSE nunca enfrentou, que a gente realmente não acredita em qualquer tipo de medida liminar, porque ela parte de premissa de que o registro seria chapadamente indeferido. Só que se tenho uma questão preliminar que é constitucional, é profunda e instaura muito debate fica muito delicado eu dizer que a tese do Lula é flagrantemente desprovida de razão a ponto de justificar uma liminar que o tribunal nunca deu”, diz.
Ela também defende que a instrução do processo de pedido de registro ainda não foi finalizada e que não há como julgar o requerimento na sessão extraordinária convocada para sexta-feira.
“Nós apresentamos um documento novo e pela lei o Tribunal deve abrir prazo para a outra parte, no caso, quem apresentou as impugnações, se pronunciar novamente”, disse. Ela acredita ser mais viável o relator, ministro Roberto Barroso, diminuir o prazo para alegações finais e levar o caso a julgamento na próxima terça-feira do que dispensar essa etapa processual.

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JOTA

Advogados vão citar decisões de ministros do STF e pareceres da PGR sobre efeito vinculativo de tratados 

Ao TSE, defesa de Lula dirá que ignorar comitê da ONU é desprezar Estado de Direito

Defesa de Lula apresentará defesa com 200 páginas ao TSE em que sustenta que a decisão da ONU deve ser respeitada e que outras nações sempre a observaram