Agressão

Juíza auxiliar de Fachin denuncia ofensas xenófobas de diretor da British Petroleum

Apoiador de Bolsonaro, diretor da petrolífera disse que Lula só foi eleito graças a votos da Bahia, estado que ‘não produz nada’

juíza Clara da Mota Alves
Juíza Clara da Mota Santos Pimenta Alves. Crédito: TRE-MT

A juíza Clara da Mota Santos Pimenta Alves, auxiliar do ministro Edson Fachin no Supremo Tribunal Federal (STF), denunciou à Polícia Federal ter sido vítima de agressões xenofóbicas feitas por Adriano Bastos, diretor da petrolífera britânica British Petroleum (BP) no Brasil, na última sexta-feira (4/11).

Segundo a magistrada, ela participava de uma confraternização em uma pizzaria em Cuiabá, acompanhada por uma amiga e duas filhas. Bastos e um homem identificado apenas como “Rodolfo”, que se dizia advogado, se aproximaram da mesa e passaram a ofendê-la, afirmando que a eleição presidencial havia sido fraudada.

O diretor da BP, conforme a denúncia, manifestou descontentamento com o resultado da eleição e iniciou uma série de agressões relacionadas ao estado natal da juíza, a Bahia, dizendo que o estado não “produz nada”.

Bastos também teria dito que Luiz Inácio Lula da Silva só foi eleito graças a votos dos baianos, de “assistidos”, e de “funcionários públicos” que “não trabalham” e “não fazem nada”.

Alves diz que, diante dos ataques, não reagiu em razão do seu cargo e apenas reafirmou a “notória lisura” do processo eleitoral brasileiro. Ela contou ter deixado o estabelecimento “sentindo humilhação e profundo constrangimento”.

“Durante o ataque, assustada e constrangida, uma de suas filhas pediu à Sra. Clara que ela ‘aguentasse’ as agressões sem fazer nada. Frise-se que a Sra. Clara e suas filhas eram as únicas pessoas de origem baiana no recinto e que a Sra. Clara era a única funcionária pública, não havendo quaisquer outros possíveis destinatários das ofensas, proferidas em público, no ambiente de um restaurante, em mesa na qual estavam sentadas cerca de 12 pessoas”, narra documento encaminhado pelos advogados da juíza à empresa.

Os advogados afirmam que a conduta do diretor viola o código de conduta da BP, o qual informa que a empresa respeita o país em que opera, bem como suas leis e regulamentos. A defesa salienta que as agressões se caracterizam como injúria qualificada (em virtude da origem do ofendido) e pede que a petrolífera adote medidas cabíveis para interromper episódios discriminatórios e “novas investidas do seu ‘Head of Country’ [Adriano Bastos] no Brasil.

“Lastimando-se profundamente a conduta ora trazida ao conhecimento desta Companhia, perpetrada por quem a representa em público para todos os fins, espera-se que a BP adote postura de cumprimento do seu código de conduta e de concretização de política de integridade, notadamente na sua feição não-discriminatória”, pedem os advogados.

A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) repudiou os “graves insultos” sofridos pela juíza e disse que ataques desse teor não serão admitidos.

“A liberdade de expressão não deve jamais ser confundida com liberdade de agressão ou de se manifestar com intolerância ou de forma discriminatória, por simples discordância de pensamento. Ataques dessa natureza a magistrados e magistradas federais não serão admitidos”, manifestou-se a associação em nota.

A entidade reforçou a confiança nas urnas eletrônicas e afirmou que acompanhará a apuração dos fatos, “esperando que os agressores sejam devidamente responsabilizados e punidos, inclusive na esfera criminal”.

“Para a Ajufe [a agressão] é violência política manifestada por meio de inaceitáveis atitudes preconceituosas, autoritárias, antidemocráticas e que propaguem o ódio e a intolerância. Agressões misóginas e xenófobas contra qualquer cidadão, como a que foi sofrida pela Magistrada Federal, revelam completa falta de humanidade, respeito, empatia e civilidade por parte dos agressores e constituem crime que deve ser punido com todo o rigor da lei”.

Procurada pelo JOTA, a BP Brasil disse que está apurando o ocorrido e que “adota robustas regras de compliance no desenvolvimento de suas atividades e preza pelo respeito à diversidade e inclusão, em todos os países nos quais atua”. Também afirmou reconhecer “o compromisso do Brasil com a democracia” e reforça que estará “ao lado do governo brasileiro para produzir soluções em energia para o país”.