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Alta em pedidos de anulação de sentença estimula insegurança sobre arbitragem

Embora ações no Judiciário não invalidem as decisões, elas podem gerar atrasos, minando o foco da alternativa extrajudicial

Foto: Unsplash

Já se vão 27 anos desde a edição da lei que disciplinou a arbitragem no Brasil. Desde então, houve uma consolidação do uso do método destinado a resolver litígios fora do Poder Judiciário, que tornou mais rápida a solução de conflitos entre empresas. Na esteira desta consolidação, também se avolumam os pedidos de anulação das sentenças, que levam o conflito para a Justiça e impõem incertezas sobre o instrumento. 

Para especialistas, esse movimento é resultado da disseminação do uso da via extrajudicial e pode servir a certos casos. Ao mesmo tempo, seria preciso garantir que a arbitragem não se transfigure em uma espécie de primeira instância do Judiciário, em vez de uma alternativa extrajudicial que visa dar mais celeridade às disputas.  

Dados da plataforma JusBrasil mostram que, entre 2019 e 2020, o volume de ações anulatórias de sentenças arbitrais cresceu 11%, passando de cerca de 1,5 mil para 1,7 mil.

Porém, na maior parte das vezes, o pedido de anulação é rejeitado – em 2020, apenas cerca de 5% dos pedidos de anulações foram atendidos pela Justiça, o que indica que, na ampla maioria dos casos, não existem os requisitos necessários para ordenar uma nova sentença arbitral. 

“O maior número de pedidos de anulação que chegam ao Judiciário é fruto da busca pela arbitragem como solução de conflito que cresce ano a ano. Quanto mais ações de arbitragem são abertas surgem também questionamentos pelos envolvidos nos processos”, comenta o advogado José Rogério Tucci, professor da Universidade de São Paulo. Ele acrescenta que, por enquanto, “a percepção de que a arbitragem é um bom caminho segue importante”.  

Os limites para essas ações devem ser as hipóteses previstas em lei, que são limitadas e demandam cumprir certos requisitos. O artigo 32 da Lei de Arbitragem (9.307/ 1996) estabelece que o Judiciário pode intervir apenas quando há comprovação de violação do contraditório, da igualdade das partes, do livre convencimento e da imparcialidade do árbitro, por exemplo. Assim, seria ilegal qualquer outra intervenção além das circunstâncias previstas. 

A questão é que, além dessas situações com amparo legal, outras também chegam ao Judiciário. O aumento dos pedidos de anulação de sentença arbitral acende um alerta sobre a possibilidade de usar essa estratégia para ganhar tempo, com decisões protelatórias, adiando o cumprimento integral da sentença. 

Tal iniciativa gera apreensão e insegurança nas empresas que firmam contratos com cláusula arbitral – ficaria a impressão de que não há, de fato, garantia que a arbitragem seria a via final para resolução de um eventual conflito. 

Nessa linha, se o Judiciário passa a ser visto como a instância de recurso da arbitragem, pode haver um desestímulo à opção pelos meios extrajudiciais de solução de conflitos. Em última análise, como a resolução por meio desses formatos se tornou, nos últimos anos, uma demanda global, o ambiente de negócios do país também é impactado negativamente.

“É possível que se busque apenas ganhar tempo, como ocorre no Judiciário. Não podemos esquecer que a parte perdedora tem o direito de questionar, mas somente dentro do previsto na legislação, e quem ganhou também pode apontar o atraso”, comenta o especialista.

Também se deve atentar que a estratégia envolve custos: “Quem pede a anulação sem fundamento e perde tem um custo, o da sucumbência, que é alto nestes casos”

Para Lucas Akel Filgueiras, especialista em litígios societários e sócio fundador do escritório Akel Advogados, apesar de a Lei da Arbitragem restringir os casos em que caberia o pedido, alguns dos itens poderiam ser mais claros para evitar abusos.

Na maioria dos casos, a imparcialidade do árbitro é questionada sem argumentos robustos. “Este é o principal motivo dos pedidos de anulação de sentenças e merece maior esclarecimento”, afirma. 

Em uma ação anulatória, o magistrado também não deve analisar o mérito da disputa levada à arbitragem, mas apenas aspectos formais do procedimento, como rege a legislação. “Questionamentos enviados ao Judiciário não deveriam ser impeditivos ao cumprimento da sentença arbitral, apenas se houvesse uma liminar, o que é raro”, complementa Akel. 

Professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo, o advogado Luciano Godoy explica que, mesmo quando o Judiciário é acionado, a decisão sobre o mérito da disputa ainda deve ser conferida via arbitragem.

Quando se anula uma decisão arbitral, a Justiça precisa devolver o caso para a Câmara Arbitral para que ela reformule a sentença. “Há um novo julgamento do conflito, que permanece na arbitragem, escolhida pelas partes para dissolução da disputa”, pontua. 

Ao mesmo tempo, o Judiciário precisa estar atento às fronteiras de sua atuação com respeito à decisão pela via extrajudicial, escolhida justamente pelo seu potencial de escapar do congestionamento de processos que a Justiça enfrenta no Brasil.