Inovação

Falta de leis e baixo investimento público geram dificuldade para inovar na indústria

Pesquisa da CNI demonstra que empresários buscam inovar, mas esbarram em instabilidade política e econômica

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Crédito: Unsplash

As indústrias brasileiras têm investido em inovação, mas o caminho para o Brasil se tornar inovador ainda é longo. Falta incentivo público. Pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI), realizada pelo Instituto FSB Pesquisa e divulgada em outubro, mostra que 80% das indústrias inovaram durante a pandemia de Covid-19 e tiveram aumento de lucro, produtividade e competitividade. Só 1% delas inovou e não viu incremento algum em seus resultados.

Em contrapartida, embora haja esforço das empresas, o país ocupa apenas a 57ª posição entre 132 países no Índice Global de Inovação (IGI) 2021, o principal medidor mundial da categoria. As principais dificuldades, aponta a pesquisa, são o acesso a recursos de fontes externas, citado por 19% dos entrevistados, instabilidade no cenário externo (8%), contratação de profissionais (7%) e falta de mão de obra qualificada (8%).

“Não é uma colocação compatível com a importância e o tamanho da economia brasileira. Ocupamos uma posição mediana e, nos últimos dez anos, caímos dez posições. O Brasil já chegou a ocupar a 47ª posição, mas nós éramos a sétima economia do mundo. Existe uma correlação direta entre as capacidades dos países de inovar e a de gerar desenvolvimento e riqueza”, comenta Gianna Sagazio, diretora de Inovação da CNI.

A causa da posição incômoda está relacionada diretamente à ausência de investimentos públicos e de leis e marcos regulatórios de longo prazo que propiciem segurança jurídica para o desenvolvimento das empresas, de acordo com Sagazio.

“Não temos políticas públicas de ciência, tecnologia e inovação com visão de longo prazo, robustas. Não temos o financiamento adequado à área de ciência, tecnologia e inovação. As instituições estão sem receber os recursos que deveriam para poder gerar a ciência e inovação que o país precisa”, lamenta a diretora.

Ela cita como exemplo o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), principal fonte de financiamento à inovação no país, que chegou a ter 90% de contingenciamento em 2020. Neste ano, a projeção é que o FNDCT arrecade R$ 7,2 bilhões, sendo R$ 5,5 bilhões para projetos não reembolsáveis. No entanto, se for mantida a previsão orçamentária tal como foi sancionada pelo Congresso, somente R$ 400 milhões em recursos não reembolsáveis estarão disponíveis para a realização de pesquisas e projetos de inovação, com um total de R$ 5,1 bilhões contingenciados.

“Ciência, tecnologia e inovação deveriam ser uma prioridade do nosso país e não consideradas como gasto, sujeito a contingenciamentos e cortes. Essa área é que vai trazer um futuro para nosso país. Para desenvolver tem que investir. É básico e, sem investimento, o gap vai ficar cada vez maior. O Brasil tem potencial para ser muito mais do que está se mostrando”, afirma Sagazio.

Mesmo diante da crise e das dificuldades de financiamento, alguns empresários conseguem ir contra a maré e crescer. É o caso de Marco Stefanini, CEO da multinacional Stefanini, uma das maiores companhias brasileiras de tecnologia da informação (TI). 

Presente em 41 países, a empresa superou os entraves brasileiros e conseguiu chegar a um faturamento de cerca de R$ 4 bilhões em 2020.

Para desenvolver a multinacional, Marco apostou em modernizar tanto a gestão interna quanto a relação com o mercado. Outras iniciativas que deram resultado foram o projeto “Stefanini Everywhere”, que busca identificar e contratar talentos com ajuda de uma solução de inteligência artificial, e o chatbot Sophie, plataforma de inteligência artificial para atendimentos online.

O empresário ressalta que o processo de transformação digital e de inovação é “dolorido” e pode durar anos para dar resultados. Ele lamenta a instabilidade jurídica do cenário brasileiro e “distrações” causadas por problemas políticos e econômicos constantes.

“Como o cenário político e econômico brasileiro é muito conturbado hoje, de certa forma você acaba gastando energia e tempo para manobrar a empresa diante desses períodos turbulentos. Infelizmente, a instabilidade jurídica acaba trazendo uma distração”, afirma Stefanini, para quem a única saída da indústria brasileira é inovar.

Para tentar amenizar os problemas, a Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI), uma iniciativa composta por mais de 400 lideranças e coordenada pela CNI, tem buscado promover iniciativas junto à indústria e interlocução entre os líderes das empresas e os entes públicos.

Além de ações como a criação da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), o Edital de Inovação para a Indústria e os Institutos Senai de Inovação e dos Centros de Inovação e Tecnologia do Sesi, a MEI tem atuado na formulação de políticas e de proposições de projetos voltados para o aprimoramento da inovação no Brasil.

Uma das articulações de destaque foi feita com o senador Izalci Lucas (PSDB-DF), para quem foi apresentado o Projeto de Lei 2.838/2020, que visa a melhoria da Lei do Bem, norma que tem o fim de conceder incentivos fiscais às empresas que investem em pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica. 

A proposta busca incentivar pequenas empresas e criar licitações públicas destinadas à contratação de soluções inovadoras, por exemplo. Também reconhece a figura do “investidor anjo”, que não será sócio da empresa, mas poderá participar das deliberações de forma consultiva. Os investidores terão a opção de comprar ações da empresa futuramente ou resgatar títulos emitidos por beneficiários. O “anjo” não responderá por dívidas do negócio.

“A ideia é aperfeiçoar o sistema. A inovação acontece muito nas pequenas e microempresas, com as mudanças de processo, mas essas empresas estão fora da Lei do Bem hoje. Temos que incluí-las para que possam utilizar os resultados, independentemente de prejuízo, para incentivo fiscal”, explica o senador. “Você não faz ciência com discurso. Tem que meter a mão no bolso”.