Estúdio JOTA

O secretário-executivo do Ministério da Cultura (MinC), Márcio Tavares, disse que a pasta defende que os criadores sejam remunerados pela autoria do trabalho que desenvolvem, caso as obras sejam usadas no desenvolvimento de ferramentas de Inteligência Artificial Generativa. Segundo ele, isso seria assegurado inclusive por leis já existentes, que garantem direitos amplos de propriedade intelectual.
O assunto é atualmente discutido no Congresso, no PL de Inteligência Artificial (PL 2338/2023), atualmente tramitando no Congresso. Sob o viés do desenvolvimento econômico da Cultura, ele tem chamado a atenção do MinC. 
“Na nossa opinião, o relatório do Senado é bom e garante a remuneração dos agentes criadores. Precisamos que as obras criativas usadas no desenvolvimento da inteligência artificial generativa tenham seus criadores remunerados nesse processo, além de criar um ambiente de proteção para trabalhadores potencialmente afetados pela IA. Temos muitos trabalhadores que se sentem ameaçados”, afirmou Tavares.
A fala foi feita em um painel da série<a href="https://www.jota.info/especiais/rumos-do-brasil-08032023"> Rumos do Brasil</a>, realizada pelo JOTA em parceria com o Xavier Vasconcelos Advogados, em Brasília, nesta quarta-feira (28/8). O secretário-executivo respondeu a perguntas de Carla Nascimento, sócia do Xavier Vasconcelos Advogados; Edoardo Ghirotto, analista do JOTA; e Thiago Guimarães, criador do canal Ora Thiago. O evento teve patrocínio do YouTube.
Um exemplo desse cenário de preocupação apontado por Tavares seria em relação aos dubladores, que tem sua voz como instrumento único de trabalho e que, em um mau contrato, poderiam entregar sua voz para alimentar sistemas de inteligência artificial e não receber mais um retorno. Enquanto isso, a voz continuaria a ser usada para inúmeras produções. 
<img class="wp-image-511897 size-large" src="https://portal.jota.info/wp-content/uploads/2024/08/mg-1192-1024x683.jpg" alt="" width="1024" height="683" /> Carla Ávila, sócia do Xavier Vasconcelos Advogados; Edoardo Ghirotto, analista do JOTA; Márcio Tavares; e o criador Thiago Guimarães | Foto: JOTA
<h3>Fortalecimento da Cultura</h3>
Márcio Tavares também enfatizou a ampliação dos investimentos no setor para o desenvolvimento cultural, artístico e econômico do país. Segundo ele, os governos democráticos mundo afora têm levado adiante a ideia de uma pasta voltada à cultura cada vez mais forte, e na atual gestão a pasta tem centralidade na gestão do governo. 
Ele explicou que o Ministério surgiu pela primeira vez durante o processo de redemocratização do Brasil, no final da década de 1980. Em sua esteira, a Constituição garantiu os direitos culturais, sendo dever do Estado brasileiro garantir a criação e a fruição cultural. 
“Estamos construindo nos últimos 40 anos uma democracia fundada principalmente no que o Brasil tem de mais especial: a sua diversidade. E o país precisa apontar suas diferenças como potencial de criação de coisas novas. O lugar da cultura é o de contato com a diferença e de criação de soluções criativas a partir delas”, disse.
Segundo o secretário-executivo, atualmente, a economia mais dinâmica é a que se desenvolve a partir da chamada economia criativa. Conforme destacou, atualmente cerca de 3% do PIB brasileiro é resultado desse segmento, de acorco com pesquisa do Itaú Cultural. 
Por isso, ele entende que é preciso um Ministério da Cultura que garanta políticas públicas que gerem oportunidades para o setor. E também enfrentar desafios relevantes, que afetam sobretudo as condições de trabalho e renda dos profissionais. 
Dados da pesquisa Sistema de Informações e Indicadores Culturais, divulgada no final de 2023, apontam que a taxa de informalidade era de 43% na área cultural – proporção que está acima da média da economia. Além disso, 42% dos trabalhadores atuam por conta própria. 
"Sete milhões de trabalhadores estão atuando nessa área, mas o nível de instabilidade é enorme. Na pandemia da Covid-19, vimos o potencial devastador disso. Também temos nos debruçado a entender o estatuto do artista em outros países, como na Espanha”, disse ele. 
“Fazemos política cultural para os mais de 200 milhões de brasileiros, mas não fazemos isso sem os artistas, sem aqueles que produzem, sem os agentes culturais”, destacou. 
De acordo com Tavares, isso pressionou a pasta a gerar políticas públicas cada vez mais dinâmicas. “Na pandemia, vimos que precisamos ter projetos de alcance nacional. Acompanhamos um processo bonito desse setor buscando no poder público esse respaldo, e isso em uma época em que o governo era refratário a essas políticas”, complementou o secretário. 
<h3>Leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo</h3>
Em diversos momentos da entrevista, Márcio Tavares enfatizou que o objetivo do Ministério é fomentar políticas para que os criadores de diferentes territórios tenham condições de produzir e difundir suas produções, garantindo a democratização do acesso à cultura. 
Em dados e exemplos, ele mostrou como a Lei Paulo Gustavo e a Lei Aldir Blanc têm alcançado estados e territórios em que antes outros incentivos não chegavam. 
“Aquelas culturas que emergem nos bairros periféricos e nas favelas, que geralmente não têm acesso a fomento, vão ter anualmente cercade R$ 400 milhões garantidos para pontos credenciados. Imagina o impacto da continuidade dessas politicas para as comunidades. Isso certamente vai mudar para melhor o ambiente cultural”, disse ele. 
Segundo o secretário, a partir da Lei Aldir Blanc, da Lei Paulo Gustavo e de mudanças na Lei Rouanet, a pasta ministerial está conseguindo ter um volume de fomento, desde o ano passado, "incomparável com qualquer momento da história brasileira". 
A expectativa dele é que isso mude não só o cenário cultural, mas a dinâmica e o volume de criadores, que vão enxergar na cultura e na arte oportunidades de fazer disso não só meio de expressão, mas profissão, de transformação e de desenvolvimento do país.
<h3>Investimentos do audiovisual</h3>
Um dos setores discutidos na entrevista foi o do audiovisual nacional. “Entre 2016 e 2022 já ficamos estagnados nesse debate. Já perdemos muito tempo, então agora é hora de botar o pé no acelerador para que tenhamos um desenvolvimento adequado do audiovisual brasileiro”, disse Tavares. 
Ele conta que a regulamentação dos serviços de vídeo sob demanda (plataformas de streaming), em debate no Congresso, é um projeto prioritário. "Para que o setor se desenvolva é preciso haver regulamentações simétricas entre todas as janelas do universo audiovisual. Outras áreas do setor, como as etapas de produção e distribuição em salas de cinema estão regulamentadas, mas as plataformas digitais, não". 
O ministério identificou que o Brasil é grande consumidor desses serviços – e com potencial para um aumento exponencial. Entretanto, o investimento interno e externo no setor não tem sido proporcionais e, na visão dele, um dos motivos é a falta de uma regulamentação clara. Nesse sentido, o objetivo seria gerar boas condições para essa indústria, fomentar a difusão de obras nacionais e proteger a produção independente.
“Hoje, vemos países menores do que o nosso, que não tem tanta diversidade cultural, sem o elenco de histórias possíveis que temos para contar, sendo consumido ativaente no mundo. Podemos continuar consumindo, claro, mas também temos muita coisa boa para mostrar e gente boa pra fazer”, destacou. 
Para o secretário-executivo, todas as ações do Ministério tem como objetivo criar um ambiente de estímulo e segurança que afirme que a diversidade brasileira. E para que, a partir disso, emerjam histórias a serem contadas para o Brasil e para o mundo. 
“Inclusive sobre como viver na emergência climática, sobre o bem-viver dos povos indígenas. Precisamos disputar as narrativas de forma positiva para, citando [o escritor] Ailton Krenak, adiar o fim do mundo, que está cada vez mais próximo”, disse. 
Assista à entrevista completa:
https://www.youtube.com/watch?v=rAhZ6rFGzWE

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