
Já comum para os brasileiros, a entrega anual do Imposto de Renda feita por um software talvez seja o exemplo mais antigo de como o país já possui serviços digitalizados. O ranking GovTech Maturity Index 2020 do Banco Mundial, divulgado ano passado, colocou o Brasil em 7º líder mundial em governo digital.
As dificuldades enfrentadas pelo Brasil para que governos — federal, estadual e municipal — avançam nesse processo e as oportunidades para a digitalização da administração pública foram o tema do webinar da CASA JOTA, com patrocínio da Microsoft, realizado nesta terça-feira (28).
O Índice de Maturidade GovTech do Banco Mundial avalia quatro aspectos: suporte aos principais sistemas de governo, aprimoramento da prestação de serviços, integração do engajamento do cidadão e incentivo às habilidades digitais das pessoas no setor público, ao regime legal e regulatório apropriado, à capacitação e à inovação. Justamente os tópicos abordados pelos participantes do evento.
Elias Abdala, diretor de políticas públicas da Microsoft, afirmou que, com a pandemia de Covid-19, temos a oportunidade de pensar em como podemos evoluir e trazer melhores serviços aos cidadãos.
“Temos o desafio de olhar para esse tema para que os exemplos de excelência contaminem não só o governo federal, como municipal, estadual, e que seja um norte estratégico para outras ações. Pensando desde a formulação de políticas públicas até na questão cultural”, disse.
Wesley Vaz, secretário de Fiscalização de Integridade de Atos e Pagamentos de Pessoal e de Benefícios Sociais do Tribunal de Contas da União (TCU), ressaltou que hoje já não é possível existir um governo sem o suporte da tecnologia.
“E é um processo que não acaba. Quando alguma outra tecnologia melhor está presente, temos que trocar. Quando falamos em governo digital, estamos falando em eficiência. Quando falamos em política pública, por exemplo, temos o pagamento de benefícios sociais”, explicou Vaz. “Com uso da tecnologia temos fiscalizações contínuas para checar se há indícios de irregularidades e enviamos ao gestor para que ele próprio possa averiguar. Esse tipo de mecanismo faz diminuir o risco”, acrescentou.
O secretário também afirmou que essa transformação digital não acontece sem recurso. “Quando o TCU diz para revisar um corte orçamentário, para não retroceder na política pública, é porque vai impactar o cidadão”.
Ele também disse que para mudar um governo é preciso mudar a mentalidade dos servidores públicos. “A transformação digital não é só comprar uma tecnologia e jogar dentro do órgão público. O caminho para evolução é o aumento da capacidade dos servidores públicos entenderem o impacto da tecnologia na gestão. É preciso capacitar esses profissionais para o uso da tecnologia. A partir dai fica mais fácil”, explicou Vaz.
Paulo Teixeira, deputado federal (PT-SP), destacou a necessidade de ampliar a participação da sociedade no processo de transformação digital do governo.
“Temos uma sociedade complexa de mais de 200 milhões de pessoas, que precisam ser ouvidas, e o melhor mecanismo é o digital. Ao mesmo tempo, o governo precisa entregar serviços de forma mais rápida. Hoje, temos um governo que não consegue entregar serviços”, argumentou o deputado. E continuou: “É um governo opaco, porque briga com dados, não gosta de transparência. Houve aumento da fila do INSS, problemas com dados da Saúde, do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), sigilo de 100 anos em gastos do governo. Temos que inaugurar um novo tempo de governo transparente e digital”.
Nelson Marconi, economista, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV-EAESP) e um dos coordenadores do programa de governo do pré-candidato à Presidência da República Ciro Gomes (PDT), falou sobre a necessidade de aprimorar a prestação de serviços do governo.
“Temos uma série de portais do governo, de acesso via sistemas, mas não é só isso. Precisamos popularizar os serviços por celular, como as políticas sociais. Para ter o conjunto que entendemos como governo digital, precisamos de um investimento muito grande. Preciso ter uma infraestrutura adequada de transmissão de dados, de velocidade, de acesso a essa rede, de processamento”, afirmou Marconi.
Já Leonardo Selhorst, secretário de Modernização da Administração Federal do governo Jair Bolsonaro (PL), destacou a importância do portal Gov.br.
“Quando começamos uma estratégia digital em 2019, o Gov.br já existia. O governo passa, mas a política de transformação digital tem que permanecer porque está acima de qualquer governo”, argumenta. “Hoje, nós temos quase 5 mil serviços no portal do governo e agora temos outra discussão: isso está disponível para todo mundo? Esse é o trabalho que temos feito agora. A questão de conectividade e da integração das informações é muito importante”, afirmou o secretário.
Ponto unânime entre os participantes foi que para aumentar o acesso da população aos serviços públicos digitais já existentes, a inclusão digital é fundamental.
“Para conceder o auxílio emergencial, o governo não suou o SUAS (Sistema Único de Assistência Social), que é uma política de Estado. Criou um cadastro específico em uma plataforma específica. Mas grande parte das pessoas que têm o direito a receber o benefício não tem acesso à internet. A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) teve que ir às ruas para cadastrar as pessoas”, afirmou Paulo Texeira.
Marconi defendeu que investimentos públicos, como orçamento para ciência e tecnologia, não estejam vinculados ao teto de gastos. “A questão orçamentária é muito difícil, a partir do momento que a gente tem um texto de gasto, ele comprimi o investimento público. Precisamos de uma reforma tributária e fiscal”, disse o economista.