Reforma Tributária

“Desoneração da cesta básica é um problema, não ganho”, diz professor da FGV

Leonel Pessoa, professor de direito da FGV, defende que a alíquota única é a melhor saída para a reforma tributária

comitê gestor do IBS
Crédito: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

A reforma tributária em discussão no Congresso Nacional é necessária para o país, ainda que o texto aprovado pela Câmara dos Deputados não seja unânime: esse é o consenso de economistas, advogados tributaristas e políticos que se reuniram nesta sexta-feira (18/8) no Insper, em São Paulo, para discutir o tema.

Entre os pontos mais criticados, estão as exceções que o texto cria para a alíquota única. Leonel Pessoa, professor de direito da FGV, defendeu que nem mesmo a desoneração da cesta básica é um ganho. “Do ponto de vista da eficiência, a gente tem quase um consenso contemporâneo de que a alíquota única é a melhor solução”, disse Pessoa.

O professor afirma que há mecanismos mais eficientes para beneficiar a parcela pobre da população, como o próprio Bolsa Família. “Desonerando a cesta básica, os ricos vão ter parcela do consumo deles desonerada também. É um dinheiro que poderia estar sendo alocado só para os pobres”, diz.

O problema, na visão de Pessoa, é que há uma falsa percepção na opinião pública de que uma alíquota menor equivale a um preço mais baixo. Um estudo coordenado por ele e pelos pesquisadores Maurício Canêdo e Melina Rocha mostrou que não é bem assim. Os pesquisadores analisaram o repasse de todas as alterações do ICMS ocorridas nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia para uma cesta com 79 produtos alimentícios entre 1994 e 2021. Verificou-se, na média, que a cada ponto percentual de variação no ICMS gerou apenas 0,13% de variação nos preços.

Outro problema apontado pelo professor é que conforme se criam exceções à regra, mais contribuintes vão tentar encaixar seu bem na alíquota mais baixa, o que resulta em um contencioso tributário gigantesco.

Breno Vasconcelos, advogado e pesquisador do núcleo de pesquisas em tributação do Insper, concorda que quanto menos tratamentos diferenciados a reforma tiver, melhor. “As exceções não vão impactar só a definição da alíquota padrão, mas também os efeitos positivos esperados de redução de contencioso e de custo de conformidade”, disse o advogado.

O núcleo de pesquisas em tributação do Insper fez um estudo para dimensionar o tamanho do contencioso tributário para as companhias brasileiras. No levantamento, os pesquisadores consideram 232 companhias abertas que tinham processos envolvendo os cinco impostos sobre consumo que são alterados pela reforma: PIS, Cofins, ISS, ICMS e IPI. No total, os processos delas somavam R$ 120 bilhões.

“Percebemos que se a PEC tivesse sido aprovada há 30 anos atrás esse contencioso quase não existiria hoje”, disse Vasconcelos. Segundo dados do estudo, quase 90% dos processos envolvendo PIS/Cofins, por exemplo, seriam resolvidos com a aprovação da reforma. Vasconcelos, no entanto, aponta que o estudo foi feito usando uma versão anterior do texto aprovado pela Câmara – na versão final, há mais exceções a setores e produtos, o que diminui o potencial de redução de conflitos.

Entenda a reforma tributária

O objetivo da reforma tributária é simplificar o sistema de impostos no Brasil. O texto aprovado pela Câmara dos Deputados na primeira semana de julho definiu que os cinco tributos atuais sobre o consumo serão unificados em um imposto sobre valor agregado (IVA).

A Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) vai substituir os impostos federais IPI, PIS e Cofins, enquanto o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) vai unificar os atuais ICMS (estadual) e ISS (municipal).

Haverá ainda um terceiro imposto, chamado de Imposto Seletivo (IS), federal, que incidirá somente sobre bens e serviços considerados prejudiciais à saúde da população ou ao meio ambiente. Ele não incidirá na exportação ou sobre bens e serviços que contam com redução de alíquotas.

Medicamentos, dispositivos médicos e produtos e serviços para o Programa Universidade para Todos (Prouni) terão alíquota zero. O transporte público e as “atividades de reabilitação urbana de zonas históricas e de áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística” também terão isenção.

Os itens da cesta básica também estarão sujeitos à alíquota zero da CBS e do IBS. O relator ainda incluiu no texto, após acordo com a bancada evangélica, que não poderão ser tributadas as “entidades religiosas, templos de qualquer culto, incluindo suas organizações assistenciais e beneficentes”.

A reforma agora está sendo discutida e analisada pelo Senado. De acordo com o senador Rodrigo Pacheco, o texto deve começar a ser analisado no Plenário no começo de outubro deste ano. Se for alterado, precisará voltar para a Câmara dos Deputados.