JUDICIALIZAÇÃO

Ações tributárias relacionadas à Covid-19 aumentam para 8,4 mil, contabiliza PGFN

PGFN, porém, destaca que o ritmo de novos casos vem diminuindo e que decisões são desfavoráveis aos contribuintes

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Crédito: Pixabay
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Um monitoramento feito pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) registrou 8,4 mil processos judiciais tributários que têm como fundamento a pandemia da Covid-19. De acordo com o levantamento, que levou em consideração o período entre 16 de março e 1º de julho de 2020, cerca de 70% das ações referem-se à postergação do pagamento dos tributos.

Na análise da PGFN, embora a judicialização continue crescendo no Brasil, o ritmo de novos processos vem diminuindo. No primeiro mês de monitoramento a média era de 106 novas ações judiciais por dia, e, atualmente, é de 80. As teses trazidas aos tribunais também foram se transformando à medida que ocorreram os julgamentos das liminares e dos méritos das questões. Ao todo, são 67 temas levados à discussão no Judiciário, 31 a mais em comparação com os primeiros 30 dias de acompanhamento.

Se antes boa parte dos litígios concentrava-se em prorrogação de prazos para pagamento dos tributos e levantamento de valores depositados judicialmente, em um segundo momento, novos assuntos foram sendo incorporados, como, por exemplo, liberação de mercadorias importadas sem pagamento de tributos aduaneiros.

A PGFN aponta justificativas para a tendência de queda na judicialização. Uma delas é a resposta do Judiciário às demandas trazidas pelos contribuintes. Segundo dados da procuradoria, 80% das decisões têm sido favoráveis à União.

“A jurisprudência dos tribunais regionais federais e dos tribunais superiores, como o STJ e o STF, tem caminhado no sentido de cautela, da necessidade de medidas coordenadas e com responsabilidade social. As decisões também vão no sentido da impossibilidade do Poder Judiciário atuar como poder que poderia escolher a política administrativa pública”, explica Lana Borges Câmara, coordenadora de estratégias judiciais da PGFN.

A coordenadora cita, por exemplo, a decisão do ministro Dias Toffoli, do dia 18 de maio de 2020, que manteve as alíquotas reduzidas para a contribuição do Sistema S no Distrito Federal. “Não cabe ao Poder Judiciário decidir quem deve ou não pagar impostos, ou mesmo quais políticas públicas devem ser adotadas, substituindo-se aos gestores responsáveis pela condução dos destinos do Estado”, escreveu o magistrado na decisão.

Outro aspecto apontado pela PGFN são as ações do governo federal para conter os efeitos da pandemia, como a edição de portarias, leis e medidas provisórias permitindo o diferimento de tributos e a negociação de dívidas com a União. Até o fim de junho, 15,3 mil transações tributárias foram deferidas a empresas. No dia 1º de julho, o governo prorrogou por mais um mês o prazo de ingresso ao certame.

A PGFN destaca também os normativos do governo com medidas econômicas e sociais. “O que a gente tem é um movimento constante do governo federal para tentar minimizar as consequências econômicas e sociais da pandemia. São mecanismos legais e econômicos. Existe uma política de financiamento econômico das empresas, de pagamento de salários, facilitação de financiamento, etc. Não são questões tributárias, mas também questões econômicas”, argumenta Lana Borges.

Outra medida que vem contribuindo para a queda de novos processos tributários é a edição da Lei Complementar 173/2020, que obrigou estados e municípios a abrirem mão de processos judiciais contra a União por conta da Covid-19 como contrapartida para o recebimento do auxílio emergencial. Assim, os entes não só abriram mão dos processos como não estão ajuizando novos pedidos.

Segundo levantamento da PGFN, os municípios ajuizaram mais de 530 ações tributárias contra a União, pedindo principalmente a suspensão do pagamento do parcelamento de débitos previdenciários e a impossibilidade da União reter o Fundo de Participação dos Municípios em caso do não cumprimento de obrigações previdenciárias.

Assista ao novo episódio do podcast Sem Precedentes:

Mudança nas teses

O monitoramento da PGFN também mostrou mudanças nas teses dos contribuintes à medida em que as decisões judiciais começaram a ser proferidas.

As teses mais recentes são, por exemplo, o pedido de prorrogação do pagamento de tributos federais com a justificativa de paralisação das atividades empresariais em razão da Covid-19. As empresas pedem que os diferimentos autorizados pelo Executivo para determinados tributos por conta da pandemia sejam ampliados a outros.

Um exemplo foi o pedido da Mercedes-Benz Cars & Vans Brasil – Indústria e Comércio para prorrogar os vencimentos de tributos federais relativos à importação de produtos. A contribuinte alegou que iniciou os procedimentos de importação antes do país decretar a calamidade pública, e teria que pagar tributos sem usar os produtos importados. A decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região negou a liminar.

Outras empresas pedem a liberação de mercadorias importadas sem o prévio pagamento dos tributos federais aduaneiros enquanto perdurar a situação de emergência nacional causada pela Covid-19. É o caso da MW Comércio de Artigos de Iluminação Ltda. A empresa alegou que possuía cargas a serem desembarcadas no Porto de Santos, porém as declarações de importação não foram registradas porque ela não teria recursos para pagar os tributos de internalização das mercadorias por conta da queda no faturamento gerado pela pandemia. A decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região negou o pedido.

Em um primeiro momento, uma das teses mais recorrentes foi, por exemplo, a aplicação da Portaria nº 12/2012, que adia por 90 dias os pagamentos de tributos federais em caso de estado de calamidade pública.

De um lado, as empresas pedem a moratória alegando que a pandemia é uma calamidade pública. Já a União defende que a portaria foi editada em razão de enchentes e desmoronamentos, ou seja, para uma situação específica. Assim, no caso da pandemia, a norma não poderia ser aplicada porque todas as empresas são prejudicadas pela crise.

A substituição de depósitos judiciais e dos valores depositados via Bacenjud por seguro garantia e carta fiança ou mesmo o levantamento dessas quantias sem contrapartidas também foram mais constantes do que agora, e a maioria os pedidos, segundo a PGFN, foram afastados pelo poder Judiciário.

“Em meio à pandemia, o levantamento dos depósitos, sem decisão judicial transitada em julgado, pode comprometer o emprego dos valores pelo Poder Público na implantação de políticas sociais e na implementação de medidas econômicas anticíclicas”, escreveu a ministra Assusete Magalhães em recurso impetrado pela empresa Positivo Tecnologia S.A. A companhia pediu a substituição de depósito judicial no valor de R$ 52,3 milhões por seguro garantia.

Processos citados na matéria:

Medida cautelar na SS 5.381/DF
Recurso especial 1.717.330-PR
Agravo de instrumento 5008386-11.2020.4.03.0000 TRF-3
Agravo de instrumento 5008661-57.2020.4.03.0000 TRF-3