Direito Penal

A identidade física do juiz no processo penal e o CPC/15

Reflexões sobre a jurisdição contemporânea

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Desde a reforma instituída pela Lei 11.719/2008, o processo penal pátrio passou a abarcar o princípio da identidade física do juiz. Nesse diapasão, preconiza o art. 399, §2º do CPP que o juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença.

Assim, mais um elemento se agrega ao formato atual do juiz natural, consistindo no princípio da identidade física do juiz, que torna forçoso que o julgamento do processo criminal seja atrelado ao livre convencimento motivado do juiz que presidir a sua instrução. Deve-se, portanto, sempre primar pela manutenção do magistrado que colheu a prova na condução do desfecho da causa, pois aquele que instruiu a demanda é quem possui, sem dúvida alguma, melhores condições para apreciar e julgar o processo.

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Apesar de ter se consolidado o entendimento jurisprudencial, na vigência do Código de Processo Civil de 1973, de que a identidade física no processo penal era excepcionada nas hipóteses previstas no art. 132 do diploma processual civil, por força de aplicação supletiva (que continua plenamente possível, conforme preconiza o enunciado 03 da I Jornada de Processo Civil do CJF), se faz necessária nova reflexão sobre o tema a partir da vigência do CPC/15.

Com efeito, o novo Código de Processo Civil não reproduziu a previsão da identidade física, muito menos as exceções anteriormente previstas. Assim, a partir da vigência do CPC/15, a identidade física no processo penal alcança nova dimensão e se torna plena. Nesse diapasão, recente precedente do STJ já apontou, ainda que de forma acanhada, a necessária distinção, destacando que o antigo art. 132 pode ser usado para mitigar a identidade física se vigente à época da prolação da sentença:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ARTIGO 334, § 1º, d, do CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. VIOLAÇÃO. INEXISTÊNCIA. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. EXAURIMENTO DAS VIAS ORDINÁRIAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. O Superior Tribunal de Justiça, seguindo entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, passou a não admitir o conhecimento de habeas corpus substitutivo de recurso previsto para a espécie. No entanto, deve-se analisar o pedido formulado na inicial, tendo em vista a possibilidade de se conceder a ordem de ofício, em razão da existência de eventual coação ilegal. 2. O princípio da identidade física do juiz deve ser interpretado sob a ótica do art. 132 do antigo Código de Processo Civil, vigente à época da prolação da sentença, c/c o art. 3º do Código de Processo Penal. Neste sentido, é possível relativizá-lo por motivo de licença, afastamento, promoção, aposentadoria ou outro motivo legal que obste o magistrado que presidiu a instrução de sentenciar a ação penal. 3. “Segundo entendimento desta Corte, a remoção do Magistrado está dentro das hipóteses do art. 132, do Código de Processo Civil, configurando exceção à obrigatoriedade de ser o processo-crime julgado pelo Juiz que presidiu a instrução” (ut, (AgRg no AREsp 395.152/PB, Rel. Ministra LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJe 13/05/2014). 4. Quanto à expedição de mandado de prisão antes do trânsito em julgado, sabe-se que o Pleno do Supremo Tribunal Federal, em 17/2/2016, no julgamento do HC n. 126.292/SP, decidiu, por maioria de votos, que a execução provisória da pena não afronta o princípio constitucional da presunção de inocência, de modo que, confirmada a condenação por colegiado em segundo grau, e ainda que pendentes de julgamento recursos de natureza extraordinária (recurso especial e/ou extraordinário), a pena poderá, desde já, ser executada. 5. Na espécie, verifica-se que, prolatado o acórdão condenatório e julgado os embargos de declaração opostos pela defesa, ocorreu o encerramento do trâmite processual nas instâncias ordinárias, sendo, pois, possível a execução provisória de pena. Precedentes. 6. Habeas corpus não conhecido. (Processo HC 201700005770 HC – HABEAS CORPUS – 384666 – Relator REYNALDO SOARES DA FONSECA – STJ – QUINTA TURMA – Fonte DJE DATA:25/04/2017)

A mais frequente ressalva a identidade sempre foi a hipótese de remoção do magistrado, no entanto, há de se gizar que esta já não se encontrava abarcada nas previsões do art. 132 do superado diploma (“Art. 132. O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor”)1.

E ainda que assim não fosse, como já assentado, o referido dispositivo não possui mais vigência, sendo inviável aplicá-lo, quiçá fazer uma interpretação extensiva daquilo que não mais vigora.

Imperiosa, portanto, a prevalência da norma vigente, isto é, do art. 399, §2º do CPP, como corolário do princípio constitucional do juiz natural, verdadeiro direito fundamental dos réus (art. 5º, LIII da CRFB/88:” ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”).

Corroborando o entendimento aqui esposado, já há julgados do egrégio Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Cumpre trazer à baila alguns da lavra do ilustre desembargador José Muiños Piñeiro Filho:

PENAL. PROCESSO PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. CRIMES DE TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS (ARTIGOS 33 E 35 DA LEI 11343/2006). DETERMINAÇÃO DE REMESSA DOS AUTOS AO JUIZ DE DIREITO QUE CONCLUIU A INSTRUÇÃO CRIMINAL. ALEGAÇÃO DE QUE O MAGISTRADO ESTÁ VINCULADO PARA PROLAÇÃO DA SENTENÇA, NOS TERMOS DO QUE DISPÕE O § 2º, DO ART. 399, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. JUÍZO SUSCITADO QUE SUSTENTA INCOMPETÊNCIA PARA PROFERIR O DECISUM EM RAZÃO DA PROMOÇÃO. ANALOGIA AOS TERMOS DO ARTIGO 132 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PROMOÇÃO. PROCEDÊNCIA DO CONFLITO NOS TERMOS EM QUE FOI REQUERIDO. TEMPUS REGIT ACTUM. POSIÇÃO DO RELATOR DESIGNADO A RESPEITO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ EM MATÉRIA PENAL FACE À VIGÊNCIA DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E A OMISSÃO, OU INEXISTÊNCIA OU NÃO REPRODUÇÃO DA REGRA ANTES PREVISTA NO ARTIGO 132 DAQUELE DIPLOMA LEGAL. SOLUÇÃO A SER AFIRMADA PELO COLEGIADO ANTE A PECULIARIDADE DA HIPÓTESE, NO PONTO. SANÇÃO, PROMULGAÇÃO E PUBLICAÇÃO DA LEI QUE INSTITUIIU O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANTES DA PROMOÇÃO DO JUÍZO SUSCITADO. VACATIO LEGIS QUE, PELA SUA NATUREZA PROVISÓRIA, NÃO AFASTA A APLICAÇAO EXPRESSA DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CLAUDICÂNCIA DA EXPEPCIONALIDADE QUE NÃO PODE AFASTAR O JUIZ NATURAL DA CAUSA. COMPETÊNCIA DO JUIZ QUE RECEBEU OS AUTOS PARA PROLAÇÃO DA SENTENÇA, VINCULADO PELA CONCLUSÃO DA INSTRUÇÃO. DECISÃO POR MAIORIA. (TJRJ – SEXTA CÂMARA CRIMINAL – CONFLITO DE JURISDIÇÃO N. 0024985-72.2016.8.19.0000 – VOGAL DES. REDATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador JOSÉ MUIÑOS PIÑEIRO FILHO)

PENAL. PROCESSO PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. INTERESSADOS DENUNCIADOS PELO CRIME DO ARTIGO 1º DA LEI 9613/98. DETERMINAÇÃO DE REMESSA DOS AUTOS À JUÍZA DE DIREITO QUE SE ENCONTRAVA EM EXERCÍCIO NA 2ª VARA CRIMINAL DE NITERÓI (ORA JUÍZO SUSCITANTE) QUANDO ABERTA A CONCLUSÃO PARA SENTENÇA. ALEGAÇÃO DE QUE A MAGISTRADA É A COMPETENTE PARA PROFERIR A SENTENÇA UMA VEZ QUE O JUIZ QUE PRESIDIU A INSTRUÇÃO DO PROCESSO FOI REMOVIDO PARA O CARGO DE JUIZ DE DIREITO DE ENTRÂNCIA ESPECIAL SUBSTITUTO DE SEGUNGO GRAU ANTES DE ABERTA A CONCLUSÃO PARA SENTENÇA, TENDO EM VISTA QUE ÀQUELA ÉPOCA AGUARDAVA-SE AINDA A MANIFESTAÇÃO DERRADEIRA DA DEFESA (ALEGAÇÕES FINAIS), HAVENDO, PORTANTO, CESSADO SUA VINCULAÇÃO. JUÍZA SUSCITADA QUE ALEGA INCOMPETÊNCIA PARA PROFERIR O DECISUM EM RAZÃO DE NÃO SOMENTE NÃO TER PRESIDIDO A INTRUÇÃO DO FEITO, COMO TAMBÉM NÃO MAIS SE ENCONTRAR EM EXERCÍCIO NO JUÍZO POR ONDE TRAMITOU O PROCESSO, EM QUE PESE TER SIDO ABERTA A CONCLUSÃO PARA SENTENÇA DURANTE O PERÍODO EM QUE ACUMULAVA O JUÍZO DA 2ª VARA CRIMINAL DE NITERÓI. ADUZ A JUÍZA SUSCITADA QUE COMPETE AO JUIZ QUE PRESIDIU A INSTRUÇÃO DO PROCESSO A PROLAÇÃO DA SENTENÇA, FACE O PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. MITIGAÇÃO OU RELATIVIZAÇÃO DO PRINCÍPIO. INEXISTÊNCIA DE NORMA EXPRESSA NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. TEXTO PROCESSUAL QUE NÃO MAIS PODE SER SUBSIDIÁRIO AO PROCESSO PENAL, NO PONTO. HIGIDEZ DO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ NO SISTEMA PROCESSUAL PENAL. RELATIVIZAÇÃO A SER CONTRUÍDA PELA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA. REMOÇÃO DO JUIZ QUE PRESIDIU A INSTRUÇÃO CRIMINAL. MANUTENÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE SENTENCIAR. CONFLITO JULGADO PROCEDENTE. (TJRJ – SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL – CONFLITO DE JURISDIÇÃO N. 0036349-41.2016.8.19.0000 – RELATOR: Desembargador JOSÉ MUIÑOS PIÑEIRO FILHO)

No mesmo sentido:

Conflito de Jurisdição. O Juiz em exercício no I Tribunal do Juri da Capital declinou da competência para a 2a Vara Criminal de Duque de Caxias, argumentando que, após a remoção o Juiz não permanece vinculado ao processo, aplicando as exceções previstas no artigo 132 do antigo Código de processo Civil. A Suscitante afirma, porém, que, com base no princípio da identidade física do juiz, não se aplica o artigo 132 do Código de Processo Civil no caso de remoção de magistrado. Possibilidade. Aplicação do Princípio da Identidade Física do Juiz (Art. 399, § 2º do CPP). A Remoção do Magistrado que presidiu a instrução não configura uma exceção do princípio em tela. No caso em exame, o magistrado suscitado posteriormente removido, todavia, ainda assim decidirá as causas pendentes de julgamento. PROVIMENTO DO CONFLITO PARA DECLARAR COMPETENTE O JUIZ SUSCITADO ¿ I TRIBUNAL DO JURI DA CAPITAL. (0015772-42.2016.8.19.0000 – CONFLITO DE JURISDIÇÃO – Des(a). JOSÉ ROBERTO LAGRANHA TÁVORA – Julgamento: 24/05/2016 – QUARTA CÂMARA CRIMINAL)

PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. HIPÓTESE NÃO PREVISTA NO ARTIGO 132 DO CPC. MAGISTRADO QUE PRESIDE A INSTRUÇÃO E POSTERIORMENTE É REMOVIDO PARA A MESMA COMARCA E GRAU DE JURISDIÇÃO. A REMOÇÃO NÃO É UMA DAS EXCEÇÕES PREVISTAS PARA AFASTAR O PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. COMPETÊNCIA DO JUIZ SUSCITADO – CONFLITO NEGATIVO PROCEDENTE. (0029483-22.2013.8.19.0000 – CONFLITO DE JURISDIÇÃO – Des(a). FATIMA MARIA CLEMENTE – Julgamento: 25/06/2013 – QUARTA CÂMARA CRIMINAL)

Conflito de Competência. Suscitante o Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Mangaratiba e suscitada a Juíza de Direito da 2ª Vara Criminal da Comarca de Duque de Caxias. Parecer da Procuradoria de Justiça pela competência da Juíza suscitada para julgar o presente feito, diante do exposto no artigo 132, do CPC. 1. A instrução probatória foi parcialmente presidida perante o Juiz suscitante, que era o titular da 2ª Vara Criminal da Comarca de Duque de Caxias. Antes do término da instrução criminal, o referido Magistrado foi removido para a Vara Única da Comarca de Mangaratiba. 2. A Juíza Titular da 2º Vara Criminal da Comarca de Duque de Caxias encaminhou o feito ao magistrado que presidiu a instrução, com fulcro no artigo 399, § 2°, do CPP. 3. Este Juiz, por sua vez, entendendo que não era mais competente para atuar no feito, suscitou o presente conflito negativo de jurisdição. 4. Não assiste razão ao suscitante. 5. Após o advento da Lei 11.719/08, o Magistrado que presidir a instrução criminal deverá proferir a sentença, nos termos do art. 399, § 2º, do CPP. Há casos em que o Juiz que colheu a prova oral afasta-se do órgão jurisdicional, não podendo, a partir de então, atuar no feito. Não existe norma processual penal que regulamente situações nas quais ocorra esse afastamento, nem que determine a prorrogação da sua competência em razão do princípio da identidade física. 6. Na hipótese presente, ocorreu a remoção do Magistrado que realizou a instrução probatória. Em princípio, seria aplicável o artigo 132, do CPC, por força do permissivo legal constante do artigo 3°, do CPP. Verifica-se, porém, que a Magistrada também está afastada da Segunda Vara Criminal de Duque de Caxias, atuando perante a Vara de Execuções Penais. 7. Penso que, em tal hipótese, quando a instrução foi presidida pelo Magistrado da Vara Única de Mangaratiba, cabe a ele proferir a sentença, o que se mostra mais em harmonia com a preservação do princípio da identidade física do juiz. 8. Conflito conhecido e não provido, firmando-se a competência do Juiz suscitante, ou seja, o da Vara Única de Mangaratiba. (0058616-80.2012.8.19.0021 – CONFLITO DE JURISDIÇÃO – Des(a). CAIRO ÍTALO FRANÇA DAVID – Julgamento: 28/01/2016 – QUINTA CÂMARA CRIMINAL)

No entanto, não estamos preconizando que a identidade física do juiz seja absoluta, o que poderia, inclusive, macular uma adequada prestação jurisdicional. Aliás, este é o principal fundamento da respeitável corrente jurisprudencial que ainda invoca o art. 132 do CPC/73, já revogado, para mitigar a aplicação do princípio2.

De plano, cumpre registrar que efetivamente são várias as hipóteses em que a observância da identidade física do juiz resta praticamente inviabilizada, como no caso de falecimento, aposentadoria, promoção para instância diversa e licença médica prolongada. Por óbvio, em tais hipóteses não se mostra razoável defender a vinculação.

Assim, a nosso sentir, a superação da divergência jurisprudencial a respeito do ponto, perpassa a adequada balização da identidade física do juiz à luz da duração razoável do processo, prevista como direito fundamental na Constituição Federal/88, nos termos do inciso LXXVIII do art. 5º3.

Gize-se que a despeito da estatura constitucional do princípio da duração razoável, a Convenção Americana de Direitos Humanos, também conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, também assegura esta garantia fundamental em seu artigo 8.14, tendo sido promulgado pelo Brasil através do Decreto 678/1992. No mesmo sentido, é o disposto no art. 6.1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem – CEDH5.

Mais recentemente, o art. 4o do CPC/2015, que consubstancia norma fundamental de nosso processo, também atesta que as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito6.

Não há previsão no CPP relativa a duração razoável dos processos, o que sequer causa espanto uma vez que a garantia só foi inserida em nossa Carta Magna através da EC 45/04. Entretanto, é indubitável sua aplicação ao processo penal, por expressa exigência constitucional e por aplicação, via diálogo das fontes, do CPC/2015.

Nesse cenário, portanto, pugnamos pela primazia da identidade física, como corolário do juiz natural, refutando a possibilidade de aplicação do art. 132 do referido diploma a partir da revogação do CPC/73. Admitimos, contudo, sua superação, no caso concreto, apenas se for necessária para garantir a duração razoável de determinado processo.

Assim, a mera remoção ou promoção dentro da mesma instância, por exemplo, não se mostra mais admissível, per si, como causa de mitigação do princípio. Sepultando qualquer dúvida, gize-se que seria completamente desarrazoado defender que um juiz que acumule dois juízos ou que substitua o titular nas férias, entre outros casos, permaneça vinculado aos processos cuja instrução presidir, mas não esteja em relação aos processos da própria comarca em que figura como titular após se remover.

Em outro giro, entretanto, mostrar-se-ia legítima a quebra da vinculação e a prolação de sentença por outro magistrado quando aquele que estivesse vinculado se encontrasse de licença prolongada ou afastamento, em especial quando se tratar de réu preso. Por fim, embora lógico, cabe assentar ser imperioso o afastamento da identidade física quando ocorrer promoção para instância diversa, aposentadoria ou morte.

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1 Nesse sentido: CONFLITO DE JURISDIÇÃO – Trata-se de conflito negativo de jurisdição entre o atual e o anterior Magistrado da 2ª Vara Criminal da Comarca de Duque de Caxias. Com razão o Juízo suscitante. Exame dos autos demonstra a competência do Juiz anterior, ora suscitado. Juiz que presidir a instrução está mais apto para a prolação da sentença, mas o Princípio da Identidade Física do Juiz comporta exceções, que estão previstas no artigo 132 do CPC, aplicado por analogia. Remoção não é uma dessas exceções, devendo ser refutado o argumento do Juiz suscitado. O juiz removido não se encontra afastado por qualquer motivo. Se o Magistrado tiver sido removido para outro órgão, dentro da 1ª instância, o princípio vai ser preservado, permanecendo vinculado ao processo, devendo prolatar a sentença de mérito. Evidente a vinculação do Magistrado suscitado. PROCEDENTE O CONFLITO. (0041754-58.2016.8.19.0000 – CONFLITO DE JURISDIÇÃO – Des(a). GIZELDA LEITÃO TEIXEIRA – Julgamento: 20/09/2016 – QUARTA CÂMARA CRIMINAL)

2 CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. Suscitado pelo Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal do Foro Regional de Madureira ¿ Comarca da Capital, em face do Juízo de Direito do 1º Juizado Especial Criminal da Comarca de Volta Redonda, que declinou de sua competência para o Juízo suscitante, para atuar no processo nº 0010825-43.2013.8.19.0066, com base no princípio da identidade física do juiz. Sustenta o Juízo Suscitante que não tem vinculação com o referido processo, uma vez que foi removido por antiguidade ao cargo de Juiz de Entrância Especial da 2ª Vara Criminal Regional de Madureira da Comarca da Capital, frisando que a deliberação foi publicada em 15/12/2015, por meio da Portaria MAG nº 219/2015. A norma descrita no artigo 399, §2º, do Código de Processo Penal, não se aplica a presente hipótese, na medida em que se insere nas exceções ao princípio da identidade física do juiz, elencadas no artigo 132, do Código de Processo Civil de 1973, aplicada por integração. 1.O Princípio da identidade física do juiz foi inserido pela Lei nº 11.719/2008, que alterou a redação do artigo 399, §2º, do Código de Processo Penal, com a finalidade de fixar a competência para apreciação da causa pelo Magistrado que manteve contato direto com as provas produzidas, de modo a proferir uma decisão mais abalizada. 2. Contudo, o diploma penal não disciplinou sua aplicação em casos excepcionais, razão pela qual a jurisprudência amplamente aplicava a inteligência do art. 132 do Código de Processo Civil de 1973, também, na seara processual penal. A norma em questão não foi reproduzida pela Lei 11.105/2015, que deixou de prever expressamente o princípio da identidade física do juiz. 4. A revogação do artigo 132, do CPC/73, não tem o condão de tornar absoluto o princípio da identidade física do juiz, na medida que o cerne axiológico da norma se prolonga para além da sua vigência. Assim é que, a regra legal contida no artigo 399, § 2º, do CPP, que se refere ao princípio da identidade física do juiz, não é absoluta. 5. Ressalta-se que as hipóteses de substituição de magistrados estão elencadas na LODJ (Lei Estadual nº 6.956/2.015), o que reforça o caráter não absoluto do princípio da identidade física, não se podendo olvidar que não se pode negligenciar ao jurisdicionado a prestação jurisdicional, devendo prevalecer os princípios da celeridade, da economia processual e da instrumentalidade das formas. CONFLITO PROCEDENTE. (0039684-34.2017.8.19.0000 – CONFLITO DE JURISDIÇÃO – Des(a). KÁTIA MARIA AMARAL JANGUTTA – Julgamento: 22/08/2017 – SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL)

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. ARTIGOS 113, 114, INCISO I, 115, INCISO III E 399, § 2.º, DO CPP. MAGISTRADO QUE CONCLUIU A INSTRUÇÃO REMOVIDO PARA OUTRO ÓRGÃO JURISDICIONAL. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. INAPLICABILIDADE. ENQUANTO NÃO FOR EDITADA NOVA DISCIPLINA, CONTINUA A INCIDIR A NORMA DO ARTIGO 132, DO REVOGADO CPC DE 1973. COMPETÊNCIA DO JUIZ SUSCITADO. 1. O princípio da identidade física do juiz, instituído no § 2º do artigo 399, do CPP, mesmo após as inovações introduzidas no Código de Processo Penal pela Lei nº 11.719/2008, comporta exceções, outrora contempladas no revogado artigo 132, do Código de Processo Civil de 1973. 2. Logo, nos casos de convocação, licença, promoção, férias ou outro motivo legal, como a remoção para outra Vara do magistrado que presidiu a instrução, poderá o feito ser sentenciado por seu sucessor ou por quem estiver ocupando o Juízo, na forma da LODJ, sem que isso implique em ofensa ao aludido princípio. 3. Doutrina e Precedentes do STF, STJ e desta Corte. CONFLITO JULGADO PROCEDENTE, RECONHECENDO-SE COMO COMPETENTE O JUIZ SUSCITADO PARA PROFERIR A SENTENÇA. (0026487-12.2017.8.19.0000 – CONFLITO DE JURISDIÇÃO – Des(a). LUCIANO SILVA BARRETO – Julgamento: 08/06/2017 – QUINTA CÂMARA CRIMINAL)

PENAL – PROCESSO PENAL – CONFLITO DE JURISDIÇÃO – CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO – ROUBO – PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ – APLICAÇÃO DO ARTIGO 132 DO CPC POR FORÇA DO ARTIGO 3º DO CPP – REMOÇÃO – AFASTAMENTO POR QUALQUER MOTIVO – ALTERAÇÃO DO CPC – IRRELEVANCIA. Com o advento da Lei 11690/2008, o princípio da identidade física do juiz passou a integrar o sistema processual brasileiro, sempre na ideia de que o juiz que colheu a prova deve proferir a sentença, o que se justifica por ter tido contato direto com as partes e testemunhas, possuindo, em regra, visão mais ampla do caso submetido a julgamento. Apesar da omissão do texto legal, tem sido decidido de forma pacífica que se aplica por analogia o disposto no artigo 132 do CPC, devendo a remoção do magistrado ser vista como hipótese que se adequa à exceção por afastamento por qualquer motivo. A meu sentir, a despeito da revogação do CPC de 1973, a regra contida no artigo 132 que mitigava a aplicação do princípio da identidade física do juiz continua podendo ser aplicada analogicamente no âmbito do processo penal, ainda mais com a ausência de previsão e regramento do princípio em comento na atual legislação processual civil. No caso concreto, a instrução criminal foi presidida pelo magistrado suscitante, na época Juiz titular da 1ª Vara Criminal da Comarca de Niterói. Contudo, em razão de sua remoção, passou a exercer a titularidade do Juízo da 10ª Vara de Família da Comarca da Capital, o que implica no reconhecimento da exceção ao princípio do juiz natural, afastando a sua vinculação com o feito. Conflito conhecido e provido, firmando-se a competência do Juiz suscitado, ou seja, o em exercício atual na 1ª Vara Criminal da Comarca da Capital. (0023007-26.2017.8.19.0000 – CONFLITO DE JURISDIÇÃO – Des(a). MARCUS HENRIQUE PINTO BASÍLIO – Julgamento: 16/05/2017 – PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL)

3 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[…]

LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

4 Artigo 8. Garantias judiciais

1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.

5 Artigo 6º – Direito a um processo equitativo

1. Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de carácter civil, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela. O julgamento deve ser público, mas o acesso à sala de audiências pode ser proibido à imprensa ou ao público durante a totalidade ou parte do processo, quando a bem da moralidade, da ordem pública ou da segurança nacional numa sociedade democrática, quando os interesses de menores ou a protecção da vida privada das partes no processo o exigirem, ou, na medida julgada estritamente necessária pelo tribunal, quando, em circunstâncias especiais, a publicidade pudesse ser prejudicial para os interesses da justiça.

6 Art. 4o As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.