Saúde

Uma comparação entre o Brasil e a Colômbia

Liderança eficaz não significa fazer discursos ou ser amado, mas é definida por resultados

Colômbia
Cidade de Bogotá, capital da Colômbia / Crédito: Unsplash

A essência da liderança, diz uma de suas máximas, é a capacidade de influenciar pessoas. Essa influência pode ser a favor da vida ou não. A diferença entre essas distintas lideranças pode ser medida em dezenas de milhares de mortes.

Sentimos isso no retorno ao Brasil, depois de sete meses vivendo em Bogotá, Colômbia, em doce exílio, ao lado da família de meu filho, de nossas queridas netas, esperando que as fronteiras do país vizinho fossem reabertas.

O presidente Iván Duque Márquez, da Colômbia, levou a pandemia a sério e tratou de proteger o seu povo. Acompanhou de perto e seguiu o que o consenso científico determinava, ao longo do tempo. Transformou seu ministério em um comitê de crise e conferiu notável importância ao ministro da Saúde, o médico Fernando Ruiz Gómez.

A Colômbia implementou uma combinação de “soft power”, chamado de cultura cidadã, com ações de poder real, como fechamento de fronteiras e limitações para o funcionamento de atividades econômicas, culturais, esportivas, recreativas e o que mais pudesse ser feito para defender a saúde da população.

A comunicação social foi a ferramenta usada para que a cultura cidadã influenciasse a comunidade. Todo fim de tarde Duque reúne um grupo de ministros em um programa divulgado na televisão aberta e dá conta dos avanços da doença e dos resultados que o país está alcançando. Explicou quais eram os indicadores que as autoridades estavam seguindo e, diariamente, em gestão aberta, mostra sua evolução. Não há quem não entenda e compreenda, mesmo que delas não goste.

As demais autoridades públicas foram se alinhando, superando diferenças políticas e o natural desejo de assumir protagonismos, essência do mundo político. A prefeita de Bogotá, Claudia López Hernández, ferrenha opositora de Álvaro Uribe, de onde nasce a liderança de Iván Duque, é um bom exemplo de quem ajudou a consolidar a cultura da responsabilidade coletiva para enfrentar a pandemia.

A reabertura das fronteiras foi um dos temas em que o presidente da República e a prefeita de Bogotá tiverem voz e necessidade de se pôr de acordo. O Aeroporto El Dorado é o principal do país e fica na capital, em área não muito afastada do centro da cidade. As considerações sobre sua reabertura estiveram na pauta dos dirigentes nacionais e regionais o tempo todo.

A população pôde acompanhar o minucioso debate sobre os protocolos de biossegurança e a imprensa cobriu, inclusive, uma simulação de embarque com a participação de autoridades de diferentes níveis, incluindo o ministro da Saúde e a ministra dos Transportes, Ángela María Orozco. Ao final do exercício, prefeitura e governo nacional, concluíram que não estavam prontos para reabrir, para decepção de todos. Liderar é saber dizer não, quando essa é a medida acertada para alcançar os objetivos desejados.

Finalmente, no começo de outubro as fronteiras foram reabertas, voos internacionais oferecidos e nós iniciamos o caminho de volta para casa. Para tanto, tivemos que cumprir o rigoroso protocolo de biossegurança colombiano.

El Dorado é o terceiro maior aeroporto da América Latina, menor apenas que os da Cidade do México e de Guarulhos, em São Paulo. Para entrar no terminal de passageiros é preciso instalar dois aplicativos no telefone, um para se cadastrar no próprio aeroporto e outros para relatar sintomas do Covid-19, do passageiro e de seus familiares, gerando um código QR que deverá também ser apresentado.

As filas para verificação de passagens e despacho de bagagens são muito organizadas e sem qualquer aglomeração. Existem vários totens de autoatendimento e sempre há por perto pessoas atenciosas dando as informações necessárias. Desnecessário dizer que todos usam máscaras de proteção além de anteparo facial de plástico, os conhecidos “face shields”. As cadeiras da sala de espera são espaçadas e o embarque é tranquilo e sem filas, com chamadas por grupos que são rigorosamente respeitados.

Na chegada ao aeroporto de Guarulhos a realidade era oposta. Aglomerações por todos os lados, desrespeito à distância mínima entre as pessoas, poucos totens com álcool gel, quase nenhum com acionamento de pedal e muito poucos funcionários orientando e estimulando o cuidado para não propagar o vírus. Algumas pessoas circulavam sem máscaras de proteção.

O mais surpreendente foi observar que tanto na Polícia Federal, responsável pela imigração, como na Receita Federal, pela alfândega, a ordem dada pelos funcionários públicos era, acreditem, para retirar as máscaras de proteção de modo a permitir a leitura das máquinas de identificação facial. Ao invés da tecnologia estar a serviço da saúde e da vida, era o contrário, a saúde dos passageiros é que estava à disposição da tecnologia de identificação e controle.

Os maus líderes, em geral, negam ou minimizam os problemas, lutam mais por ocupar posições e ter títulos. Não se comprometem, agem de modo disperso e não são exemplos a serem seguidos. Acontece, que eles também influenciam e acabam determinando como seus liderados atuam.

O professor Peter Drucker, uma das maiores referências do século passado sobre temas da administração disse que liderança eficaz não significa fazer discursos ou ser amado, mas é definida por resultados.

Sob essa régua, podemos avaliar a liderança do presidente Bolsonaro e compará-la com a atitude completamente diferente assumida pelas autoridades da Colômbia.

Os números da pandemia nos dois países são claros. No Brasil, 2,25% da população foi infectada pelo novo coranavírus, enquanto somente 1,67% dos colombianos foram contaminados.

Tivéssemos usado protocolos rigorosos como fizeram os colombianos e alcançado seus resultados, nossos números teriam sido outros. Poderíamos ter evitado mais de 1,2 milhão de casos de Covid e preservado mais de 31 mil vidas.