Thales M. Stucky

"The majority of the jurisdictions reviewed by the Global Forum (70 out of 125) had bank secrecy restrictions and 98% of them have now removed them for the purpose of exchanging information"<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a>
Nos últimos anos é notória a crescente importância da temática em torno da transparência fiscal e intercâmbio internacional de informações. O destaque a tal temática, a rigor, vem ocorrendo desde 1998 com a publicação do relatório "Report on Harmful Tax Competition - An Emerging Global Issue", passando pelas recomendações emitidas no âmbito do "Global Forum on Transparency and Exchange of Information for Tax Purposes", do Plano BEPS, assim como pelas atualizações do modelo de tratado para evitar dupla tributação preparado pela OCDE no que tange à cláusula que trata sobre procedimentos de trocas de informações.
Com efeito, mesmo o Brasil ainda não sendo um membro da OCDE, não obstante os recentes esforços para ingressar na referida organização internacional<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[2]</a>, fato é que o Brasil vem adotando paulatinamente diversas das recomendações no que tange à implementação de mecanismos e práticas para a troca de informações em matéria tributária.
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Neste aspecto, por exemplo, em meados de 2018 o Brasil aprovou alterações no Acordo para Evitar a Dupla Tributação firmado com  a Argentina a fim de incorporar às disposições da cláusula 26 os parágrafos quarto e quinto, de modo a assegurar que a troca de informações não pode ser denegada sob o argumento de as informações requeridas não necessárias para o Estado requerido (parágrafo quarto), ou mesmo que o intercâmbio de informações seja impedido pelo fato de os dados estarem sob a custódia de instituições financeiras (parágrafo quinto). As novidades inseridas na Cláusula 26 do referido Acordo restaram assim redigidas:
"4. Quando um Estado Contratante solicitar informações de acordo com o presente Artigo, o outro Estado Contratante utilizará os meios de que dispõe para obter as informações solicitadas, ainda que esse outro Estado não necessite de tais informações para seus próprios fins tributários. A obrigação constante do período precedente estará sujeita às limitações do parágrafo 3, mas em nenhum caso tais limitações serão interpretadas no sentido de permitir que um Estado Contratante se recuse a prestar as informações somente porque essas informações não sejam de seu interesse no âmbito interno. 
<ol start="5">
<li> Em nenhum caso, as disposições do parágrafo 3 serão interpretadas no sentido de permitir que um Estado Contratante se recuse a prestar as informações somente porque tais informações são detidas por um banco, outra instituição financeira, mandatário ou pessoa que atue na qualidade de agente ou fiduciário, ou porque estão relacionadas com direitos de participação na propriedade de uma pessoa.” </li>
</ol>
De igual maneira, também em recentes anos o Brasil firmou diversos acordos internacionais para troca de informações em matéria tributária, como é o caso dos acordos firmados com os Estados Unidos (Decreto nº 8.003/2013), Jersey (Decreto nº 9.969/2019), Reino Unido (Decreto nº 9.815/2019) e Suíça (Decreto nº 9.814/2019).
Além do mais, também o Brasil aderiu às disposições da Convenção sobre Assistência Mútua Administrativa em Matéria Tributária (Decreto nº 8.842/2016), viabilizando a troca automática de informações com diversos outros países signatários em face do Acordo sobre Intercâmbio de Informações Financeiras ("Padrão de Declaração Comum" ou "CRS") e relatórios País-a-País ("DPP" ou "CbC"), tudo conforme regulamentado nas disposições das IN/RFB nº 1.860/2016 e 1.861/2016.
A respeito desse esforço para alinhamento às práticas internacionais no que tange às práticas internacionais e mecanismos para troca de informações é de se destacar que o Relatório Anual de Fiscalização e Resultados de 2019 da Receita Federal do Brasil<a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[3]</a> indica que ao longo de 2019 foram recebidos dados financeiros de aproximadamente 860 mil contas bancárias, provenientes de um total de 96 países, assim como informações oriundas de 34 países a partir das Declarações País a País, o que certamente irá implicar em fiscalizações futuras quando do processamento de tal volume de informações.
Ainda em atenção à diligência do Brasil em relação às práticas e acordos internacionais para troca de informações, importante destacar a atenção dada ao Judiciário tal tópico. Com efeito, quando da análise da constitucionalidade das disposições da Lei Complementar nº 105/2001, que estabeleceu a possibilidade de acesso às informações bancárias pelas autoridades fiscais sem necessidade de prévia autorização judicial, restou assinalado que tais disposições seriam constitucionais, inclusive em função dos "compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em matéria de compartilhamento de informações bancárias"<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[4]</a>.
<blockquote class="jota-article__eye">Em âmbito doméstico, o artigo 199 do Código Tributário Nacional - CTN, desde sempre assegurou a possibilidade das Fazendas Públicas da União, Estados, Distrito Federal e Municípios prestarem mútua assistência para fiscalização dos tributos de respectivas competências, assim como trocarem informações que venham a colaborar com procedimentos fiscalizatórios.</blockquote>
E neste sentido, embora tal prática de intercâmbio de informações não venha ocorrendo com a frequência esperada, sempre que provocado o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF, vem afirmando de forma consistente a legalidade em relação às trocas de informações entre as Fazendas Públicas, estabelecendo que "a troca de informações entre os diferentes fiscos não só é permitida pelo art. 199 do CTN e por precedentes administrativos e judiciais, com é salutar, desde que não fira os direitos do cidadão e desde que os elementos probatórios estejam todos presentes nos autos de modo a embasar o lançamento tributário específico" (Acórdão nº 1401-001.595).
O caso citado envolveu Contribuinte parte de um grupo empresarial com complexa organização societária, tendo sido relatado o não atendimento da Contribuinte aos diversos pedidos para apresentação de livros contábeis e fiscais, assim como outros documentos relativos à composição societária do grupo.
Diante da falta de colaboração da Contribuinte em relação às informações solicitadas - destaca-se que sequer os arquivos da Escrituração Contábil Digital - ECD, foram apresentados durante o procedimento de fiscalização - assim como pelos indícios que a sobreposição de empresas no grupo empresarial investigada tinha como objetivo promover uma suposta "blindagem patrimonial" dos efetivos sócios e controladores do grupo de empresas e geração indevida de despesas, entendeu a Fiscalização por arbitrar o lucro da Contribuinte para o correspondente lançamento do IRPJ em relação aos exercícios de 2009, 2010 e 2011.
No que interessa ao presente artigo, nota-se que para fins de lançamento por arbitramento o Fisco se valeu de informações fornecidas pelas Fazendas Públicas dos Estados em que a Contribuinte e outras empresas do mesmo grupo empresarial atuavam para fins de aferição da receita bruta da Contribuinte e, a partir daí, promover o lançamento por arbitramento.
Em relação a tal procedimento da Fiscalização, alegou a Contribuinte a nulidade da autuação em função da fundamentação empregada no auto valer-se de informações relativas a outros tributos que não objeto da autuação, de modo que a Fiscalização teria extrapolado seus limites de competência.
Ao afastar tal argumentação da Contribuinte, o Conselheiro-relator destacou que "considerações sobre contribuições previdenciárias e de ICMS foram trazidas para desenhar o cenário fático e construir a argumentação de que a Recorrente deixava de pagar todos os tributos devidos", de modo que o emprego de informações relativas ao ICMS devido pela Contribuinte não seria um impeditivo a suportar o lançamento do IRPJ com base no lucro arbitrado.
De mais a mais, a reforçar a legalidade e conveniência do intercâmbio de informações entre as Fazendas Públicas, argumentou o relator que "a troca de informações é algo muito proveitoso, pois colabora em situações nas quais se tenta algum tipo de estratégia para camuflar as operações", sustentando que a troca de informações proporciona um "reforço investigatório salutar, desde que não fira os direitos do cidadão".
Neste ponto entendemos que o Conselheiro-relator corretamente ponderou acerca dos poderes de fiscalização e direito à troca de informações. Com efeito, concordamos não haver qualquer ilegalidade ou impedimento ao intercâmbio de informações em face do que dispõe o artigo 199 do CTN e o próprio precedente do STF nos autos da ADIn 2.390/DF, já referida.
Por outro lado, tal procedimento não pode ser realizado de modo a violar direitos e garantias do cidadão consistentes, principalmente, no devido processo legal e direito à ampla defesa, exatamente como esclarecido no voto do Conselheiro-relator. Assim, da mesma maneira que, cada vez mais, inclusive a partir de práticas internacionais, se espera a devida transparência dos contribuintes em relação aos seus atos, também é correto esperar que o Fisco, ao exercer o seu poder de fiscalização, o faça de forma transparente e atento ao princípio do devido processo legal, devendo o investigado ser devidamente informado dos procedimentos relativos de troca de informações, até mesmo para possibilitar ao investigado o fornecimento sponte propria das informações que se busca alcançar pela colaboração entre os fiscos.
No caso ora em análise foi ainda destacado que a busca por informações complementares a partir de pedidos às Fazendas Públicas Estaduais decorreu de necessidade de se demonstrar a relação entre as diversas empresas do grupo empresarial ao qual pertencia à Contribuinte, ainda mais considerando a falta de colaboração desta ao longo do procedimento fiscalizatório, elemento este que, certamente, foi determinante para a decisão da Fiscalização de fazer valer as disposições do art. 199 do CTN para alcançar as informações necessárias para conclusão do lançamento.
Assim, de forma unânime, e considerando a autorização legislativa prevista no artigo 199 do CTN, confirmou a turma da Primeira Seção a legalidade dos procedimentos e utilização das informações obtidas a partir de dados detidos pelas Fazendas Públicas Estaduais para fundamentar o auto de infração para cobrança de IRPJ, lançado a partir do arbitramento do lucro.
Como afirmado acima, entendemos que cada vez mais os procedimentos fiscais instaurados a partir de informações obtidas a partir de informações detidas outras Fazendas Públicas se farão presentes. O desenvolvimento da tecnologia e rapidez nos atendimentos de tal pedidos, assim como a execução de convênios entre a União e Estados regulamentando tais procedimentos tendem a trazer mais segurança e eficiência na adoção de tais medidas.
De igual maneira, também esperamos um crescimento em número de autuações a partir das informações obtidas a partir dos acordos internacionais referidos no início deste artigo o que, conforme acima, já é uma realidade. Transparência, observadas as garantias fundamentais dos contribuintes - devido processo legal, ampla defesa, contraditório, etc., é a palavra de ordem no mundo tributário e os contribuintes devem estar preparados para essa nova realidade que, inclusive, é fundamental para a afirmação do Brasil como um país na linha de frente ao combate de planejamentos tributários abusivos, mesmo que pendente a edição de uma norma geral anti-elisiva no nosso ordenamento jurídico.
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[1] Global Forum 10 Years Report, disponível em <a href="https://www.oecd.org/tax/transparency/global-forum-10-years-report.pdf">https://www.oecd.org/tax/transparency/global-forum-10-years-report.pdf</a>
<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[2]</a> <a href="https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2017/junho/governo-brasileiro-solicita-ingresso-a-ocde-como-pais-membro">https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2017/junho/governo-brasileiro-solicita-ingresso-a-ocde-como-pais-membro</a>
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[3]</a> <a href="https://receita.economia.gov.br/dados/resultados/fiscalizacao/arquivos-e-imagens/plano-anual-de-fiscalizacao-resultados-de-2019-e-plano-para-2020.pdf/view">https://receita.economia.gov.br/dados/resultados/fiscalizacao/arquivos-e-imagens/plano-anual-de-fiscalizacao-resultados-de-2019-e-plano-para-2020.pdf/view</a>
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[4]</a> ADIn nº 2.390/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 24/06/2016,

Carf

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JOTA

CARF afirma a legalidade do procedimento previsto no art. 199 do CTN

Troca de informações entre as fazendas públicas

Sobre a troca de informações entre as fazendas públicas. CARF afirma a legalidade do procedimento previsto no art. 199 do CTN