Luciano Padua

O Brasil vive um momento de mudança de paradigma nas relações contratuais entre agentes privados e públicos. Três anos e meio após o surgimento da operação Lava-Jato, a aplicação das leis contra a corrupção se tornou mais eficiente e pressionou empresas a estabelecer programas de compliance mais robustos. Por outro lado, ainda pairam muitas dúvidas para as corporações que fecham contratos com o poder público.
Essa é a avaliação dos advogados Luciano Malara, sócio do escritório Percequillo, Cavalcanti, Malara e Munhoz Advogados, e Vitor Amuri Antunes, fundador do SPIN, um think tank para difusão de informações sobre parcerias público-privadas (PPP) para cidades inteligentes. Ambos debateram o tema “Compliance nas relações contratuais Público-Privadas” na Fenalaw, em São Paulo, nesta quarta-feira (25/10). 
A desconfiança entre as partes existe porque todos estão assustados com as punições  a empresários e agentes públicos envolvidos em licitações fraudulentas nos últimos anos. “Essa mudança não veio pela cultura, mas por medo”, afirmou Vitor Amuri. 
O receio, especialmente dos empresários que prestam serviços a governos e prefeituras, gera uma paralisia nas contratações e licitações. “Estamos numa fase de histeria múltipla extremada. Ninguém quer ter relacionamento com o poder público”, disse Malara. 
Para ele, que também foi diretor jurídico da Dell, é preciso fazer um forte planejamento de compliance antes de firmar contratos com agentes públicos. Esse planejamento começa bem antes de se fazer uma oferta em licitações. 
Normalmente, projetos e propostas para serviços a entes públicos costumam ser idealizados antes da realização do leilão. Por isso, regras internas claras de compliance ajudam a diminuir os riscos para as empresas. 
Neste processo, transparência é essencial. É importante deixar públicos os registros de encontros, especificações de produto e, sobretudo, treinar os funcionários que vão interagir com membros da administração pública.
Lei anticorrupção
A lei 12.846/13, também conhecida como lei anticorrupção, teve papel fundamental neste aspecto. Malara lembra que, apesar de criticado por juristas por não ser suficientemente preciso, o regramento definiu que o relacionamento entre agentes privados e públicos que prejudicar o poder público será passível de sanções - o que endurece as consequências nos casos de má-fé das partes. 
Apesar disso, os advogados consideram que a corrupção segue ocorrendo nos contratos firmados país afora, especialmente em cidades menores. Casos de achaque e pedidos de propina ainda são realidade entre empresários que prestam serviços a órgãos públicos. “Já recomendei a dois clientes: denuncie. Se não denunciar, você será o denunciado”, afirmou Amuri.  
Alguns novos instrumentos têm ajudado a trazer transparência a esse relacionamento. Um deles é o Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI), um procedimento administrativo consultivo por meio do qual o poder público permite a particulares apresentar um plano para projetos de concessões e de parcerias público-privadas (PPPs). 
“Muitos vêm se valendo do lobby institucionalizado, por meio dos PMI. Com ele, o privado tem um canal legítimo para oferecer ao poder público o que antes era oferecido em um pen drive”, disse Vitor Amuri. 
O número de PMI apresentados cresceu 500% desde 2010. Esse dado tende a crescer nos próximos anos: embora a lei que criou os PMI seja de 1995, sua regulamentação só veio em 2015, por meio do decreto 8.248/15. “Essa nova forma tem sido cada vez mais utilizada. É um caminho para nos livrarmos da chaga de formação de contratos, que são fruto de corrupção”, finalizou.

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Relação público-privada no país mudou por medo da punição

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