Andreu Wilson

A pandemia que nos atinge atualmente é o maior catalisador para profundas mudanças no mercado de trabalho em muitos anos. Embora a existência de tecnologia e equipamentos fosse amplamente disponível e a baixo custo para permitir a realização do teletrabalho ou de um regime de home office (no qual o empregado cumpre apenas parte da jornada no escritório), havia grande resistência das organizações quanto aos mecanismos de controle de jornada, produtividade e riscos legais.
Diante da impossibilidade do trabalho presencial, vimos as mais diversas empresas e prestadores de serviços migrarem emergencialmente para uma atuação remota. Com a experiência exitosa do trabalho remoto, vimos anúncios de empresas brasileiras e multinacionais de que manteriam o trabalho remoto definitivamente para parcela ou a totalidade de seus empregados. 
<a href="https://www.jota.info/produtos/poder?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Poder_materias"><img class="size-medium wp-image-292717 aligncenter" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/01/jota-pro-poder.jpg" alt="" width="688" height="688" /></a>Foram apontadas em inúmeras reportagens na imprensa que houve uma saudável diminuição do tempo de deslocamentos dos colaboradores, enquanto se verificou também um aumento da produtividade e corte de gastos fixos com a locação de salas comerciais<a href="#_ftn1" name="_ftnref1">[1]</a><a href="#_ftn2" name="_ftnref2">[2]</a>, bem como que 30% das empresas brasileiras pretendem manter o home office em suas jornadas de trabalho após a pandemia do novo coronavírus<a href="#_ftn3" name="_ftnref3">[3]</a>.
Por outro lado, são frequentes as críticas de profissionais de que o trabalho em home office teria levado a um aumento da jornada de trabalho<a href="#_ftn4" name="_ftnref4">[4]</a>, a famosa Zoom fatigue (causada em razão das frequentes reuniões que se disseminaram), assim como dificuldades principalmente para mulheres responsáveis pelo cuidados com os filhos e pessoas que não tem um espaço doméstico preparado para o exercício de atividades profissionais, como um escritório ou ao menos mesas e cadeiras adequadas<a href="#_ftn5" name="_ftnref5">[5]</a><a href="#_ftn6" name="_ftnref6">[6]</a>.
Neste cenário, é preciso reconhecer a necessidade de uma nova forma de gestão desta modalidade de trabalho para que deixe de ser uma solução temporária e traga benefícios permanentes tanto para as empresas quanto para seus colaboradores.
Para tanto, empresas que se estruturem de forma menos vertical e que o controle da produtividade dos empregados ocorra em razão das entregas e não apenas das horas trabalhadas serão mais capazes de migrarem o trabalho de grandes contingentes de seus empregados para o home office sem que haja rupturas na produtividade ou que a manutenção da produtividade dos times somente seja mantida ou ampliada por meio de um aumento na jornada de trabalho diária.
<blockquote class="jota-article__eye">A experiência internacional aponta um caminho no qual a escolha pelo trabalho remoto seja mutuamente benéfica para empresas e empregados, bem como permitindo que pessoas qualificadas deixem de trabalhar exclusivamente nas grandes metrópoles e possam viver em regiões com menor custo de vida.</blockquote>
Uma tendência já vista na indústria bancária norte-americana de realocar mão-de-obra para cidades com menor custo de vida e um conjunto de pessoas qualificadas<a href="#_ftn7" name="_ftnref7">[7]</a><a href="#_ftn8" name="_ftnref8">[8]</a>, bem como em outras indústrias<a href="#_ftn9" name="_ftnref9">[9]</a>, deve se intensificar com a normalização do trabalho remoto e a possibilidade de continuar trabalhando em atividades típicas de grandes metrópoles, mas em cidades menores, mais seguras e com um custo de vida mais baixo.
Para vermos também no contexto brasileiro um espraiamento dos empregos qualificados, diminuindo a brutal necessidade de concentração da população nas megalópoles Rio de Janeiro e São Paulo, fenômeno que se repete em menor escala nas capitais estaduais, há a necessidade de que o trabalho remoto seja regulado de forma a dar segurança jurídica aos empregadores, incluindo as presentes obrigações quanto à segurança do trabalho no ambiente doméstico, possibilidade de fornecimento de auxílios relativos aos gastos com energia elétrica e internet, bem como a segurança da informação.
Acreditamos que o futuro do trabalho envolverá organizações mais fluidas, com menor cobrança pela realização do trabalho tradicional das 9 às 18 horas, permitindo que os colaboradores tenham maior controle sobre o seu dia e podendo incluir atividades como cuidados com os filhos, realização de cursos de aperfeiçoamento no horário “normal” de trabalho.
Esse futuro imaginado somente se realizará na sua potencialidade se políticas de segurança da informação forem estritamente observadas e sua inobservância puder resultar em sanções, inclusive a demissão por justa causa, se a flexibilidade da jornada de trabalho não implicar em pagamento de horas extras ou adicionais em razão do trabalho noturno ou aos finais de semana, etc. Isso porque temos visto um aumento excepcional dos ataques às redes de comunicação em razão da menor segurança das redes domésticas.
Desta forma, a disponibilização por parte das empresas provedoras de aceso à internet de canais dedicados ao trabalho remoto para clientes residenciais é um passo crucial para que o trabalho à distância não se torne uma vulnerabilidade permanente para as empresas, o que restringiria a quantidade e qualificação dos profissionais que poderiam exercer o seu trabalho remotamente.
Da mesma forma, a ausência de uma infraestrutura de telecomunicações e de transporte ferroviário e aéreo de alta qualidade impedirá que o talento local tenha que se mudar para grandes centros ou possa se dirigir às cidades menores, sendo necessário um verdadeiro “choque” de infraestrutura para assegurar que as pessoas terão a capacidade de trabalhar fora das metrópoles, mas estando há poucas horas de distância quando necessário.
A defesa desses pontos não implica a desconsideração pela necessidade de haver um equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, mas tão somente que, com base numa carga razoável de trabalho, as pessoas devem ter a mais ampla liberdade para estabelecerem por si mesmos qual o melhor horário para o exercício de suas atividades sem que isso implique uma judicialização que limitaria a adoção do teletrabalho.
Caso abracemos o trabalho remoto como uma forma eficiente e saudável de trabalho, não meramente uma alternativa emergencial, o sonho até então restrito a pouquíssimos de trabalhar de qualquer lugar do mundo ou se mudar por razões familiares ou acadêmicas sem abdicar do seu trabalho atual será factível para um número maior de pessoas<a href="#_ftn10" name="_ftnref10">[10]</a><a href="#_ftn11" name="_ftnref11">[11]</a>.
Mas o futuro do mercado de trabalho não chegará ao Brasil caso não tenhamos uma política que permita o trabalho remoto de estrangeiros no país, tampouco teremos êxito caso a legislação trabalhista e a Justiça do Trabalho não se engajem num futuro mais flexível do trabalho, no qual exames admissionais e demissionais, homologação das rescisões dos contratos de trabalho e contratações, sejam feitas de forma remota.
Idealmente, entendemos que o misto de trabalho remoto e presencial é valioso para a formação dos profissionais, devendo a legislação incentivar a manutenção das relações de trabalho independentemente de do local em que o trabalho seja prestado.
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<a href="#_ftnref1" name="_ftn1">[1]</a> Valor Econômico. Empresas já adotam o home office definitivo. Disponível em: <a href="https://valor.globo.com/impresso/noticia/2020/06/08/empresas-ja-adotam-o-home-office-definitivo.ghtml">https://valor.globo.com/impresso/noticia/2020/06/08/empresas-ja-adotam-o-home-office-definitivo.ghtml</a>  Acesso em: 27 abr. 2021
<a href="#_ftnref2" name="_ftn2">[2]</a> Diário do Nordeste. Home office conquista empresas e deve ser mantido após pandemia. Disponível em: <a href="https://valor.globo.com/impresso/noticia/2020/06/08/empresas-ja-adotam-o-home-office-definitivo.ghtml"> https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/negocios/home-office-conquista-empresas-e-deve-ser-mantido-apos-pandemia-1.2960215</a>  Acesso em: 27 abr. 2021
<a href="#_ftnref3" name="_ftn3">[3]</a> Brasil Econômico. No Brasil, 30% de empresas devem manter home office depois da pandemia. Disponível em: <a href="https://economia.ig.com.br/2020-06-11/no-brasil-30-de-empresas-devem-manter-home-office-depois-da-pandemia.html">https://economia.ig.com.br/2020-06-11/no-brasil-30-de-empresas-devem-manter-home-office-depois-da-pandemia.html</a> Acesso em: 27 abr. 2021
<a href="#_ftnref4" name="_ftn4">[4]</a> Folha de São Paulo. Home office na pandemia pode levar profissionais à exaustão. Disponível em: <a href="https://www1.folha.uol.com.br/sobretudo/carreiras/2020/04/home-office-na-pandemia-pode-levar-profissionais-a-exaustao.shtml">https://www1.folha.uol.com.br/sobretudo/carreiras/2020/04/home-office-na-pandemia-pode-levar-profissionais-a-exaustao.shtml</a> Acesso em: 27 abr. 2021
<a href="#_ftnref5" name="_ftn5">[5]</a> Você S/A. Piores empresas para trabalhar: quando o home office é o pesadelo. Disponível em: <a href="https://vocesa.abril.com.br/carreira/piores-empresas-para-trabalhar-home-office/">https://vocesa.abril.com.br/carreira/piores-empresas-para-trabalhar-home-office/</a> Acesso em: 27 abr. 2021
<a href="#_ftnref6" name="_ftn6">[6]</a> UOL. 6 motivos que tornam o home office mais cansativo que o trabalho presencial. Disponível em: <a href="https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2020/04/16/6-motivos-que-deixam-o-home-office-mais-cansativo-que-o-trabalho-presencial.htm?cmpid=copiaecola">https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2020/04/16/6-motivos-que-deixam-o-home-office-mais-cansativo-que-o-trabalho-presencial.htm?cmpid=copiaecola</a> Acesso em: 27 abr. 2021
<a href="#_ftnref7" name="_ftn7">[7]</a> Quartz. How Charlotte, North Carolina, became the banking hub of the American south. Disponível em:  <a href="https://qz.com/1545417/charlotte-becomes-major-banking-hub-due-to-bbt-suntrust-merger/">https://qz.com/1545417/charlotte-becomes-major-banking-hub-due-to-bbt-suntrust-merger/</a>  Acesso em: 27 abr. 2021
<a href="#_ftnref8" name="_ftn8">[8]</a> Forbes. JPMorgan Reportedly Moving Thousands Of Well-Paid Jobs Out Of New York City—This Does Not Bode Well For Workers On Wall Street. Disponível em: <a href="https://www.forbes.com/sites/jackkelly/2019/10/28/jpmorgan-is-continuing-the-alarming-trend-of-moving-thousands-of-well-paid-jobs-out-of-new-york-citythis-does-not-bode-well-for-workers-on-wall-street/#dc28f73a7a54">https://www.forbes.com/sites/jackkelly/2019/10/28/jpmorgan-is-continuing-the-alarming-trend-of-moving-thousands-of-well-paid-jobs-out-of-new-york-citythis-does-not-bode-well-for-workers-on-wall-street/#dc28f73a7a54</a> Acesso em: 27 abr. 2021
<a href="#_ftnref9" name="_ftn9">[9]</a> The Wall Street Journal. Workers Are Fleeing Big Cities for Smaller Ones—and Taking Their Jobs With Them: Places including Boise and Denver are growing fast, partly because of employees working remotely. Disponível em: <a href="https://www.wsj.com/articles/workers-are-fleeing-big-cities-for-small-onesand-taking-their-jobs-with-them-11567848600">https://www.wsj.com/articles/workers-are-fleeing-big-cities-for-small-onesand-taking-their-jobs-with-them-11567848600</a> Acesso em: 27 abr. 2021
<a href="#_ftnref10" name="_ftn10">[10]</a> The Telegraph. Estonia launches 'digital nomad visa' as remote working becomes the norm. Disponível em: <a href="https://www.telegraph.co.uk/travel/news/estonia-launches-digital-nomad-visa-remote-work-norm-pandemic-hit-tourism/">https://www.telegraph.co.uk/travel/news/estonia-launches-digital-nomad-visa-remote-work-norm-pandemic-hit-tourism/</a> Acesso em: 27 abr. 2021
<a href="#_ftnref11" name="_ftn11">[11]</a> Republic of Stonia.  Estonia is launching a new Digital Nomad Visa for remote workers. Disponível em: <a href="https://e-resident.gov.ee/nomadvisa/">https://e-resident.gov.ee/nomadvisa/</a> Acesso em: 27 abr. 2021

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