Elisa Berton Eidt

Dentre as inúmeras e necessárias reflexões que o momento atual vem provocando no mundo jurídico, não é necessário muito esforço para constatar o incentivo ao diálogo e à utilização de meios consensuais como ferramentas para amenizar conflitos.
Se o contexto atual nos remete para uma inédita desestabilização das relações, parece sensato buscar alternativas que conduzam à direção oposta, por meio de construções conjuntas e que ponderem os legítimos interesses envolvidos em cada situação.
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Quando do outro lado da relação está alguma autoridade, também parece que o senso comum leva a sociedade a buscar o auxílio de uma outra autoridade para solução do conflito.
Em outras palavras, situações controversas em que a Administração se vê compreendida são definidas, em sua grande maioria, por meio do Poder Judiciário, a partir da imposição da sentença judicial e da coerção inerente a esta função jurisdicional.
No entanto, ao se investigar a mais recente legislação, percebe-se que os incentivos para tais construções conjuntas também existem em relação ao poder público em geral.
Talvez pegando carona com o princípio da consensualidade que veio expresso no Código de Processo Civil (art. 3, §3º), ou reverberando o esforço que a doutrina mais contemporânea de Direito Administrativo vem fazendo neste sentido, o fato é que o legislador lança mão de inúmeros dispositivos a fim de permitir que o agente público se utilize do acordo como legítima opção de ato administrativo.
Interessante analisar que a competência legal para a adoção do acordo pela Administração é disposta de forma aberta e discricionária, no intuito de conceder maior liberdade de opção ao agente público.
Assista ao novo episódio do podcast Sem Precedentes sobre coesão do STF ao manter inquérito das fake news:
https://www.youtube.com/watch?v=T_EybueUsPo
Em relação aos critérios para a utilização da via consensual, também o legislador cuidou de não restringir o seu conteúdo, utilizando-se de conceitos indeterminados como “razões de relevante interesse geral” ou “juízo de oportunidade e conveniência”.
É o que ocorre por exemplo, no art. 26 da Lei 13.655/2018 (LINDB), que trata da possibilidade de substituição da aplicação de sanções por compromissos a serem assumidos pelo administrado; no art. 1º, §2º, da Lei nº 13.988/20, que trata da transação relativa a créditos tributários e não tributários, em âmbito federal; no art. 10-B da Lei 13.867/2019, que trata da mediação ou arbitragem nas desapropriações; no art. 2º do Decreto Federal nº 10.201/20, que trata das transações relativas a créditos a pagar pelo poder público federal e, por fim, no art. 32 da Lei 13.140/2015 (Lei da Mediação).
Sobre este último dispositivo, a lei fala em autocomposição na Administração, de modo a abranger tanto a negociação, a mediação, a conciliação ou qualquer outro desenho que não implique a imposição de decisão.
<blockquote class="jota-article__eye">Tais métodos são desenvolvidos por meio das denominadas câmaras administrativas, que devem ser instaladas nos órgãos de advocacia pública de cada ente federado.</blockquote>
Muito inspirado no modelo que já existe na Administração Federal, desde a edição da Lei da Mediação, estados e municípios também estão autorizados a criarem espaços institucionais que visem a prevenção e a resolução consensual de conflitos em que se veem envolvidos.
Os advogados públicos, portanto, estão incumbidos na tarefa de contribuir para a utilização do procedimento participativo e do consenso como ferramentas de agir da Administração.
Seja na orientação aos gestores públicos, seja na defesa dos entes federativos, a advocacia pública permite que a opção pela via consensual seja feita de maneira motivada e levando em consideração as circunstâncias do caso concreto.
De modo que, a menos que se incorra em alguma ilegalidade, tal opção deve ser respeitada por todos os atores do sistema de justiça, incluindo-se aí os órgãos de controle.
Visando contribuir para o fomento da autocomposição nos órgãos de advocacia pública, foi criada a Rede Nacional de Autocomposição da Advocacia Pública (RENAAP), composta pela Advocacia-Geral da União, representada pela CCAF (Câmara de Conciliação da Administração Federal) e pelas Procuradorias-Gerais dos Estados do Acre, de Alagoas, da Bahia, do Distrito Federal, do Espírito Santo, de Goiás, do Pará, do Paraná, de Pernambuco, do Rio de Janeiro, do Rio Grande do Norte, do Rio Grande do Sul, de Roraima, de Santa Catarina e de São Paulo.
No estado do Rio Grande do Sul, o funcionamento da câmara administrativa já é uma realidade. Desde o ano de 2016, o Centro de Conciliação e Mediação está em funcionamento no âmbito da Procuradoria-Geral do Estado.
O procedimento administrativo participativo ganhou um espaço institucional, em que o acordo pode ser o resultado ou, ao menos (o que não é pouco), a aproximação entre os órgãos da Administração estadual e a sociedade gaúcha.
O caminho da consensualidade vem sendo construído na prática, com soluções criativas, contemporâneas aos fatos e em situações inclusive inesperadas, de difícil previsão antecipada, tal como quis o legislador. Tal como querem aqueles que priorizam o diálogo ao litígio, por favor.

solução de conflito

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JOTA

A consensualidade pode ser construída com soluções criativas, contemporâneas aos fatos e em situações inesperadas

A vontade do legislador para a realização de acordos: mais consenso, por favor

A consensualidade pode ser construída com soluções criativas, contemporâneas aos fatos e em situações inesperadas