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Direito do Trabalho

Salário utilidade ou in natura: o que mudou?

Uma análise dos reflexos da reforma Trabalhista no salário utilidade

Lilian Katiusca
07/06/2018|14:31
Transporte destinado ao deslocamento para o trabalho pode ser considerado salário utilidade? Crédito: Pixabay

Salário in natura: conceito

Embora o art. 457, da CLT, tenha sofrido expressiva alteração quanto às suas parcelas, fazendo com que sejam consideradas partes integrantes do salário o valor fixo estipulado, as comissões e as gratificações legais, o conceito de salário utilidade ou in natura foi integralmente mantido. Significa dizer que é possível o pagamento de parte salário (pelo menos 30% o empregado deverá receber em dinheiro) com o fornecimento de bens utilidades pelo empregador ao empregado, de forma habitual e contraprestativa, tais como alimentação, moradia e vestuário.

Nos termos do caput do art. 458, é proibido o pagamento de parte do salário do empregado com o fornecimento de bebidas alcóolicas ou dogras nocivas.

Vale destacar que, em conformidade com a Súmula 367, do TST (não foi prejudicada pela lei 13.467/2017), a habitação, energia elétrica e veículo fornecidos pelo empregador não serão considerados salário utilidade quando essenciais à prestação dos serviços.

Percebe-se, pois, pela referida da Súmula 467, do TST, que o caput do art. 458, segundo o qual a alimentação, moradia e vestuário possuem natureza salarial, não é absoluta. Deve-se analisar, no caso concreto, as utilidades das quais se destaca a característica da contraprestatividade ou seja, a utilidade deverá ser fornecida pelos serviços prestados, e não PARA prestar serviços. Nesse caso, elas serão consideradas instrumento trabalho e, como tal, serão custeadas pelo empregador.

Segundo o art. 457, parágrafo 2o, da CLT, pós Reforma, o auxílio alimentação não terá natureza salarial, vedado seu pagamento em dinheiro. Pode-se interpretar a regra, comparando-a à manutenção do caput do art. 458 da CLT, em análise, da seguinte forma:

-auxílio alimentação, vedado seu pagamento em dinheiro (entra como cartão alimentação, ticket, vale alimentação, etc.): não tem natureza salarial; PREJUDICIALIDADE DA SÚMULA 241, DO TST e da OJ 133, da SDI-I, uma vez que é vedado o pagamento em dinheiro.

-auxílio alimentação pago em dinheiro: fraude à nova regra implementada pela Lei 13.467/2017: o valor terá natureza salarial.

-Alimentação “em espécie” recebida pelo empregado do empregador, de forma contraprestativa e habitual: tem natureza de salário utilidade, nos termos do art. 458, caput, da CLT, sendo permitido o desconto de até 20% do salário do empregado urbano em detrimento do seu fornecimento.

Benefícios concedidos aos empregados destituídos de natureza salarial

As excludentes do art. 458. parágrafo 2o, da CLT, foram todas mantidas pelo texto da Reforma. Percebe-se, pois, um extenso rol de benefícios a serem fornecidos pelo empregador, a favor dos seus empregados, cujos valores não terão natureza salarial. Significa dizer que, mesmo que fornecidas com habitualidade e de forma contraprestativa, não servirão como base de cálculo para parcelas trabalhistas e previdenciárias.

O não reconhecimento de natureza salarial destas utilidades tem como objetivo estimular o empregador a oferecê-las aos seus empregados, já que não causam uma majoração na base de cálculo das parcelas trabalhistas.

Importante ressaltar que o rol de utilidades não salariais do art. 458, parágrafo 2o, da CLT, não pode ser considerado taxativo após a promulgação da Lei 13.467/2017. Em detrimento desta, os equipamentos tecnológicos e infraestrutura fornecidos para o teletrabalhador, bem como a manutenção destes, não integra a remuneração do empregado, ou seja, não possuem natureza salarial.

O legislador reformista considerou que os equipamentos e infraestrutura são considerados instrumentos de trabalho e, como tais, o fornecimento é obrigação do empregador para possibilitar a execução das atividades pelo empregador em regime de teletrabalho. Nesse sentido, assim determina o novo art. 75-D, da CLT (introduzido pela Lei 13.467/2017):

Art. 75-D.  As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito.  

Parágrafo único.  As utilidades mencionadas no caput deste artigo não integram a remuneração do empregado. (grifado)

Portanto, ao lado das utilidades não salariais previstas no art. 458, parágrafo 2o, é essencial inserir também os equipamentos e infraestrutura fornecidos pelo empregador ao empregado em regime de teletrabalho, uma vez que são considerados essenciais PARA a prestação de serviços.

Vale lembrar que, de acordo com a Súmula 342, do TST, embora destituídos de natureza salarial, é possível que haja desconto no salário do empregado em detrimento da sua inclusão a seu benefício e de seus dependentes, em planos de assistência odontológica, médico-hospitalar, seguro e previdência privada, ou de entidade cooperativa, cultural ou recreativo-associativa. Porém, para validade do referido desconto, é necessário que haja autorização prévia e por escrito do empregado.

A Súmula 342, do TST, não sofreu qualquer prejuízo em relação à Reforma Trabalhista. Tais benefícios permanecem destituídos de natureza salarial, sendo permitido o desconto do salário do empregado mediante previsão expressa escrita nesse sentido.

A seguir, será feita análise do art. 458, parágrafos 3o e 4o, ambos mantidos pela Reforma Trabalhista.

Salário in natura dos urbanos, rurais e domésticos: análise comparativa

Uma vez fornecidas como salário utilidade, a alimentação e a moradia deverão atender aos fins a que se destinam e os valores correspondentes a cada uma não poderão exceder a 20% e 25%, respectivamente, do salário contratual do empregado. Significa dizer que, para tais utilidades , o legislador limitou o valor salarial a que se atribui a cada uma.

Em relação aos empregados rurais, a Lei 5.889/73 estabelece regra específica em relação aos descontos da alimentação e moradia, sendo estes de 25% e 20%, respectivamente, do salário mínimo, e não do salário contratual do empregado. Tal regra se encontra prevista no art. 9o da referida Lei:

Art. 9º Salvo as hipóteses de autorização legal ou decisão judiciária, só poderão ser descontadas do empregado rural as seguintes parcelas, calculadas sobre o salário mínimo:

a) até o limite de 20% (vinte por cento) pela ocupação da morada;

b)até o limite de 25% (vinte por cento) pelo fornecimento de alimentação sadia e farta, atendidos os preços vigentes na região;

c) adiantamentos em dinheiro.

Para os empregados domésticos, de acordo com o art. 18 da LC 15/2015, em regra é vedado o empregador descontar despesas referentes ao fornecimento de alimentação, vestuário, moradia, bem como despesas com transporte hospedagem e alimentação em caso de acompanhamento em viagem. Porém, se a moradia for em local diverso do que ocorre a prestação de serviços, as despesas provenientes do seu fornecimento poderão ser descontadas desde que tal possibilidade tenha sido acordada pelas partes.

Quanto à inclusão do empregado doméstico em planos de assistência médico-hospitalar e odontológica, de seguro e de previdência privada, o desconto no salário do empregado não poderá ultrapassar a 20% do seu salário.

Vale a ressalva no sentido de que, diferentemente do que ocorre com os empregados urbanos e rurais, a alimentação e a moradia, para o empregado doméstico, não terão natureza salarial.

Sobre a composição do salário dos empregados domésticos, em relação à temática salário in natura, merece destaque o art. 18, da LC 150/2015, a seguir:

Art. 18.  É vedado ao empregador doméstico efetuar descontos no salário do empregado por fornecimento de alimentação, vestuário, higiene ou moradia, bem como por despesas com transporte, hospedagem e alimentação em caso de acompanhamento em viagem. 

§ 1o  É facultado ao empregador efetuar descontos no salário do empregado em caso de adiantamento salarial e, mediante acordo escrito entre as partes, para a inclusão do empregado em planos de assistência médico-hospitalar e odontológica, de seguro e de previdência privada, não podendo a dedução ultrapassar 20% (vinte por cento) do salário. 

§ 2o  Poderão ser descontadas as despesas com moradia de que trata o caput deste artigo quando essa se referir a local diverso da residência em que ocorrer a prestação de serviço, desde que essa possibilidade tenha sido expressamente acordada entre as partes. 

§ 3o  As despesas referidas no caput deste artigo não têm natureza salarial nem se incorporam à remuneração para quaisquer efeitos. 

§ 4o  O fornecimento de moradia ao empregado doméstico na própria residência ou em morada anexa, de qualquer natureza, não gera ao empregado qualquer direito de posse ou de propriedade sobre a referida moradia

Quanto ao art. 458, parágrafo 4o, regra que também foi mantida pela Reforma Trabalhista. Portanto, permanece a obrigatoriedade de individualização da moradia quando se tratam de famílias distintas. Destaca-se, pois, que tal individualização se faz por família, e não por sexo.

No quadro a seguir, será destacada o reflexo da Lei 13.467/2017 em relação ao art. 458, da CLT, quanto à inserção do parágrafo 5o, inaugurando mais um benefício destituído de natureza salarial.

Reflexos da Reforma Trabalhista no salário utilidade

Complementando a regra do art. 458, inciso IV, segundo a qual “assistência médica, hospitalar e odontológica, prestada diretamente ou mediante seguro-saúde”, o legislador reformista esclareceu que, sendo tal assistência prestada por serviço próprio ou de terceiro, o valor destinado a estas despesas não terá natureza salarial.

Também não terá natureza salarial o reembolso de despesas com medicamentos, óculos, aparelhos ortopédicos, próteses, órteses, despesas médico-hospitalares e outras similares, mesmo quando concedido em diferentes modalidades de planos e coberturas.

Assim, considerando as alterações da Lei 13.467/2017 referentes à inserção do art. 75-D e do parágrafo 5º do art. 458, na CLT, bem como as regras mantidas pela Reforma, pode-se afirmar que não serão consideradas salário utilidade:

  • -Vestuários, equipamentos e outros acessórios fornecidos aos empregados e utilizados no local de trabalho, para a prestação dos serviços;

  • -Educação, em estabelecimento de ensino próprio ou de terceiros, compreendendo os valores referentes à matrícula; mensalidade, anuidade, livros e material didático;

  • -Transporte destinado ao deslocamento para o trabalho e retorno, em percurso servido ou não por transporte público;

  • -Assitência médica, hospitalar e odontológica;

  • -Seguros de vida e de acidentes pessoais;

  • -Previdência privada;

  • -Valor referente ao vale cultura;

  • -Equipamentos e infraestrutura fornecidas ao empregado em regime de teletrabalho, bem como as despesas de manutenção que realizadas pelo empregador;

  • -O valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico, próprio ou não, inclusive o reembolso de despesas com medicamentos, óculos, aparelhos ortopédicos, próteses, órteses, despesas médico-hospitalares e outras similares, mesmo quando concedido em diferentes modalidades de planos e coberturas.

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