Lorena G. Barberia

Faltando 70 dias para o primeiro turno das <a href="https://www.jota.info/eleicoes">eleições de 2022</a> no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro oficializou no último domingo (24) sua candidatura à reeleição. Semelhante às suas falas nas últimas semanas, Bolsonaro insiste que a economia brasileira está em tendência de recuperação econômica. Apesar desse discurso, sua candidatura não está em posição confortável nas pesquisas de intenção de voto. Embora distante de vários candidatos, Bolsonaro permanece em segundo lugar, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Contrariamente às afirmações do presidente, prognósticos do desempenho da economia brasileira não são nada otimistas. <a href="https://www.imf.org/external/datamapper/NGDP_RPCH@WEO/OEMDC/ADVEC/WEOWORLD?year=2022">As projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI)</a> de abril de 2022 previam um crescimento real de 0,8% em 2022 para o Brasil, uma taxa menor que todas as outras economias da região, com exceção do Paraguai, que deve crescer 0,3% (ver Figura 1). Em contraste, o FMI tem uma previsão mais favorável para as outras economias da região. Para a Venezuela, por exemplo, que Bolsonaro frequentemente considera uma economia em colapso, o FMI prevê um desempenho duplamente superior ao da economia brasileira.
O desempenho da economia venezuelana pode ser comparado ao ritmo de crescimento da chilena. A Colômbia, que acaba de eleger o ex-senador e economista Gustavo Petro em uma eleição histórica e excepcional, foi projetada a crescer 5,8% neste ano. Mesmo com esta tendência promissora do desempenho da economia, os eleitores colombianos elegeram um candidato da esquerda para governar o país pelos próximos quatro anos. É um fato inédito na história da Colômbia, que nunca elegeu um candidato declaradamente de esquerda.
Figura 1 - Crescimento real do PIB (variação percentual anual) de acordo com FMI
[caption id="attachment_383241" align="aligncenter" width="628"]<img class="wp-image-383241 size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2022/07/mapa-fmi.png" alt="" width="628" height="366" /> Fonte: FMI, World Economic Outlook (2022)[/caption]
Os severos problemas econômicos que o Brasil enfrenta contrastam com os argumentos que Bolsonaro tem defendido desde o início da pandemia. Em seu discurso no último domingo, o presidente fez questão de destacar que seu governo não admitiu sacrificar o crescimento econômico para salvar vidas. Como ele afirmou em seu discurso, “em 2020, onde muitos obrigaram todos a ficar em casa, eu falei: vamos combater o vírus e também fazer com que a nossa economia não seja destruída com a obrigação de ficar em casa". Na véspera de nova eleição presidencial, essas afirmações parecem não estar produzindo os resultados esperados.
Considerando que seu principal oponente é oriundo do Partido dos Trabalhadores (PT), chamou a atenção a ausência da discussão de temas como emprego e renda no recente pronunciamento de Bolsonaro. Isso surpreende porque o mandatário não se referiu em momento algum aos dados econômicos relativos à sua gestão. No caso do desemprego, os dados divulgados pelo IBGE para o segundo trimestre de 2022 apontam que há uma melhora significativa da taxa de desocupação, retornando aos níveis do primeiro ano do governo Bolsonaro, antes da pandemia.
O país, atualmente, possui 9 milhões de pessoas desempregadas. Este elevado número, próximo ao total da população de Portugal, é preocupante, pois, por trás de cada desempregado há crianças, aposentados e outros grupos vulneráveis. Outro tema ausente no discurso de Bolsonaro foi renda. Como mostra a Figura 2, após o primeiro ano do governo Bolsonaro, quando o rendimento médio mensal real da população residente teve um aumento, o país vive uma queda sustentada do rendimento médio real habitualmente recebido pelas pessoas de 14 anos ou mais de idade.
A queda nos rendimentos afeta não só o trabalhador em si, mas toda a população que depende dos mesmos, entre eles aposentados e pensionistas em geral. Em parte, estas quedas podem ser explicadas pela crescente inflação, um <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/lorena-barberia/impactos-inflacao-reeleicao-bolsonaro-24022022">tema que já nos dedicamos a analisar nesta coluna</a>. Na oportunidade, procuramos enfatizar que os níveis de inflação no Brasil são comparativamente superiores aos níveis observados em outros países, sugerindo que há fatores além do contexto internacional que afetam este fenômeno no Brasil.
Ademais, como os dados da Figura 2 indicam, os eleitores brasileiros parecem entender que os maus resultados da política econômica do país se devem à administração do governo Bolsonaro. Isso porque há uma correlação entre renda média e avaliação do governo Bolsonaro.
Figura 2 - Avaliação popular de Bolsonaro como positivo ou regular e renda média, dados trimestrais de 2019 até o 1º trimestre de 2022
[caption id="attachment_383248" align="aligncenter" width="568"]<img class="wp-image-383248 size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2022/07/graf-bolso-1.png" alt="" width="568" height="414" /> Fontes: IBGE e Agregador do JOTA[/caption]
Qual é a solução que o presidente parece visualizar para uma melhoria na vida dos brasileiros? Em suas recentes manifestações tem feito uma única promessa para um possível primeiro ano de um novo governo: que o aumento temporário do Auxílio Brasil será mantido em 2023 em R$ 600. E, para este auxílio não perder seu poder de compra, Bolsonaro explica que o combate à inflação ao longo do último ano priorizou uma estratégia de “trickle-down economics”, ou seja, exonerar os impostos federais do gás de cozinha (desde 2021), do diesel (há quatro meses) e estabelecer um teto no ICMS, este sob responsabilidade dos governos estaduais. Em teoria, estes cortes irão estimular a economia e gerar crescimento.
Com base nestas políticas e em outros tímidos investimentos na infraestrutura energética e rodoviária, o presidente chegou a afirmar recentemente: “Tenho certeza: teremos deflação no corrente mês". Ou seja, ao contrário de uma campanha que promete produzir trabalho, renda e fortalecer o Estado de bem-estar social, Bolsonaro sinaliza que irá concentrar sua campanha em promessas baseadas em programas para transferir renda para os mais pobres, para caminhoneiros e taxistas e enfrentar a crescente inflação via redução de impostos.
Qual é o problema com esta estratégia? Ao se referir ao Auxílio Brasil e insistir que foi expandido, Bolsonaro com certeza procura chegar no eleitorado mais pobre que, em geral, tem tendência elevada de apoiar Lula na corrida eleitoral. Por outro lado, o auxílio de 2020 não é o mesmo em 2022 e será ainda menor em 2023. De fato, se corrigido pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), o valor atual do auxílio deveria ser de R$ 734 para seu valor ser equivalente ao de maio de 2020.
O auxílio emergencial foi concedido para 68 milhões de brasileiros, mas, aos poucos, o número de pessoas que recebem o benefício foi diminuindo. Atualmente, 18 milhões de pessoas recebem o Auxílio Brasil. Ou seja, 50 milhões de pessoas foram excluídas de receber qualquer auxílio do governo federal, mesmo nos casos de famílias que permanecem em uma situação de vulnerabilidade (ver Tabela 1).
Ao contrário do Bolsa Família, não há um programa social por trás do Auxílio Brasil. Com isso, não há como esse programa fortalecer as famílias em suas trajetórias de mobilidade social e econômica. Com o teto de gastos, a ampliação deste programa tem implicações e provavelmente resulte em cortes em gastos em educação e saúde, duas áreas negligenciadas e prejudicadas ao longo da pandemia, em situação crítica, se comparadas com a de outros países, ou com níveis inferiores de investimentos demostrados em anos anteriores aos do atual governo.
Tabela 1 - Auxílio emergencial e Auxílio Brasil
<table width="602">
<tbody>
<tr>
<td style="width: 99.3125px;">Programa e data de início</td>
<td style="width: 154.859px;">Total de benefício</td>
<td style="width: 75.9688px;">Total de parcelas</td>
<td style="width: 143.57px;">Número e tipo de beneficiários</td>
<td style="width: 101.336px;">Total de recursos alocados</td>
</tr>
<tr>
<td style="width: 99.3125px;">Auxílio emergencial I (abr. a  dez.2020</td>
<td style="width: 154.859px;">R$ 600 e depois 
R$ 300</td>
<td style="width: 75.9688px;">5 e 
4</td>
<td style="width: 143.57px;">68 milhões de brasileiros incluindo trabalhadores informais, desempregados, contribuintes individuais do INSS e MEIs</td>
<td style="width: 101.336px;">R$ 230 bilhões</td>
</tr>
<tr>
<td style="width: 99.3125px;">Auxílio emergencial II (abr.2021 a out.2021)</td>
<td style="width: 154.859px;">O valor era definido de acordo com a condição do beneficiário. Caso morasse sozinho, era de R$ 150. Famílias com mais de uma pessoa e que não fossem chefiadas por mulheres receberam R$ 250 e famílias chefiadas por mulheres, R$ 375</td>
<td style="width: 75.9688px;">7</td>
<td style="width: 143.57px;">40 milhões de famílias. Trabalhadores informais ou beneficiários do Bolsa Família, pessoas com renda familiar mensal de até três salários mínimos da época (R$ 3.300) ou ter renda familiar por pessoa de até meio salário mínimo da época (R$ 550)</td>
<td style="width: 101.336px;">R$ 102 bilhões</td>
</tr>
<tr>
<td style="width: 99.3125px;">Auxílio Brasil (nov.2021 a dez.2022)</td>
<td style="width: 154.859px;">O valor permanente, equivalente ao atual benefício do Bolsa Família, terá reajuste de 20%. O valor da transação irá variar para garantir que pelo menos R$ 400 sejam pagos aos beneficiários até o final de 2022.Um adicional de R$ 200 começará a ser pago na folha de agosto até dezembro</td>
<td style="width: 75.9688px;"></td>
<td style="width: 143.57px;">17,5 a 18,1 milhões de brasileiros</td>
<td style="width: 101.336px;">R$ 106 bilhões</td>
</tr>
</tbody>
</table>
<blockquote class="jota-article__citation">
Fontes: Ministério da Cidadania e <a href="https://g1.globo.com/economia/auxilio-emergencial/noticia/2021/03/23/auxilio-emergencial-2021-veja-perguntas-e-respostas.ghtml">g1</a> (2021)
&nbsp;</blockquote>
O desempenho econômico e as promessas do candidato à reeleição são suficientes para aumentar as intenções de voto e, principalmente, reduzir os elevados índices de rejeição? Os dados de popularidade de Bolsonaro, produzidos pelo Agregador do JOTA, sugerem que é possível melhorar a competitividade do candidato ao longo da campanha presidencial. A porcentagem de brasileiros que avalia o presidente como positivo ou regular está crescendo desde o início de 2022. É uma tendência importante, mas deve ser insuficiente, pois os brasileiros devem comparecer às urnas em outubro sem aumento real de renda, sem investimentos em bem-estar social e com inflação em alta. E sobre isso, Bolsonaro não oferece uma estratégia para o período 2023-2026.

Economia, Moeda Real,Dinheiro, Calculadora

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JOTA

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Eleitores parecem entender que maus resultados da política econômica se devem à gestão Bolsonaro, com inflação alta e menor renda