Pedro Adamy

Recentemente, o CARF decidiu que a atividade de árbitro pode ser tributada pela pessoa jurídica. O tema já foi objeto de <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/coluna-do-carf/tributacao-em-procedimentos-arbitrais-01092020">análise detalhada nesta coluna</a> por Thales Stucky, cuja leitura se recomenda.
Na recente decisão, restou assentado que a atividade de árbitro, quando desenvolvida por advogado, pode ser tributada por meio da pessoa jurídica da qual a pessoa física seja sócio. Assim consta da ementa do julgado:
“ARBITRAGEM. FORMAÇÃO PROFISSIONAL. ATIVIDADE INSERIDA NO ÂMBITO DA ADVOCACIA. HONORÁRIOS. SOCIEDADE DE ADVOGADOS. LEI Nº 9.430/96. SERVIÇO INTELECTUAL EM CARÁTER PERSONALÍSSIMO. LEI Nº 11.196/2005. TRIBUTAÇÃO APLICÁVEL ÀS PESSOAS JURÍDICAS. 
<a href="https://www.jota.info/produtos/tributos?utm_source=Banner%20site&amp;utm_medium=Artigos&amp;utm_campaign=CTA_Tributos_materias"><img class="aligncenter wp-image-292716 size-full" src="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/cta-jota-pro-tributos.png" width="688" height="688" /></a>O exercício da arbitragem, embora não seja privativa de bacharel em Direito, encontra-se inserida no âmbito da advocacia, razão pela qual os honorários podem ser recebidos e tributados pela sociedade de advogados, da qual integre o árbitro - ex vi do art. 55 da Lei nº 9.430/66.
O art. 129 da Lei nº 11.196/2005, cuja constitucionalidade foi chancelada na ADC nº 66/DF, prevê que, na hipótese de contratação de um serviço intelectuaL, inclusive os de natureza científica, artística ou cultural, ainda que com designação de obrigações em caráter personalíssimo, passível a tributação aplicável às pessoas jurídicas.
A atuação de advogado como árbitro, por ser serviço de natureza intelectual que se insere na atividade advocatícia, atrai a aplicação do disposto no art. 129 da Lei nº 11.196/2005, podendo ser a remuneração pela prática recebida pela pessoa física ou pela sociedade da qual seja sócio.”
(<a href="https://www.jota.info/wp-content/uploads/2021/10/decisao-12448730776201491.pdf" target="_blank" rel="noopener noreferrer">Acórdão 2202-008.531</a>)
Deve-se notar que a legislação da arbitragem estabelece critérios relevantes para a atividade de árbitro. Em especial, o artigo 13 da Lei determina que “pode ser árbitro qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes.” Neste ponto, resta claro que se trata de uma atividade personalíssima, que deverá, necessariamente, ser prestada pela pessoa física que detenha a confiança das partes envolvidas no procedimento arbitral.
De pronto, fica claro que a atividade é personalíssima e que não é atividade privativa de advogados inscritos ou de bacharéis em direito. No entanto, ainda que não seja atividade privativa de advogado, certamente há o reconhecimento de que muitos árbitros são, efetivamente, advogados regularmente inscritos na Ordem dos Advogados. Nesse sentido, o Código de Ética e Disciplina da OAB (Resolução 02/2015) determina que o advogado deverá manter o sigilo nos casos em que atuar como árbitro. Assim consta da referida norma:
“Art. 36. O sigilo profissional é de ordem pública, independendo de solicitação de reserva que lhe seja feita pelo cliente.
(....)
<ul>
<li>2o O advogado, quando no exercício das funções de mediador, conciliador e árbitro, se submete às regras de sigilo profissional.”</li>
</ul>
Da mesma forma, a Resolução CNJ 75/2009 prevê que a atividade de árbitro deva ser considerada no cômputo do tempo para fins de concursos da magistratura, nos seguintes termos:
“Art. 59. Considera-se atividade jurídica, para os efeitos do art. 58, § 1º, alínea "i":
I - aquela exercida com exclusividade por bacharel em Direito;
(...)
V - o exercício da atividade de mediação ou de arbitragem na composição de litígios.”
A introdução acima se mostra necessária diante do argumento central da autoridade fiscalizadora, que fundamenta a sua posição em dois entendimentos principais: de um lado, os serviços de árbitro seriam prestados por pessoa física, de forma personalíssima, sem a exigência de ser inscrita na Ordem dos Advogados ou mesmo ser bacharel em direito. Como consequência, seria ilegítima a tributação na pessoa jurídica da sociedade de advocacia da qual o árbitro faz parte. De outro lado, que a atividade do árbitro não pode ser prestada por pessoa jurídica, tornando inaplicável as disposições do artigo 129 da Lei 11.196/2005.
Nenhum dos entendimentos defendidos pela autoridade fiscal deve prosperar em face da legislação tributária brasileiro. Com efeito, o artigo 129 da Lei n.° 11.196/2005 é expresso ao permitir a prestação de serviços personalíssimos por meiod e pessoas jurídicas. Para isso basta que se verifique o texto legal:
“Art. 129. Para fins fiscais e previdenciários, a prestação de serviços intelectuais, inclusive os de natureza científica, artística ou cultural, em caráter personalíssimo ou não, com ou sem a designação de quaisquer obrigações a sócios ou empregados da sociedade prestadora de serviços, quando por esta realizada, se sujeita tão-somente à legislação aplicável às pessoas jurídicas, sem prejuízo da observância do disposto no art. 50 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil.”
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADC 66, declarou a constitucionalidade do dispositivo acima transcrito. Logo, não há mais quaisquer dúvidas sobre o tratamento tributário a ser dado às atividades intelectuais personalíssimas desempenhadas por meio de pessoas jurídicas. Em seu voto, assim se manifestou a Ministra Cármen Lúcia:
“A norma do art. 129 da Lei n. 11.196/2005 harmoniza-se com as diretrizes constitucionais, especialmente com o inc. IV do art. 1o da Constituição da República, pelo qual estabeleceu a liberdade de iniciativa situando-a como fundamento da República Federativa do Brasil. Dessa liberdade econômica emanam a garantia de livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão e o livre exercício de qualquer atividade econômica, consagrados respectivamente no inc. XIII do art. 5o e no parágrafo único do art. 170 da Constituição da República.
(...)
Sob essa mesma perspectiva de densificação da liberdade de organização da atividade econômica empresarial, dotando-a da flexibilidade e da adequação atualmente exigidas, e da necessária compatibilização com os valores sociais do trabalho, há de se concluir que a norma objeto desta ação não apresenta vício de inconstitucionalidade. Compatibiliza-se a norma com a normatividade constitucional que abriga a liberdade de iniciativa como fundamento da República.”
A Conselheira Ludmila Mara Monteiro de Oliveira, redatora designada bem sintetizou a questão nos seguintes termos:
“Fica evidenciado, portanto, que o exercício da atividade advocatícia pode se descortinar em uma série de funções, que vão desde a defesa dos interesses de seus clientes em juízo, passando pela emissão de pareceres jurídicos, pela atuação como terceiro nas soluções alternativas de controvérsias (árbitro, mediador, conciliador), dentre outras.
(...)
Por essas razões, renovadas as vênias, não comungo do entendimento de que, por não ser a função de árbitro exclusivamente desenvolvida por advogados, haveria de ser prestada e tributada no âmbito da pessoa física que a efetua.”
Em sua declaração de voto, o Conselheiro Ronnie Soares Anderson bem sintetiza o paradoxo que a interpretação contrária a aplicação do artigo 129 às atividades do árbitro causa. Assim consta do voto:
“Ora, a prosperar tal linha argumentativa, simplesmente não haveriam casos de prestação de serviços de caráter personalíssimo capazes de serem abarcados nessa hipótese normativa, o que contraria frontalmente a lei posta, que expressamente inclui tais tipos de atividade no campo de abrangência dos benefícios do art. 129 da Lei 11.196/05. 
Há que se lembrar que a exegese das normas deve ser efetuada de maneira que imprima eficácia a seus termos tais como redigidos pelo legislador, e não em sentido oposto.” 
Os argumentos constantes do voto vencedor e da declaração de voto acima transcritos demonstram que a posição que prevaleceu neste caso no CARF é aquela que é mais adequada e consentânea com a legislação tributária brasileira.
Espera-se que a Câmara Superior, caso venha a analisar a questão, mantenha a posição da decisão aqui analisada, tendo em vista o seu acerto e sua adequação à legislação tributária.
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Carf

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JOTA

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Tributação de honorários de árbitros pela pessoa jurídica

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