Liberdade de expressão

TJSP: Cidadãos não devem indenizar prefeitura por críticas em redes sociais

Para relator, comentários não são agradáveis, mas estão muito longe de configurarem ofensas ao ente público

Igreja Matriz de Santana de Parnaíba / Crédito: Wikimedia Commons

A 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) manteve a decisão da juíza Natália Assis Mascarenhas, da 1ª Vara do Foro de Santana de Parnaíba, e negou o pedido de indenização por danos morais feito pela Prefeitura de Santana de Parnaíba contra cidadãos que fizeram críticas em redes sociais.

A prefeitura pediu à Justiça indenização de R$ 100 mil mais a exclusão três postagens, que exibiam imagens de um burro como engenheiro afirmando que a reforma da igreja matriz da cidade custou “bilhões” e que guardas civis municipais são “trapalhões” e “não acertam uma”.

A prefeitura alega que a repercussão negativa à imagem do ente público e “a exteriorização de um menosprezo à função administrativa” afetam o prestígio, a credibilidade, a boa imagem externa, a estima pública e a respeitabilidade dos servidores públicos e do município de Santana de Parnaíba.

Na primeira instância, a juíza entendeu que as publicações não denotam ofensa à honra dos funcionários da municipalidade nem do próprio ente público, mas apenas oferecem crítica aos serviços por este prestados.

Na segunda instância, o relator, Rui Cascaldi, seguiu o entendimento e afirmou que “realmente, não são comentários agradáveis, mas estão muito longe de configurarem ofensas ao ente público”.

Pessoa jurídica pode sofrer dano moral?

Na decisão, a juíza Natália Assis Mascarenhas citou que, apesar da Súmula 227 do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) reconhecer que pessoa jurídica pode sofrer dano moral, a norma não se estenderia a pessoas jurídicas de direito público, como a prefeitura. Dessa forma, mesmo que as postagens tenham causado dano à respeitabilidade do município, não caberia indenização por danos morais.

No entanto, no julgamento do recurso, o desembargador Rui Cascaldi entendeu que a possibilidade de indenização por danos morais também se estende em favor das pessoas jurídicas de direito público. 

Caso contrário, o relator afirma que haveria uma discriminação entre pessoas jurídicas, na qual pessoas jurídicas públicas não poderiam se defender quando moralmente atingidas. Além disso, ele explica que a Súmula 227 do STJ não faz nenhuma distinção entre as pessoas jurídicas pública e a privada. 

Por fim, esclarece que recentemente o Supremo Tribunal Federal (STF) também mandou instaurar inquérito para apurar a autoria de ofensas publicadas em redes sociais contra a honra de ministros da Corte, seus familiares e da própria instituição, o inquérito das Fake News.

“Mas, em que pese a possibilidade de a autora ser passível de sofrer danos morais, no caso, tal não ocorre, porque as publicações contra as quais se insurge não vão além de meras críticas feitas no exercício da liberdade de expressão do pensamento”, pontua.

O caso tramita sob o número 1001148-33.2019.8.26.0529.

Outra ação movida pela prefeitura

Em outra ação, o município fazia os mesmos pedidos de indenização no valor de R$ 100 mil e de remoção de conteúdo. Mas, dessa vez, a prefeitura havia se indignado com uma postagem que dizia: “Como ganhar 13 milhões de reais? É só abrir uma empresa que vende prego, arruelas e parafusos e fazer uma licitação com a Prefeitura de Santana de Parnaíba”.

A juíza Natália Assis Mascarenhas, que também julgou o caso, entendeu que a publicação fazia alusões a possível corrupção em um contrato municipal e concluiu que o município juntou provas suficientes para afastar as alegações. 

Nesse caso, houve, segundo ela, realmente um excesso do uso de direito de expressão do cidadão. Por isso, Mascarenhas julgou parcialmente procedente a ação e determinou que o cidadão removesse qualquer publicação sobre o tema, bem como se abstivesse de efetuar comentários a respeito da compra realizada pelo município.

A Prefeitura de Santana de Parnaíba recorreu da decisão, mas a 4ª Câmara de Direito Público do TJSP seguiu o entendimento da primeira instância de que pessoas jurídicas de direito público não podem sofrer danos morais.

“O reconhecimento da possibilidade teórica de o município pleitear indenização por dano moral contra o particular constitui completa subversão da essência dos direitos fundamentais; intelecção contrária emanaria riscos de se franquear ao estado a via indenizatória, com real ameaça a centros nervosos do Estado Democrático de Direito, representando temeridade contra outros elementos essenciais à democracia”, afirmou o relator Osvaldo Magalhães ao negar o recurso.

O caso tramita sob o número 1008845-08.2019.8.26.0529.