Cidade Alerta

Record e Luiz Bacci deverão pagar R$ 50 mil por acusar homem de matar enteada

Homem foi chamado de ‘monstro’ e ‘padrasto cruel’ no Cidade Alerta. Laudo concluiu que morte foi por infecção pulmonar

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Luiz Bacci, apresentador do Cidade Alerta da TV Record / Crédito: Divulgação TV Record

A TV Record e o apresentador Luiz Bacci, do programa Cidade Alerta, deverão pagar R$ 50 mil em indenização por danos morais a um homem que foi apontado como culpado por violentar sexualmente e causar a morte da enteada de dois anos, além de qualificá-lo como “monstro”, e “padrasto cruel”. 

O programa exibiu a matéria com a chamada: “Criança é violentada e morta pelo padrasto”, mas, posteriormente, o laudo necroscópico concluiu que a morte da criança foi causada por uma infecção pulmonar grave.

O homem chegou a ser denunciado criminalmente pelo Ministério Público, mas a denúncia foi rejeitada. Os hematomas encontrados na criança, afirma a desembargadora Marcia Dalla Déa Barone, decorreram, provavelmente, do momento em que a menina teve uma convulsão ou da queda da cama.

Por unanimidade, a 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a decisão da juíza Melissa Bertolucci, da 27ª Vara Cível de São Paulo, a qual entendeu que reportagem excedeu o dever de informar, ofendendo a honra e a imagem do homem.

O caso ocorreu em 2018, quando a menina faleceu após ser internada em decorrência de convulsões ocorridas sob o cuidado do seu padrasto, enquanto a mãe se encontrava no trabalho. 

Diante de algumas marcas no corpo da criança, a equipe médica suspeitou que a menor havia sido vítima de maus tratos e acionou a polícia, o que levou o Ministério Público a denunciar o homem por homicídio culposo.

A reportagem foi exibida no “Cidade Alerta” apenas um dia após o falecimento da menina. O programa veiculou fotografias do homem, da mãe da criança e da própria menor. Depois, ficou comprovado que o homem não causou a morte da menina, que foi vitimada por uma infecção pulmonar de natureza grave.

Em primeira instância, a rede Record foi condenada a retirar do ar a reportagem televisiva presente em seus portais de comunicação. Em defesa, a emissora afirmou que “determinar a exclusão da URL é aplicar a censura, visto que impediria a imprensa e consequentemente à sociedade de haver liberdade de expressão e direito à informação”.

Além disso, defende que foi veiculada somente a suspeita do cometimento de crime, com informações obtidas junto à Polícia Civil, e alega que a reportagem “é de conteúdo de interesse público, totalmente desprovida de caráter pejorativo ou acusatório”. 

Julgamento em segunda instância

A relatora, desembargadora Marcia Dalla Déa Barone, entendeu que “houve abuso do direito de informar e exposição exagerada da imagem do homem em rede nacional como autor de delito infamante”. O fato impossibilita o homem, inclusive, de se recolocar no mercado de trabalho. Por isso, a reportagem foi mantida fora do ar.

O caso, segundo Barone, “demonstra, à mais clara evidência, que a notícia não teve o intuito de relatar uma investigação, mas sim intuito sensacionalista, tirando o autor da posição de suspeito de crime para promovê-lo a acusado”.

Para a desembargadora, em nenhum momento, foi comprovado nos autos de qual lugar a emissora e o apresentador tiraram as conclusões estampadas na chamada da matéria com as frases “Criança é violentada e morta pelo padrasto” e “Garotinha vítima do padrasto cruel”.

Na decisão, a relatora destaca fala de Luiz Bacci durante a reportagem:

“Existe lei para punir um monstro como esse nesse país? Me digam, com toda sinceridade, com toda clareza. Existe alguma lei que vai fazer justiça pela morte desta menina?”. 

Assim, Barone entende que “a reportagem não teve o objetivo de informar, mas conduziu o público a formar uma imagem pejorativa” sobre o homem. 

A magistrada afirma que o direito à liberdade de informação está condicionado ao exercício da inviolabilidade da intimidade da vida privada, da honra e da imagem, de modo que “o direito de informar ou manifestar uma opinião, não pode importar abalo e ofensa à dignidade e imagem das pessoas”.

Por fim, conclui que “é certo que a matéria ampliou o constrangimento do homem, aumentando o número de pessoas conhecidas e desconhecidas que tomaram ciência dos fatos, trazendo mais dificuldades para o seu convívio social”. 

O caso tramita com o número 1047110-08.2019.8.26.0100.

 


Episódio desta semana do ‘Sem Precedentes‘, podcast sobre STF e Constituição, analisa as quase 12 horas de sabatina de Kassio Nunes. Ouça: