Matheus Teixeira
Foi repórter do JOTA
JOTA Discute
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Nada de piadas ou trajes engraçados para divertir o público. De terno e gravata, Fabio Porchat, Bruno Mazzeo e Marcius Melhem, três dos principais humoristas do país atualmente, estiveram nesta quinta-feira (7/6) no Supremo Tribunal Federal para tratar dos princípios constitucionais da liberdade de expressão e do direito à informação.
Os artistas foram recebidos pelo ministro Alexandre de Moraes, relator da ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 4451. Trata-se de uma ADI apresentada pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão contra dispositivos da lei eleitoral que proíbem o uso de “trucagem, montagem ou outro recurso de áudio ou vídeo que, de alguma forma, degradem ou ridicularizem candidato, partido e coligação” em período eleitoral.
Os artigos em questão estão suspensos devido a julgamento da cautelar da ação em 2010. Agora, está marcado para a próxima semana a apreciação do mérito da ADI. E, caso o julgamento reverta a decisão tomada na análise da liminar, haverá uma forte censura ao humor, alegam os três.
“Censura prévia, tutela exagerada do Estado. O ‘não pode’ é sempre perigoso’, o ‘não pode’ antes, a censura prévia, é pior ainda. A Constituição já protege muito o processo político. Proteção [os políticos] têm bastante, mas não podem impedir que a liberdade de expressão e de informação prevaleça. E através do humor as pessoas se politizam também”, argumentou Porchat.
Na ação, a Abert alegou que a norma gera um “grave efeito silenciador às emissoras”, que ficariam obrigadas a evitar divulgação de temas políticos polêmicos e a veiculação de sátiras relativas a personagens políticos em período eleitoral. A entidade entrou com a ADI no STF em 2010 e, dois dias, o então ministro Ayres Britto deu uma liminar para suspender a eficácia dos artigos. Depois, o plenário referendou a decisão monocrática.
Os humoristas afirmaram que, na audiência, Moraes “demonstrou bastante sensibilidade com os argumentos” apresentados e conhecimento sobre o tema. “Expectativa que temos é boa, porque o assunto é a liberdade de expressão e derrubar isso seria uma aberração”, disse Melhem.
Já Mazzeo ressaltou que o humor é saudável para a democracia. “Função importante de jogar luz. Sabemos que não temos poder para mudar nada, mas temos o dever de denunciar, chamar a atenção, botar uma lente de aumento. E o humor tem uma comunicação muito direta com o público”, disse.
Melhem destacou ainda que este será um processo eleitoral “acirrado e com muitos candidatos” e que todos eles, sem exceção, serão alvo de brincadeiras. “Humor é chumbo livre, chumbo grosso para todo mundo. Vamos brincar com todos, mas o motivo são eles que dão”, ironizou.
Para Melhem, os parlamentares que aprovaram a norma queriam, na verdade, ter um “controle do processo eleitoral e que as informações não circulem como deveria”. “O humor é uma arma poderosa e eles sabem disso. Era abafar um pouco a nossa voz”, diz.
Mazzeo destacou, ainda, que a norma não para só para o humor. “É para tudo. Estamos aqui defendendo a nossa praia, mas a lei não é só para humor”.
No julgamento da cautelar, Britto disse que quando recebeu a peça inicial, a primeira pergunta que se fez foi se humor pode ser considerado imprensa. Se a resposta fosse afirmativa - como foi - no entendimento do ministro, teria que se aplicar aos casos as mesmas coordenadas da decisão da Corte na arguição de descumprimento de preceito fundamental 130, que é tido como um dos principais precedentes sobre liberdade de imprensa do STF, pois revogou a Lei da Imprensa de 1967, da época do regime militar.
Britto argumentou, ainda, que a lei eleitoral censura o humor. "Tanto programas de humor, como o humor em qualquer programa, ainda que não seja programa específico de humor, mesmo em noticiários", disse naquela oportunidade.
Para ele, a eleição é o período em que a liberdade de imprensa deve ser maior. "É o momento em que o cidadão mais precisa de informação, e informação com qualidade ", disse naquela oportunidade.
O ministro Celso de Mello seguiu na mesma linha: “A norma questionada traz, em uma análise superficial, ofensa a um postulado essencial, que é o princípio da liberdade de manifestação”, disse. Com a saída de Britto, Teori Zavascki assumiu a relatoria do caso. Após a morte de Teori, Moraes tornou-se o relator.
Em discussão, os incisos II e III da Lei 9.504/1997, incluídos no ordenamento jurídico pela Lei 12.034/2009, uma minirreforma eleitoral aprovada naquele ano, que diz:
II - usar trucagem, montagem ou outro recurso de áudio ou vídeo que, de qualquer forma, degradem ou ridicularizem candidato, partido ou coligação, ou produzir ou veicular programa com esse efeito;
III - veicular propaganda política ou difundir opinião favorável ou contrária a candidato, partido, coligação, a seus órgãos ou representantes.