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A cidade inteligente do futuro começa com sábias decisões no presente

As cidades inteligentes, mais do que nunca, devem estar no centro do debate das eleições municipais

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Crédito: Unsplash
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Em novembro de 2020, os brasileiros tiveram um novo compromisso com a democracia. As eleições municipais deste ano, contudo, tornaram-se muito mais importantes devido à pandemia de Covid-19. Velhos – e novos – problemas que enfrentamos no dia-a-dia estão mais evidentes e devem integrar a pauta das lideranças locais que iremos eleger para os próximos quatro anos. 

Ainda que a resposta ao coronavírus passe por um esforço conjunto entre as esferas federal, estadual e municipal, são as cidades que sentem os efeitos devastadores da pandemia, seja na educação, mobilidade urbana, saúde, além de toda a incerteza econômica. Nos próximos anos, a gestão pública deverá ser hábil para prover serviços que sejam eficientes e efetivos; ou seja, terá diante de si o desafio de fazer muito mais com os recursos existentes – e, possivelmente, até com menos recursos. 

Com o avanço da pandemia, as melhores soluções para isso foram aquelas que combinaram tecnologia, a otimização dos recursos existentes e as demandas dos cidadãos. Isto é, cidades que desenvolveram ou adotaram diferentes ferramentas para atender com mais qualidade seus habitantes, trazendo agilidade, segurança e transparência para as políticas públicas. 

As cidades inteligentes – também conhecidas como smart cities –, mais do que nunca, devem estar no centro do debate das eleições municipais. 

Esse conceito ganhou corpo nas últimas duas décadas e, evidentemente, possui diferentes correntes teóricas. Chegar a um consenso depende de quais análises e elementos são levados em conta. Contudo, de forma geral, uma cidade inteligente pode ser definida como aquela que utiliza a tecnologia para otimizar os recursos existentes, provendo serviços de qualidade para todos os habitantes. 

Entretanto, não se trata apenas de apostar nas soluções tecnológicas. Para a União Europeia, uma das pioneiras na discussão sobre cidades inteligentes, mais do que a ferramenta em si, o que deve ser levado em conta é um sistema em que as pessoas interajam e usem de forma consciente todos os recursos disponíveis no meio urbano: dados, a energia, os materiais, serviços e financiamento em prol do desenvolvimento econômico e social.

Por esse motivo, as cidades inteligentes estão diretamente relacionadas ao conceito de sustentabilidade: elas materializam a urgência que todos deveríamos ter em assegurar o bem-estar dos cidadãos, ao mesmo tempo em que não comprometemos as possibilidades de existência das gerações futuras. 

Portanto, desconfie de candidatos que simplesmente prometem encher o município de aparatos tecnológicos, como se isso fosse suficiente para garantir mais eficiência. O segredo das cidades inteligentes passa pelo planejamento, estratégia e, principalmente, pela compreensão das necessidades mais urgentes da população – seja a do presente , mas também a que ainda nem nasceu. 

Espaço de fluxos informacionais e de pessoas  

Dessa forma, devemos compreender as cidades inteligentes como espaços de fluxos. Seja entre os cidadãos, facilitando o acesso a serviços essenciais, seja de dados, permitindo que as informações digitais possam trafegar entre os diferentes sistemas e áreas e, assim, garantir processos mais rápidos e eficientes, revertendo em qualidade de vida e bem-estar. 

Levantamento da Cisco, empresa referência em TI e redes, reforça este cenário. A América Latina em 2021 vai ter 2,9 bilhões de dispositivos conectados – um crescimento de 45% em apenas cinco anos. Além disso, 73% do tráfego IP na região vai ser originado de dispositivos que não sejam computadores pessoais, smartphones, tablets, TVs, entre outros. Ou seja, quase três quartos serão provenientes de máquinas que não operamos diretamente. 

Diante desse cenário, o geógrafo brasileiro Milton Santos, um dos principais pensadores sobre o espaço urbano, propõe uma mudança do meio natural para o meio “técnico-científico-informacional”. Essa transformação é promovida justamente pela entrada de empresas provedoras de soluções tecnológicas no cotidiano das cidades. “É a aparência geográfica da globalização”, como ele mesmo cita. 

Evidentemente, essa mudança traz consigo visões antagônicas. O pensador bielorrusso Evgeny Morozov, por exemplo, critica a total dependência que o poder público tem das plataformas responsáveis pela coleta e tratamento dos dados urbanos. O filósofo Pierre Levy, em contrapartida, defende que o uso adequado das soluções de TI permitem o desenvolvimento de um coletivo inteligente e dão vida à “democracia em tempo real”. 

Aqui, podemos seguir com a velha (e valiosa) lição da mitologia grega: “nem tanto ao céu, nem tanto ao mar”. Ou seja, entre a visão apocalíptica de um e a otimista do outro, devemos seguir no centro, buscando alternativas e corrigindo problemas para, sempre, retirar todo o potencial positivo que as tecnologias podem nos trazer. 

Exemplos de sucesso lá fora que podem inspirar nossas escolhas

O Brasil, contudo, avança lentamente no assunto. Cidades como São Paulo, Curitiba, Rio de Janeiro e Campinas já são referência no tema das Smart Cities, mas ainda estão longe dos principais centros. Levantamento Cities in Motion Index 2019, da IESE Business School, com 174 municípios de todo o mundo mostra que o melhor representante nacional é Rio de Janeiro, na modesta 128ª posição. 

Londres, do Reino Unido, está na outra ponta, sendo referência mundial na área. A capital britânica enfrenta graves problemas característicos das metrópoles, mas destaca-se pela busca de soluções criativas. Entre elas estão os postes que fornecem não apenas iluminação, mas sinal de Wi-Fi, sensores que detectam qualidade do ar, estímulo aos veículos elétricos e um sistema de transporte altamente integrado e conectado. 

Copenhague, na Dinamarca, demonstra preocupação com a mobilidade e sustentabilidade. A cidade é exemplo na implementação de ciclovias como forma de incentivo para utilização de bicicletas como meio de transporte. Estacionamentos próprios, locais de aluguel e devolução e integração com o transporte público, como metrôs e ônibus, garantem que 55% da população local utilize a bicicleta para trabalhar e se deslocar. 

Não precisamos ir muito longe para encontrar bons exemplos. Santiago é o melhor representante sul-americano no ranking citado, ocupando a 66ª posição, e destacando-se pelo planejamento urbano e preocupação ambiental. O projeto de cidade inteligente na capital chilena foi uma resposta à urbanização não planejada da metrópole e, assim, busca solucionar graves questões sociais, como transporte público, coleta de lixo e constituição do espaço público. 

Embora tenhamos um longo caminho para construir cidades inteligentes no Brasil, podemos ser, desde já, referência em soluções GovTech para as metrópoles – é o que mostram os resultados do 4º Ciclo de Aceleração do BrazilLAB. Na vertical “Smart Cities e Urban Techs” foram selecionadas startups e suas soluções para a gestão das cidades, como a Bright Cities, plataforma que realiza o diagnóstico e o planejamento para mais de 10 áreas da gestão pública, com 160 indicadores e que, com base nos resultados, oferece um banco de mais de mil soluções tecnológicas e boas práticas no tema de Cidades Inteligentes. 

Temos boas respostas e que estão à procura de problemas. Precisamos avançar em promover esse encontro. 

A cidade inteligente começa na eleição municipal 

Estamos diante da oportunidade ímpar de definir que tipo de cidade desejamos para o futuro. O esforço é monumental, mas pode ser implementado a partir de iniciativas de curto, médio e longo prazo dedicadas a garantir mais eficiência nos serviços públicos e melhorar a qualidade de vida da população.

Dentre as mais imediatas, sem dúvida, estão a adoção da tecnologia como a principal aliada e também a escolha das lideranças políticas. Assim, no segundo turno, quando se dirigir à urna eletrônica, tenha certeza que o seu voto ditará o futuro das cidades no Brasil.

 


O episódio 43 do podcast Sem Precedentes analisa a nova rotina do STF, que hoje tem julgado apenas 1% dos processos de forma presencial. Ouça: