Estúdio JOTA

Em 2024, o Brasil lidera o G20. Os detalhes dessa liderança estão nesta cobertura especial

G20 no Brasil

O texto a seguir faz parte da <a href="https://www.jota.info/coberturas-especiais/g20-brasil">cobertura especial do G20 no JOTA</a>, apoiada pelo Itaú Unibanco. Ele é o segundo de uma série que abordará as prioridades no debate sobre soluções para a crise do clima, passando por: bioeconomia, agricultura de baixo carbono e logística sustentável.
A bioeconomia é uma das principais apostas do governo brasileiro durante sua atuação na presidência do G20. Colocado em discussão no fórum pela primeira vez, por iniciativa do Brasil, o tema pode abrir as portas de um mercado promissor em países ricos em biodiversidade, a partir da criação de negócios e produtos baseados na natureza. 
O meio ambiente fornece serviços ecossistêmicos essenciais para a sociedade e dos quais dependem boa parte dos recursos para as atividades econômicas. Estimativas recentes do Fórum Econômico Mundial mostram que mais da metade do PIB mundial, aproximadamente US$ 44 trilhões, possui alta ou moderada dependência da natureza. 
Por outro lado, principalmente após o início da industrialização, as atividades econômicas estão associadas à degradação dos serviços ecossistêmicos e a reflexos negativos na biodiversidade. Para se ter ideia, 1 milhão de espécies (de um total estimado em 8 milhões) estão em vias de extinção, segundo relatório da ONU de 2019. 
+ Leia também: <a href="https://www.jota.info/coberturas-especiais/g20-brasil/brasil-trilha-caminhos-no-desenvolvimento-sustentavel-com-g20-22082024">Brasil trilha caminhos no desenvolvimento sustentável com G20</a>
<h3>A biodiversidade no G20</h3>
Para gerar menor impacto no meio ambiente e, ainda assim, projetar o desenvolvimento econômico, a iniciativa de bioeconomia no G20 reúne participantes das duas trilhas que compõem o fórum, a de Sherpas e a de Finanças. Os debates estão organizados em três eixos principais: ciência, tecnologia e inovação; uso sustentável da biodiversidade; e o papel da bioeconomia na promoção do desenvolvimento sustentável.
Logo de início uma questão é que ainda não há um consenso global sobre o conceito de bioeconomia – mas boa parte dos países aplica o termo como sinônimo da promoção do uso sustentável da dos recursos da biodiversidade, viabilizando cadeias de valor. 
Ao lado dos produtos – como extratos de plantas nativas que dão origem a cosméticos, por exemplo –, a bioeconomia também prevê agregar à indústria os conhecimentos ancestrais e tecnologias de povos originários e comunidades que vivem na floresta. Essa é uma perspectiva mais ampla sobre o potencial da bioeconomia. 
“Globalmente, os produtos da floresta têm um valor pequeno no mercado. Um grande desafio é começar a destravar esse mercado”, pontua o climatologista Carlos Nobre, referência mundial em estudos sobre o clima e membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC). Assim, a ideia é que eles deixem de ser commodities e deem fomentem uma cadeia com produtos de maior valor agregado. 
“A nossa economia se tornou muito primária nos últimos 25 anos. Nós temos que industrializar o Brasil, e é importante que essa economia da biodiversidade seja industrializada para agregar valor aos produtos”, afirma Nobre.  
O crescimento econômico por meio do capital natural se apresenta como uma janela de oportunidade para países ricos em biodiversidade, como o Brasil. Além do açaí, cacau e castanha-do-pará, já famosos internacionalmente, as possibilidades de produtos da bioeconomia são praticamente infinitas. 
“Temos uma infinidade de espécies de peixes que têm um valor comercial extremamente grande. Desde os peixes mais pequenininhos, que são utilizados como peixes ornamentais em vários lugares do mundo e representam uma parcela importante da receita de várias cidades amazônicas, até peixes gigantes, como é o caso do pirarucu”, destaca Adalberto Luís Val, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e vice-presidente da ABC para a região Norte.
<blockquote class="jota-article__quote">"Nós temos que industrializar o Brasil, e é importante que essa economia da biodiversidade seja industrializada para agregar valor aos produtos"
<footer class="jota-article__quote-cite">Carlos Nobre, referência mundial em estudos sobre o clima e membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC)</footer>
</blockquote>
Para explorar essa capacidade, o principal gargalo está em custear as tecnologias para a viabilização dos produtos, além de investir em ciência e educação. Essas áreas demandam, principalmente, recursos públicos, mas também são necessários investimentos privados para a industrialização e aumento da escala da bioeconomia.
Para Luciana Nicola, diretora de Relações Institucionais e Sustentabilidade do Itaú Unibanco, ao valorizar seu capital natural, o Brasil tem competências para atrair esses investimentos. Isso seria possível conciliando o desenvolvimento sustentável com a inclusão de comunidades tradicionais, integrando ainda preservação e manejo sustentável com o crescimento econômico – elementos que permitiriam competitividade no mercado internacional. 
“O potencial do Brasil está em mobilizar recursos em projetos e técnicas de produção sustentáveis, potencializando a biodiversidade e valorizando o capital regional, o que o difere de outros países em que a força econômica está diretamente conectada a bases tecnológicas e de alto custo”, avalia Nicola. 
Extrair esse capital, aliás, é um ponto que depende de investimentos em ciência e educação. Isso porque a variedade de produtos da biodiversidade é subaproveitada por falta de conhecimento sobre eles. A partir dos investimentos nessas áreas, o país poderia ganhar escala e a dianteira do mercado de sociobiodiversidade a nível global. 
“Se olharmos para os indígenas no Brasil, eles já usaram mais de 4 mil produtos dos biomas. Mas se observamos os produtos que já atingiram os mercados nacional e global, esse número não passa de 30”, lembra Nobre.
“Não há conflito entre os saberes dos povos originários e o conhecimento contemporâneo. Eles se somam em todos os processos, principalmente de conservação ambiental”, completa Val, do Inpa. 
<blockquote class="jota-article__quote">“O potencial do Brasil está em mobilizar recursos em projetos e técnicas de produção sustentáveis, potencializando a biodiversidade e valorizando o capital regional"
<footer class="jota-article__quote-cite">Luciana Nicola, diretora de Relações Institucionais e Sustentabilidade do Itaú Unibanco</footer>
</blockquote>
<h3>Bioeconomia para a descarbonização</h3>
Na estruturação da bioeconomia brasileira e global, além dos elementos da floresta, há um outro velho conhecido na agenda nacional: os biocombustíveis. Desde o século passado, eles já têm forte atuação na agenda de descarbonização e transição energética do país, e agora podem ser baseadas em soluções do uso de recursos biológicos mais avançados e ainda menos poluentes. E mais do que isso: podem ser ferramentas para fortalecer a economia da biodiversidade brasileira como um todo. 
Os biocombustíveis são figura central para reduzir as emissões de carbono no país. “A matriz elétrica brasileira já é considerada relativamente limpa, com a geração hidrelétrica sendo a maior responsável”, pontua Nicola. “Porém, quando pensamos na matriz energética de lavouras, notamos que os combustíveis fósseis ainda são muito presentes, devido à necessidade logística do setor que demanda o investimento em veículos para transporte das mercadorias”.  
Inclusive, o transporte é um dos gargalos da própria bioeconomia para escoamento de produtos amazônicos. Muitas comunidades só podem ser acessadas de barco ou aviões de pequeno porte, e seria necessário ampliar a quantidade de veículos e utilizar combustíveis menos intensivos em carbono para se manter coerente com o conceito de desenvolvimento sustentável. 
Nobre alerta, no entanto, que é preciso atenção para que os biocombustíveis não se tornem vetores do desmatamento. “Não podemos voltar a desmatar a Amazônia para plantar insumos para os biocombustíveis”, comenta o professor. 
Por isso, dentro da perspectiva de bioeconomia, é preciso olhar atento para que uma abordagem voltada para a tecnologia e a natureza não gere efeitos colaterais que coloquem obstáculos à rota de descarbonização. 
Em relação aos biocombustíveis, uma alternativa, com tecnologia já em estágio avançado no Brasil, é a produção de bioetanol a partir de resíduos agrícolas, como o bagaço da cana-de-açúcar. Essa constante busca por novas soluções na natureza, cada vez com menor impacto ambiental, faz parte da lógica da bioeconomia.

02-g20-bioeconomia

https://images.jota.info/wp-content/uploads/2021/09/copy-of-jota-logo-high-cmyk.jpeg

JOTA

Brasil põe a economia da biodiversidade em pauta. País ainda engatinha no tema, mas tem grande potencial para produtos baseados na natureza

Iniciativa de bioeconomia no G20 abre espaço para expansão do segmento no Brasil

Este conteúdo integra uma cobertura especial do JOTA, que mantém independência editorial na produção das reportagens. O apoiador participa da escolha dos temas