Elisa Martins

Grasielle Castro

Textos trazem a cobertura das decisões e audiências da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH)

Direitos Humanos

Criada há 45 anos, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/corte-idh">Corte IDH</a>) alcançou uma repercussão protetiva muito além dos 400 casos que julgou, na avaliação do atual vice-presidente do Tribunal, o juiz brasileiro Rodrigo Mudrovitsch. "Isso porque o efeito de suas sentenças transcende a lide concreta", explica.
<h3><a href="https://www.jota.info/produtos/poder%20?utm_source=cta-site&amp;utm_medium=site&amp;utm_campaign=campanha_poder_q2&amp;utm_id=cta_texto_poder_q2_2023&amp;utm_term=cta_texto_poder&amp;utm_term=cta_texto_poder_meio_materias">Tenha acesso ao JOTA PRO Poder, uma plataforma de monitoramento político com informações de bastidores que oferece mais transparência e previsibilidade para empresas. Conheça!</a></h3>
Em entrevista ao JOTA, Mudrovitsch ressaltou que ao longo de sua história, a Corte IDH consolidou a posição de guardiã e intérprete do mais importante tratado de direitos humanos da região. Com isso, a Corte IDH se tornou um ator fundamental na proteção da dignidade humana e do extenso catálogo de direitos abrigado pelo Pacto de San José.
Para ele, um exemplo do forte impacto do Tribunal é o fato de ser cada vez mais comum os Estados voluntariamente reconhecerem sua responsabilidade parcial ou total nos casos em que são parte, ou então buscando soluções amistosas junto às vítimas.
O juiz também disse que a promoção dos valores essenciais da democracia, como a liberdade de expressão, a independência judicial e os direitos de participação política também tem sido uma constante nos precedentes da Corte, a partir do entendimento de que a garantia dos direitos humanos é tarefa que não pode ser levada adiante fora do contexto do Estado Democrático de Direito. E questões que estão na vanguarda do debate jurídico atual, como a proteção de dados e a autodeterminação informativa igualmente têm recebido especial atenção da Corte IDH.
Em relação ao Brasil, o juiz destacou que o país aderiu tardiamente ao Sistema Interamericano de Direitos Humanos por ter ratificado a Convenção Americana sobre Direitos Humanos apenas em 1992 e levado mais 6 anos para reconhecer a competência contenciosa da Corte, em 1998. Mas, afirmou que, nos últimos anos, importantes iniciativas têm sido adotadas para superar esse distanciamento histórico e para promover uma cultura de valorização dos direitos humanos.
"Em tempos recentes, o Brasil sediou duas vezes os Períodos Ordinários de Sessões da Corte IDH, em 2022 e, mais recentemente, em maio de 2024. A vinda do Tribunal não é ocasião corriqueira, abrindo um importante espaço de diálogo entre as autoridades brasileiras e a Corte, e contribuindo para que seu trabalho se torne cada vez mais conhecido no país", disse Mudrovitsch. "Naturalmente ainda há muito espaço para se avançar. É necessário que, cada vez mais, a Corte seja levada a sério no país, o que corresponde ao dever compartilhado por todos os órgãos do Poder Público de implementar integralmente suas decisões e reconhecer o devido valor normativo dos standards interamericanos de direitos humanos como um todo, e não apenas daqueles que envolvem o Estado brasileiro."
Outro ponto relevante que o juiz aborda na entrevista é a abrangência de tema dos casos analisados pela Corte, como reconhecimento do direito a um meio-ambiente sadio, proteção dos povos indígenas e comunidades tradicionais, além da promoção dos valores essenciais da democracia, como a liberdade de expressão, a independência judicial e os direitos de participação política.
<h3>Leia a entrevista com Rodrigo Mudrovitsch, juiz brasileiro da Corte IDH</h3>
O que esses 45 anos de existência demonstram sobre a importância da Corte para a região?
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Passados 45 anos desde sua instituição, a Corte IDH se firmou como verdadeiro patrimônio jurídico do continente americano e símbolo de uma árdua trajetória de luta pela proteção intransigente dos direitos humanos na região.
A ideia de uma Corte regional de direitos humanos foi produto de décadas de debate sobre a necessidade de criação de órgãos de supervisão para os mecanismos jurídicos de proteção dos direitos humanos que estavam sendo discutidos pelos Estados nas Conferências Interamericanas e que, futuramente, ganhariam a forma da Convenção Americana de Direitos Humanos, também conhecida como Pacto de San José.
A Corte foi instituída em 1979, após a entrada em vigor da Convenção, e proferiu suas primeiras manifestações em sede de opinião consultiva no início dos anos 1980. A partir de 1987, deu início ao julgamento de casos contenciosos, com o icônico Velázquez Rodríguez vs. Honduras. Desde então, já foram mais de 400 casos julgados sobre as mais variadas temáticas, envolvendo toda sorte de violações de direitos humanos.
O alcance do mandato protetivo da Corte IDH, contudo, vai muito além desses 400 casos. Isso porque o efeito de suas sentenças transcende a lide concreta. Nelas, são estabelecidos standards gerais de proteção dos direitos humanos que devem ser observados pelos legisladores, tribunais e formuladores de políticas públicas dos países do Sistema Interamericano de Direitos Humanos.
Assim, ao longo das quatro últimas décadas, a Corte IDH consolidou sua posição de guardiã e intérprete última do mais importante tratado de direitos humanos da região, firmando-se como ator fundamental de proteção da dignidade humana e do extenso catálogo de direitos abrigado pelo Pacto de San José.
Como avalia a consolidação da relação do Tribunal com os Estados da região e seu impacto ao longo desses anos?
Ao longo de sua história, a Corte IDH conseguiu construir uma sólida relação de diálogo com os Estados que reconhecem sua competência, que se traduz em uma cultura de respeito à autoridade do Tribunal e de compromisso com a implementação de suas decisões.
É cada vez mais comum, por exemplo, vermos Estados voluntariamente reconhecendo sua responsabilidade parcial ou total nos casos em que são parte, ou então buscando soluções amistosas junto às vítimas. É claro que subsistem desafios, sobretudo em garantir o devido cumprimento das sentenças da Corte, tarefa altamente complexa.
Fato é que a Corte, sobretudo através das medidas de reparação que outorga em suas sentenças, tem produzido um impacto verdadeiramente transformador na realidade dos países da região, promovendo mudanças institucionais essenciais para assimilar mecanismos de proteção e afirmação dos direitos humanos em seus respectivos sistemas jurídicos.
Como evoluiu a relação da Corte com o Brasil, especificamente, ao longo desses anos?
Felizmente, temos observado um salutar estreitamento de laços de nosso país com a Corte IDH, especialmente com o Poder Judiciário brasileiro. O Brasil aderiu tardiamente ao Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Ratificou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos apenas em 1992 e levou mais 6 anos para reconhecer a competência contenciosa da Corte, em 1998.
Nos últimos anos, importantes iniciativas têm sido adotadas para superar esse distanciamento histórico e para promover uma cultura de valorização dos direitos humanos. Não posso deixar de citar as medidas implementadas pelo Conselho Nacional de Justiça, como a Resolução nº 364 de 2021, que instituiu a Unidade de Monitoramento e Fiscalização (UMF) das decisões da Corte IDH envolvendo o Brasil e a Recomendação nº 123 de 2022, que exortou os órgãos do Poder Judiciário a considerar as decisões da Corte IDH em seus provimentos e a realizar o controle de convencionalidade do direito interno a partir dos tratados de direitos humanos.
Em tempos recentes, o Brasil sediou duas vezes os Períodos Ordinários de Sessões da Corte IDH, em 2022 e, mais recentemente, em maio de 2024. A vinda do Tribunal não é ocasião corriqueira, abrindo um importante espaço de diálogo entre as autoridades brasileiras e a Corte, e contribuindo para que seu trabalho se torne cada vez mais conhecido no país.
Naturalmente ainda há muito espaço para se avançar. É necessário que, cada vez mais, a Corte seja levada a sério no país, o que corresponde ao dever compartilhado por todos os órgãos do Poder Público de implementar integralmente suas decisões e reconhecer o devido valor normativo dos standards interamericanos de direitos humanos como um todo, e não apenas daqueles que envolvem o Estado brasileiro.
Quais principais avanços em atuação e jurisprudência destacaria nessas mais de quatro décadas da Corte IDH?
Através de sua jurisprudência, a Corte IDH conseguiu fazer valer a máxima de que a Convenção é um instrumento vivo e que deve ser interpretada à luz das demandas e desafios contemporâneos em matéria de direitos humanos.
Isso permitiu ao Tribunal expandir o alcance material do Pacto de San José e incorporar em seu catálogo direitos que, embora não estivessem expressamente previstos em seu texto, decorriam de princípios fundamentais que regem os direitos humanos, sobretudo do princípio pro personae.
Sob um ponto de vista mais amplo, uma das principais contribuições da Corte IDH reside na construção de sua doutrina sobre o controle de convencionalidade,  isto é, o dever dos Estado e de seus órgãos internos de adotar as medidas cabíveis para assegurar que suas leis, atos normativos e decisões de toda natureza estejam em conformidade com as obrigações emanadas do Sistema Interamericano, o que inclui não apenas o texto da Convenção, mas também o conjunto de precedentes da Corte IDH, sempre observando a primazia da norma mais protetiva à pessoa humana.
As obrigações no campo do controle de convencionalidade comunicam-se diretamente com outro importante aporte da Corte IDH à proteção dos direitos humanos, materializado na concepção ampla de reparação que o Tribunal adota em seus julgados. Dentre elas, destacam-se as chamadas garantias de não repetição, isto é, medidas de caráter legislativo e institucional que têm o propósito de assegurar que as violações em um caso concreto não se repitam.
Nos inúmeros eixos temáticos sobre os quais a jurisprudência da Corte IDH se projetou, ressalto alguns que evidenciam a sintonia do Tribunal com os grandes dilemas de nossas sociedades.
Em seus casos recentes, a preocupação com o meio-ambiente tem sido cada vez mais presente, materializada no reconhecimento do direito a um meio-ambiente sadio e no detalhamento dos deveres estatais a respeito da prevenção e precaução contra danos ambientais. Do mesmo modo, os julgados do Tribunal tornaram-se referência fundamental na proteção dos povos indígenas e comunidades tradicionais, a partir de seu entendimento sobre os direitos à propriedade coletiva, à consulta prévia e à identidade cultural.
A promoção dos valores essenciais da democracia, como a liberdade de expressão, a independência judicial e os direitos de participação política também tem sido uma constante nos precedentes da Corte, a partir do entendimento de que a garantia dos direitos humanos é tarefa que não pode ser levada adiante fora do contexto do Estado Democrático de Direito. Questões que estão na vanguarda do debate jurídico atual, como a proteção de dados e a autodeterminação informativa igualmente têm recebido especial atenção da Corte IDH.
Na sua visão, quais serão os principais desafios da Corte para os próximos anos?
É necessário consolidar a ideia de que, independentemente do momento político vivido pelos Estados, direitos humanos repercutem valores inegociáveis e que, portanto, devem ser recebidos com o máximo compromisso por parte das autoridades da região.
É igualmente importante que a Corte consiga sempre e cada vez mais se aproximar da realidade dos países do Sistema Interamericano e que possa ser reconhecida pelos povos do continente como um espaço legítimo de proteção de seus direitos.
Acima de tudo, é imprescindível garantir que a Corte IDH continue sendo levada a sério, o que se traduz não apenas no empenho dos Estados em cumprir as decisões dos casos em que são parte, mas também de incorporar os standards de direitos humanos oriundos da jurisprudência interamericana em suas políticas públicas, leis e decisões judiciais ou administrativas.
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JOTA

Ao JOTA, vice-presidente do Tribunal afirmou que é cada vez mais comum ver Estados reconhecerem sua responsabilidade perante a Corte

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