Carolina Ingizza

Textos trazem a cobertura das decisões e audiências da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH)

Direitos Humanos

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<p>A Corte Interamericana de Direitos Humanos (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/corte-idh">Corte IDH</a>) completa 45 anos na próxima terça-feira (3/9). Com mais de 500 sentenças proferidas, 600 medidas provisórias editadas e 30 opiniões consultivas publicadas, a instituição ajudou, ao longo das últimas quatro décadas, a transformar a região com sentenças a favor da <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/democracia">democracia</a> e dos <a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/direitos-humanos">direitos humanos</a>, estabelecendo precedentes importantes para o direito de grupos vulneráveis em toda a América Latina.</p>
<p>“A Corte IDH exerceu um relevante impacto transformador na região, sobretudo contribuindo para o fortalecimento dos direitos humanos, da democracia e do estado democrático de direito na região mais desigual e mais violenta do mundo”, avalia Flávia Piovesan, professora da PUC de São Paulo, coordenadora científica da Unidade de Monitoramento e Fiscalização das decisões do Sistema Interamericano de Direitos Humanos do Conselho Nacional de Justiça (UMF/CNJ) e ex-vice-presidente da comissão interamericana.</p>
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<p>Criada pela Convenção Americana, a Corte IDH foi instalada no final dos anos 1970, em um período em que muitos países da região viviam sob regimes ditatoriais. Diante desse contexto pouco favorável à proteção dos direitos humanos, a advogada Melina Fachin, coordenadora do núcleo de estudos em sistemas de direitos humanos da Universidade Federal do Paraná (UFPR), acredita que a instituição conseguiu exceder as expectativas. “Os julgamentos sobre justiça de transição, de revisão das leis de anistia, de prestar contas desse passado autoritário são um exemplo disso”, afirma a advogada.</p>
<h3>Olhar para o futuro</h3>
<p>O Tribunal não se restringe à reparação de erros do passado. Nas sentenças, além de estipular a necessidade de pagamento de indenizações e de apresentar pedidos de desculpas, os juízes se preocupam também em propor formas de evitar que os mesmos erros aconteçam novamente. “A Corte IDH olha para trás e olha para frente, demanda que os Estados façam mudanças estruturais no campo das políticas públicas para que as violações não se repitam", diz Piovesan.</p>
<p>Um efeito prático dessa atuação propositiva aconteceu no Sistema de Justiça brasileiro, com a criação do <a href="https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/elas-no-jota/cnj-protocolo-julgamento-com-perspectiva-de-genero-passo-importante">Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero</a> pelo Conselho Nacional de Justiça (<a href="https://www.jota.info/tudo-sobre/cnj">CNJ</a>) em 2021, após a condenação do Brasil pela Corte IDH no caso Márcia Barbosa vs. Brasil.</p>
<p>Na sentença, os juízes responsabilizaram o país, entre outros pontos, por não investigar e julgar o assassinato de Márcia Barbosa, morta em 1998, a partir da perspectiva de gênero. Para evitar a repetição do erro, os juízes determinaram que a Justiça do Brasil adotasse um protocolo de investigação de mortes violentas de mulheres em razão de gênero.</p>
<h3>Cumprimento das decisões</h3>
<p>Esse modelo de sentença propositiva para evitar a repetição das violações de direitos humanos traz um desafio para a Corte: acompanhar a execução das sentenças pelos países signatários da Convenção. “As decisões da Corte IDH tem essa vocação transformadora não apenas para as vítimas, mas para a realidade regional. Portanto, elas demandam a construção de políticas públicas internas que não se cumprem do dia para a noite”, diz Melina Fachin.</p>
<p>A advogada lembra que no Tribunal Europeu as decisões costumam ser mais individualistas, focadas no caso específico, enquanto na Corte IDH elas são mais abrangentes. Por isso, uma comparação entre as taxas de cumprimento das decisões não seria justa.</p>
<p>A presidência da Corte IDH prioriza como parâmetro o impacto produzido pelas sentenças nos países. Em 2023, o Tribunal registrou o maior cumprimento de sentenças já visto: oito casos foram arquivados por cumprimento total dos Estados, e 128 tiveram medidas de reparação parciais.</p>
<h3>Precedentes da Corte</h3>
<p>Não são só as medidas propostas que geram um impacto para os países da América Latina. Como muitos compartilham um histórico de violência, desigualdade e descriminação, os precedentes da Corte IDH, muitas vezes, ajudam a estabelecer parâmetros protetivos mínimos dos direitos humanos na região, compensar déficits nacionais e empoderar atores locais no luta por seus direitos.</p>
<p>"Na minha visão, os precedentes da Corte são seu aspecto mais importante. Eles estabelecem uma pavimentação mais concreta dos direitos humanos e servem de parâmetro para os países seguirem", afirma Flávio de Leão Bastos, professor da Universidade Mackenzie e advogado que atua perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos.</p>
<p>Isso porque tanto os juízes locais como os legisladores precisam respeitar a jurisprudência das sentenças da Corte e levar em conta o controle de convencionalidade. Bastos conta que, como advogado, também usa os precedentes interamericanos como argumento em casos que tramitam na Justiça brasileira.</p>
<h3>Relação com o Brasil</h3>
<p>Desde a sua criação, segundo dados próprios do Tribunal, a Corte proferiu sentenças em 20 processos relacionados ao Brasil. Os temas variam desde desaparecimentos forçados, escravidão, violência sexual, tortura, direitos trabalhistas até questões de direitos de povos indígenas e de defensores de direitos humanos, entre outros.</p>
<p>O país, nos últimos anos, tem feito um esforço maior para monitorar e fiscalizar a concretização das sentenças, medidas provisórias e opiniões consultivas proferidas pela Corte IDH.</p>
<p>Em 2021, o CNJ criou uma unidade específica responsável por, entre outras coisas, montar um banco de dados referente às decisões que envolvem o Brasil; sugerir propostas para cumprimento dessas decisões; e encaminhar informações sobre o cumprimento das decisões ao Sistema Interamericano de Direitos Humanos. "O Brasil é o único país da região que criou uma unidade no sistema de Justiça com essa ambição", diz Piovesan.</p>
<h3>Desafios da atualidade</h3>
<p>Se nos últimos 45 anos a Corte IDH teve que lidar principalmente com problemas estruturais da América Latina, como a violência, a discriminação e a debilidade democrática, a partir de agora ela terá que enfrentar novos desafios. “A Corte já foi demandada pela <a href="https://www.jota.info/coberturas-especiais/direitos-humanos/corte-idh-abre-sessoes-no-brasil-com-foco-em-emergencia-climatica-e-direitos-humanos">Colômbia e pelo Chile para fornecer uma opinião consultiva sobre a emergência climática</a>”, diz a professora da PUC.</p>
<p>A pauta climática foi amplamente discutida durante o 167º Período Ordinário de Sessões do Tribunal, que foi realizado no Brasil neste ano. Na ocasião, ao <strong>JOTA</strong>, o vice-presidente do Tribunal, o juiz brasileiro Rodrigo Mudrovitsch, destacou que a questão das mudanças climáticas hoje é também uma questão de direitos humanos.</p>
<p>Na época, a juíza Nancy Hernández López, presidente do Tribunal, também concordou com a visão e afirma que, no mundo todo, as pessoas estão recorrendo aos juízes em busca de soluções para a crise climática. "<a href="https://www.jota.info/coberturas-especiais/direitos-humanos/questao-climatica-esta-unindo-a-humanidade-diz-presidente-da-corte-idh">A Corte não pode evitar que haja mudança climática, nem controlar o clima</a>. O que essa solicitação de parecer consultivo faz é oferecer a oportunidade de que a Corte estabeleça estândares das obrigações que os Estados têm de cumprir em toda a região para atender a seus compromissos no tema de mudança climática", disse ao <strong>JOTA</strong>.</p>
<p>Os especialistas ouvidos pela reportagem concordam que, se a Corte IDHquiser continuar avançando na proteção dos direitos humanos na América Latina, ela precisa estar mais robusta. Para eles, o número crescente de demandas requer que o Tribunal adote um modelo permanente de atuação e aumente o número de juízes. O desafio é conseguir mais orçamento para sustentar essas mudanças.</p>
<p>"A Corte já faz o que pode, mas hoje os casos só chegam até ela depois de serem apreciados pela Comissão Interamericana. Ela poderia ser mais democratizada e receber os casos diretamente, mas isso dependeria de uma ampliação para conseguir absorver a demanda", diz Flávio Bastos. Para ele, seria mais fácil se os países fortalecessem seus sistemas nacionais de proteção aos direitos humanos, assim a Corte IDH só julgaria o exepcional.</p>
<h3>Celebração dos 45 anos da Corte IDH</h3>
<p>Uma comemoração oficial em celebração dos 45 anos da Corte IDH será realizada na próxima terça-feira (3/9) a partir das 18h (horário de Brasília) na sede do Tribunal na Costa Rica. Haverá também uma transmissão ao vivo pelas redes sociais da Corte IDH.</p>
<p>A presidente da Corte, a juíza Nancy Hernández López, fará a abertura do evento e depois estão programadas palestras de convidados como Elizabeth Odio Benito (ex-presidente da Corte IDH); Luis López Guerra (ex-juíz do Tribunal Europeu de Direitos Humanos); e Catalina Botero Marino (diretora da cátedra UNESCO de Liberdade de Expressão na Universidade dos Andes).</p>
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JOTA

Nos próximos anos, a Corte terá o desafio de atuar também sobre novos problemas que afetam a região, como a crise climática

Corte IDH completa 45 anos de promoção dos direitos humanos na América Latina

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