Pleno

Propostas de súmulas no Carf têm precedentes decididos por voto de qualidade

Para especialistas, a decisão por voto de qualidade demonstra que os temas ainda dividem os julgadores

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JOTA Imagens

O Pleno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) analisa, nesta sexta-feira (6/8), um pacote de 45 propostas de súmulas. A ideia é cristalizar entendimentos consolidados no conselho, porém pelo menos 11 enunciados de súmulas contam com precedentes favoráveis ao fisco decididos por voto de qualidade em mais de uma ocasião, diante de empate nos colegiados.

JOTA identificou que é o caso de temas como a tributação do lucro de controladas no exterior, ganho de capital em operações de incorporação de ações e a proibição da compensação, pela pessoa jurídica sucessora, de bases de cálculo negativas de CSLL acumuladas pela sucedida. Há ainda questões como o lançamento de ofício de crédito tributário suspenso por depósito judicial e a possibilidade de aceitar a compensação como pagamento para fins de denúncia espontânea.

De acordo com especialistas, o fato de alguns acórdãos precedentes terem sido decididos por voto de qualidade é problemático porque demonstra que determinados temas ainda dividem os julgadores, ou seja, não há entendimento majoritário.

“Se o caso é [decidido] por voto de qualidade há uma divisão concreta e não há porque engessar as decisões em uma súmula, já que isso pode ser alterado por uma decisão futura”, afirma o advogado Mario Junqueira Franco Jr., do escritório MFT Advocacia Tributária. O tributarista se refere ao julgamento que analisa a constitucionalidade do desempate pró-contribuinte, e que está pendente de análise no Supremo Tribunal Federal (STF). De tão controversa, a discussão foi suspensa pela segunda vez em junho, com placar atualmente empatado em 1X1.

Para Fernanda Lains, sócia do Bueno e Castro Tax Lawyers, é provável que se repita o que ocorreu da última vez em que o Pleno se reuniu para aprovar súmulas, em 2019, com empate em propostas cujos temas não estavam maduros. “A tributação de lucros de controladas no exterior quando existe tratado [internacional], por exemplo, é um tema que ainda não foi definido no Judiciário e está em discussão no Carf. Já se tentou votar em 2019 e [o placar] ficou em 5X5. E de lá para cá não houve amadurecimento do tema”, comenta. O tema consta em uma das propostas de súmula a serem analisadas nesta sexta.

A sessão da Câmara Superior no dia 6 de agosto marca a primeira reunião do Pleno, que reúne os integrantes da Câmara Superior do conselho, após a interrupção dos julgamentos presenciais por conta da pandemia.

Crédito tributário e depósito judicial – proposta 11

O enunciado 11, que será submetido à aprovação do Pleno, pretende definir que “não é nulo o lançamento de ofício referente a crédito tributário depositado judicialmente, realizado para fins de prevenção da decadência, com reconhecimento da suspensão de sua exigibilidade e sem a aplicação de penalidade ao sujeito passivo”.

Um dos precedentes sobre o tema, decidido por voto de qualidade, é da 1ª Turma da Câmara Superior. Em março de 2018 o colegiado deu provimento a um recurso em que a Fazenda Nacional alegou que o fato de a exigibilidade do crédito tributário estar suspensa por depósito judicial não impede o lançamento de ofício, “ainda que para prevenir a decadência”. “O depósito judicial suspende apenas a executoriedade do crédito tributário, não impedindo seu lançamento”, argumentou a fiscalização.

Ao analisar o caso, o relator, conselheiro Rafael Vidal de Araújo, afirmou que a autuação pode “ser considerada desnecessária por alguns”, mas aconteceu de forma regular “diante de seu propósito de prevenir a decadência, do reconhecimento da suspensão da exigibilidade do crédito constituído em virtude da existência de depósito judicial e da não imputação de penalidade ao sujeito passivo”.

Em agosto de 2019, o entendimento da Fazenda Nacional quanto ao crédito objeto de depósito judicial também venceu na 3ª Turma da Câmara Superior. Por voto de qualidade, os conselheiros definiram que o depósito judicial suspende a exigibilidade do crédito tributário, no entanto, a União não fica “impedida de constituí-lo pelo lançamento de ofício a fim de prevenir a decadência, sendo neste caso inaplicável multa de ofício e juros de mora”.
(Acórdãos 9101-003.474 e 9303-009.370)

Denúncia espontânea – proposta 16

Outro enunciado cujo teor não está consolidado na jurisprudência é o de número 16, que também será submetido à aprovação do Pleno. O texto propõe que “a compensação de tributos, mediante declaração de compensação (DCOMP), não se equivale a pagamento, para fins de denúncia espontânea”.

O ponto central da discussão no tribunal tem sido acerca da expressão “pagamento”, prevista no artigo 138 do Código Tributário Nacional (CTN). Os contribuintes defendem que o termo abrange a compensação, enquanto o entendimento da Fazenda Nacional é de que o pagamento é restrito aos valores em espécie, de forma que não seria possível aceitar a quitação por compensação.

Em relação ao tema o Código Tributário Nacional (CTN) define que “a responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração”.

Reportagens do JOTA mostraram que há decisões divergentes nas turmas da Câmara Superior. Em fevereiro, a 3ª Turma da afastou a multa sobre denúncia espontânea feita por meio de compensação em um resultado considerado inédito, tomado pelo voto de desempate pró-contribuinte. Mais recentemente, no entanto, a 1ª Turma da Câmara Superior decidiu que a denúncia espontânea limita-se à extinção do crédito tributário feita mediante pagamento, não sendo estendida à declaração de compensação.
(Acórdão 9303-011.117 e processo 10680.720586/2012-16, com acórdão não publicado)

Cobrança cumulativa de multas – proposta 24

O Pleno também pode fixar que é possível a cobrança cumulativa das multas isolada e de ofício para infrações ocorridas a partir de janeiro de 2007, quando entrou em vigor a MP 351/2007, depois convertida na Lei 11.488/2007.

De acordo com a 24ª proposta, “a multa isolada, na hipótese de falta de pagamento das estimativas mensais, pode ser exigida, a partir do advento da MP 351/2007, convertida na Lei 11.488/2007, concomitantemente com a multa de ofício incidente sobre a totalidade ou diferença de imposto ou contribuição nos casos de falta de pagamento ou recolhimento, de falta de declaração e nos de declaração inexata, sendo inaplicável a Súmula CARF 105 a fatos geradores a partir de então”.

Um dos precedentes apontados é da 1ª Turma da 4ª Câmara da 1ª Seção. Por voto de qualidade, o colegiado negou recurso com relação à aplicação da multa isolada sobre estimativas. O conselheiro Cláudio Camerano afirmou, no voto vencedor, que a partir da Lei  11.488/2007 foi reforçada a aplicação da multa isolada sobre as estimativas não pagas, mesmo quando o contribuinte tivesse apurado prejuízo fiscal, sem prever exceções.

Na corrente vencida, a relatora, conselheira Letícia Costa Braga, considerou que o caso analisado tratava de infrações relacionadas a um mesmo fato gerador de IRPJ e CSLL e votou para cancelar as multas isoladas.

“Se por um lado é preciso dar sentido à norma que prevê a aplicação da multa pelo não recolhimento de estimativas mesmo em caso de apuração de prejuízo fiscal ou base negativa (redação do art. 44 da Lei 9.430/1996 dada pela Lei 11.488/2007), por outro mantém-se a premissa de que não se pode penalizar mais a infração-conteúdo que a infração-continente”, afirmou.
(Acórdãos: 1401-003.996 e 1402-003.874)

Lucro de controladas no exterior – proposta 26

Submetida à aprovação da 1ª Turma da Câmara Superior, a proposta 26 enuncia que os acordos e convenções internacionais celebrados pelo Brasil para evitar a dupla tributação da renda, segundo os modelos da Organização das Nações Unidas (ONU) ou da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), não impedem a tributação na empresa controladora dos lucros auferidos por meio de suas controladas no exterior.

Em acórdão recente, de 2020, a questão foi decidida na 1ª Turma da Câmara Superior pelo voto de qualidade. A discussão girava em torno de lucros não oferecidos à tributação auferidos pela Montecitrus S/A por intermédio da controlada Montecitrus Holding BV, situada na Holanda, referentes ao ano-calendário de 2007.

A relatora, conselheira Edeli Bessa, entendeu não haver incompatibilidade entre a Convenção Brasil-Holanda, baseada nas convenções-modelo da OCDE e da ONU, e a aplicação do artigo 74 da Medida Provisória (MP) 2.158-35/2001, que estabelece que os lucros de empresas no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada na data do balanço no qual tiverem sido apurados. Para a conselheira, a norma prevista na MP não incide sobre o lucro da entidade estrangeira sob controle da entidade brasileira, mas sobre o seu reflexo no patrimônio da entidade brasileira.

A relatora também citou em seu voto que o colegiado já havia decidido pela tributação na controladora do lucro auferido pelas controladas em 2018, em processo também envolvendo a Montecitrus S.A, mas com lucros referentes ao ano-calendário 2008. Na ocasião, a questão também foi decidida pelo voto de qualidade.
(Acórdãos 9101-004.581 e 9101-003.888)

Ganho de capital em incorporação – proposta 29

A proposta prevê que “em operação de incorporação de ações, caracteriza ganho tributável pela pessoa jurídica titular das ações incorporadas a diferença positiva entre o valor da participação societária que passa a ser detida na incorporadora e o valor das ações incorporadas, registrado anteriormente à operação”.

Os membros da 1ª Turma da Câmara Superior decidiram, por voto de qualidade, manter os lançamentos relativos ao que se considerou ganho de capital apurado na operação. O caso, de junho de 2020, envolvia incorporação da WTorre Properties (que se tornou One Properties) pela BRProperties.

Para o relator, conselheiro Murillo lo Visco, os acréscimos percebidos pela BRProperties em razão de aumentos no capital da One Properties terem sido integralizados por outras sociedades “constituem, sim, ganho de capital”.

Em um outro precedente, a Alfa Corretora de Câmbio e Valores Mobiliários S/A passou a ser acionista da Bovespa Holding S.A em 2007 e, ainda naquele ano, alienou parte de suas ações, apurando resultado líquido de R$ 44.168.424,11. A corretora, porém, excluiu as rendas da base de cálculo do PIS e da Cofins, sendo autuada pelo fisco.

A 1ª Turma da Câmara Superior, por voto de qualidade, negou provimento ao recurso da empresa. Prevaleceu a tese do conselheiro Antônio Bezerra Neto, que defendeu que “na  incorporação de ações  ocorre  uma  alienação  de  ações, valorada a preço  de mercado em sua conferência para aumento de capital e que assim  enseja a tributação do ganho de capital dessa diferença.”
(Acórdãos 1402-004.5371401-001.416)

Compensação de bases negativas – proposta 36

Segundo a proposta de súmula, “é vedada a compensação, pela pessoa jurídica sucessora, de bases de cálculo negativas de CSLL acumuladas por pessoa jurídica sucedida, mesmo antes da vigência da Medida Provisória 1.858-6, de 1999″.

Em um dos precedentes decididos por voto de qualidade, a 1ª Turma da Câmara Superior deu provimento ao recurso da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) em um caso envolvendo a Ambev. A Fazenda contestou decisão da 2ª Turma Ordinária da 2ª Câmara da 1ª Seção que admitiu procedimento de compensação utilizando base de cálculo negativa da CSLL apurada por empresa sucedida.

A contribuinte realizou a compensação em 31 de dezembro de 2000, usando base negativa advinda de outras empresas que havia incorporado em abril de 1999. Isso levou a glosa por parte da fiscalização, com redução de valor do saldo negativo apurado de R$ 8.561.587,87 para R$ 3.364.040,42.

O relator, Rafael Vidal de Araújo, decidiu a favor do fisco com base no parágrafo único do artigo 44 da Lei 8.383/91, que permite às pessoas jurídicas compensarem as suas próprias bases negativas, e não as de terceiro ou as de empresas por elas incorporadas.

Avaliou, também, ser indiferente se a incorporação ocorreu antes da edição da MP n° 1.8586/99, pois a legislação apenas explicitou a proibição da compensação da base de cálculo negativa  da CSLL apurada pela incorporada com a base de cálculo de CSLL apurada pela incorporadora.

Em outro precedente, o colegiado negou provimento, por voto de qualidade, a um recurso da Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (CTEEP), que pedia o afastamento da exigência de CSLL sobre base de cálculo negativa de períodos anteriores, apurada por empresa incorporada.
(Acórdãos 9101-002.586 e 9101-004.107)

Veja abaixo outras propostas de enunciados com precedentes decididos por voto de qualidade:

Pleno:

17ª proposta: A homologação tácita não se aplica a pedido de compensação de débito de um sujeito passivo com crédito de outro.
Acórdãos por voto de qualidade: 1301-003.631 e 1401-001.995

1ª Turma da Câmara Superior:

25ª proposta: O limite legal de 30% do lucro líquido ajustado é aplicável à compensação de prejuízos fiscais e de bases negativas de CSLL acumulados, promovida no período de apuração em que ocorra a extinção da pessoa jurídica.

Acórdãos por voto de qualidade: 9101-003.111, 9101-003.025, 9101-003.125, 9101-004.230, 9101-004.800, 1202-001.105, 1101-00.691, 9101-004.555 e 9101-004.217.

30ª proposta: A intimação prevista no art. 20-A da Lei nº 9.430, de 1996, com a redação dada pela Lei nº 12.715, de 2012, somente é exigível em ações fiscais relativas ao ano-calendário 2012 e seguintes.

Acórdãos por voto de qualidade: 9101-004.757, 9101-003.910, 1201-003.196, 1402-002.816 e 1402-002.760.

2ª Turma da Câmara Superior:

37ª proposta: Para fins de comprovação de despesas médicas, a apresentação de recibos não exclui a possibilidade de exigência de elementos comprobatórios adicionais.

Acórdãos por voto de qualidade: 9202-008.004, 9202-008.063 e 9202-008.311

40ª proposta: Cancelamento da súmula CARF nº 119. A súmula diz que, no caso de multas por descumprimento de obrigação principal e por descumprimento de obrigação acessória pela falta de declaração em GFIP, associadas e exigidas em lançamentos de ofício referentes a fatos geradores anteriores à vigência da Medida Provisória n° 449, de 2008, convertida na Lei n° 11.941, de 2009, a retroatividade benigna deve ser aferida mediante a comparação entre a soma das penalidades pelo descumprimento das obrigações principal e acessória, aplicáveis à época dos fatos geradores, com a multa de ofício de 75%, prevista no art. 44 da Lei n° 9.430, de 1996. (Vinculante, conforme Portaria ME nº 129, de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019).

Acórdãos por voto de qualidade: 9202-01.794, 2202-003.907, 2202-004.302, 2301-005.046, 2301-005.121, 2401-004.759, 9202-002.193, 9202-002.636, 9202-005.211

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