Um dos membros mais antigos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), o auditor da Receita Federal Luiz Eduardo de Oliveira Santos demonstra uma visão conservadora e pragmática dos casos que passam por sua mão desde 2011, quando assumiu o cargo de conselheiro.
Ele defende que o Carf deve ser claro e objetivo na aplicação da legislação tributária, pois não é papel de um conselheiro mudar as regras impostas pelo Legislativo. Segundo ele, isso não dá possibilidade de os membros proferirem um novo inovador.
“Penso que inovação na aplicação de uma lei resultaria, objetivamente, na alteração da regra posta, por parte de um conselheiro, que não tem o mandato popular para fazê-lo com legitimidade. Tenho envidado todos os esforços para agir dessa maneira, desde 2011, quando fui nomeado conselheiro”, explica.
Com uma década no Carf e ocupando atualmente a presidência da 4ª Câmara da 3ª Seção de Julgamento do órgão, Luiz Eduardo não considera que um julgamento tem vencedor ou perdedor entre os pares da corte, já que “a discussão é inerente à decisão colegiada”.
O conselheiro, contudo, reafirma que, independentemente do resultado do processo, o colegiado deve se atentar à lei e às provas dos autos para corrigir eventuais erros que administração pública cometeu ao interpretá-las.
“Penso que a função do Carf não deva ser a de criação ou mesmo adoção de novas teses jurídicas, mas a de garantir a aplicação da legislação ao caso concreto, de maneira uniforme e conforme as provas dos autos, corrigindo assim, eventuais erros da administração na aplicação da lei. Isso é o que garante a segurança jurídica esperada pela sociedade e, ao fim e ao cabo, a legitimidade da atividade do Carf”, conclui o conselheiro, que tem como leituras preferidas as legislações.
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Ficha-técnica de Luiz Eduardo de Oliveira Santos
Formação: Bacharel em Matemática e bacharel em Direito
Alma matter: Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em 2004. Matemática pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), em 1988.
Vida acadêmica: Mestrando em Direito Público pelo Centro Universitário de Brasília (CEUB); Especialista em Direito Tributário pela UFRGS, em 2006; Especialista em Contabilidade pela Escola de Administração Fazendária (ESAF), em 2001.
Origem da indicação: Receita Federal
Time do coração ou hobby e o motivo do time ou do hobby:
Sou torcedor do Grêmio. Adotei o time quando me mudei para Porto Alegre, onde criei meus filhos até vir para Brasília, pois era o time da minha esposa, que é nascida na capital gaúcha.
Meu hobby é dar aulas porque acredito que viemos a esse mundo como seres humanos para cumprir dois objetivos: aprender e ensinar. As demais atividades também são realizadas por outros animais. Uma grande alegria foi ter gravado as vídeo-aulas que orientam todos os conselheiros que ingressam no Carf.
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Sobre as decisões de Luiz Eduardo de Oliveira Santos
Qual foi o voto mais inovador que proferiu?
A sabedoria popular diz, e no meu entendimento com razão, que “tributo bom é tributo velho”, porque é conhecido. Também diz que o povo gosta de futebol porque entende as regras. Isso denota a importância da segurança jurídica para a população, o que é incompatível com inovações em julgamentos.
Por esse motivo, tento ser o menos inovador possível em meus votos, porque entendo que a segurança jurídica seja um dos maiores anseios da sociedade, em relação à atividade de julgamento administrativo tributário.
Sem apontar um caso em específico, penso que minha maior colaboração para o colegiado tenha sido a de emprestar rigor lógico, por conta de minha primeira formação, matemática, na aplicação da legislação ao caso, no deslinde do litígio. Penso que a clareza na relatoria do caso e o rigor na apresentação dos fundamentos do voto devam ser o objetivo em todos os julgamentos.
Não considero o rigor lógico como algo inovador, no sentido de alteração do entendimento da legislação posta, mas inovador no sentido de prestar com maior clareza a necessária informação à sociedade acerca de qual seria a legislação aplicável ao caso e como deveria ser aplicada.
Ao contrário, penso que inovação na aplicação de uma lei resultaria, objetivamente, na alteração da regra posta, por parte de um conselheiro, que não tem o mandato popular para fazê-lo com legitimidade.
Tenho envidado todos os esforços para agir dessa maneira, desde 2011, quando fui nomeado Conselheiro e presidente da 2ª Seção de Julgamento e continuo com a mesma disposição em fazê-lo até hoje que sou o presidente da 4ª Câmara da 3ª Seção de Julgamento.
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Qual foi o caso mais importante em que seu posicionamento se tornou o entendimento do colegiado?
Sem apontar um caso específico, gostaria de ressaltar a relevância do processo de análise do conhecimento do recurso especial, pelas turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF). Com efeito, a cognição do recurso especial é restrita à situação em que se encontra comprovada divergência jurisprudencial sobre a matéria em litígio, entre colegiados do Carf ou da CSRF.
Essa análise deve ser feita de maneira estruturada para: (a) delimitar a matéria em discussão, (b) identificar como essa matéria foi tratada no acórdão recorrido, (c) verificar se os acórdãos apresentados a título de paradigma também trataram a matéria em situação fática comparável e (d) decidir se a aplicação da legislação à matéria pelo acordão recorrido foi divergente da aplicação dada pelos acórdãos paradigma.
Para realização dessa análise, fazemos o chamado teste de aderência do modelo, aplicando os fundamentos utilizados pelos acórdãos paradigma à situação enfrentada no acórdão recorrido. Caso esses fundamentos sejam suficientes para levar-nos a solução diversa daquela do recorrido, fica evidente a divergência e o recurso é conhecido. Caso contrário, não resta comprovada a divergência e o recurso não pode ser conhecido.
Esses critérios, apresentados de forma sistemática dão mais clareza à decisão e previsibilidade para todos.
Qual foi o caso mais difícil de formar sua convicção?
Todos os casos devem ser tratados com igual importância, porque são importantes para as partes. A dificuldade deve ser superada por estudo contínuo por parte dos conselheiros.
Qual foi o caso em que a decisão teve mais força para pacificar uma discussão?
A discussão é inerente à decisão colegiada e restar vencido ou vencedor não deve ser visto como algo relevante, desde que todos os fundamentos dos conselheiros do colegiado tenham sido claramente colocados e entendidos pelas partes e pelos demais interessados.
Penso que a função do Carf não deva ser a de criação, ou mesmo adoção, de novas teses jurídicas, mas a de garantir a aplicação da legislação ao caso concreto, de maneira uniforme e conforme as provas dos autos, corrigindo, assim, eventuais erros da administração na aplicação da lei. Isso é o que garante a segurança jurídica esperada pela sociedade e, ao fim e ao cabo, a legitimidade da atividade do Carf.
Qual foi o caso mais marcante em que você foi voto vencido?
Todos os casos em que restei vencido foram oportunidades de aprender. Na diversidade de entendimentos é que nós encontramos os pontos em que podemos melhorar.
Qual é a discussão que adoraria ter a oportunidade de participar como julgador?
Todas.
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Visão de mundo do conselheiro
Qual é o papel do Estado e do seu trabalho no desenvolvimento da nação?
O Estado tem papel fundamental no desenvolvimento da nação, aplicando a força, nos termos da lei, para organizar o comportamento dos indivíduos e assim chegar a situações almejadas.
Em nosso caso, estamos nos esforçando ao máximo para alcançar, na realidade, o tão buscado estado democrático de direito previsto em nossa constituição, no qual as situações almejadas pelo Estado são decorrência direta das escolhas da sociedade.
Quais julgamentos e decisões de que você não participou como julgador marcaram sua vida profissional até hoje?
Todos os julgamentos que eu tive a oportunidade de estudar.
Quem são as pessoas que te inspiram (pessoalmente e profissionalmente)?
Todos os conselheiros que me precederam, nos quais me inspiro para desempenhar meu papel institucional.
Quais são os livros e referências que não saem de cima da sua mesa?
- O Código Tributário Nacional (Lei n° 5.172, de 1966)
- O Regulamento do Imposto Sobre a Renda (Decreto n° 9.580, de 2018)
- O Regulamento do IPI (Decreto n° 7.212, de 2010)
- O Regulamento Aduaneiro (Decreto n° 6.759, de 2009)
- A Legislação do PIS/Pasep e da Cofins, especialmente as Leis n° 9.718, de 1998, 10.637, de 2002, e 10.833, de 2003