IRPJ e CSLL

Empresas podem ser prejudicadas pelo regime de apuração escolhido antes da crise

Tributaristas destacam que empresas no Lucro Presumido podem ter de pagar IRPJ mesmo com resultado negativo

STJ: correção monetária de rendimento em aplicação financeira é tributável
Foto: Marcos Santos/USP Imagens
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Com a pandemia da Covid-19, o regime de Lucro Presumido, visto como mais simples e benéfico por muitas empresas, pode se tornar um problema. Segundo tributaristas consultados pelo JOTA, a metodologia, utilizada para calcular o IRPJ e a CSLL devidos pelas companhias, pode fazer com que seja necessário o recolhimento dos tributos mesmo com resultados negativos.

A questão é tema de um Projeto de Lei Complementar em tramitação no Senado. O PLP 96/2020, que prevê a possibilidade de passagem do Lucro Presumido para o Lucro Real ou para o Simples, entretanto, está parado desde abril.

Com isso, advogados destacam que as regras atuais permitem a mudança no regime de tributação somente em 2021, o que pode dificultar ainda mais a situação das empresas no cenário atual. “[A empresa] já tem a certeza do prejuízo, então não há que se falar em lucro presumido. E esse prejuízo não decorre de uma má gestão, mas de uma excepcionalidade”, diz o advogado Eduardo Maneira, sócio do Maneira Advogados e presidente da Comissão Especial de Direito tributário da OAB Federal.

Presunção de lucro

O Lucro Presumido e o Lucro Real são opções para cálculo do IRPJ e da CSLL para companhias que não estão no Simples Nacional, voltado a micro e pequenas empresas.

Procurada pelo JOTA, a Receita Federal, não respondeu quantas empresas optaram, em 2020 ou em 2019, por uma ou por outra metodologia. Tributaristas, entretanto, são uníssonos em dizer que o regime do Lucro Presumido é o preferido das companhias.

Dados de 2014 disponíveis no site da Receita Federal demonstram que na ocasião pouco mais de 3% das companhias optaram pelo Lucro Real, enquanto 21,22% escolheram o Lucro Presumido. A grande maioria das companhias – 74,45% – era tributada de acordo com o Simples Nacional, e as demais eram imunes ou isentas do IRPJ.

A sistemática do Lucro Presumido, que não pode ser utilizada por bancos ou por empresas com receita bruta anual superior a R$ 78 milhões, prevê uma margem de presunção, ou seja, uma alíquota que será aplicada pela empresa, a depender do setor. O percentual, incidente sobre a receita bruta, vai de 1,6%, aplicado à revenda de combustíveis, a 32%, voltado à prestação de serviços em geral.

O regime pode se tornar problemático no contexto atual, segundo tributaristas, por não levar em consideração as despesas e os custos na hora da formação da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, já que a presunção de lucro é aplicada a qualquer receita auferida pela pessoa jurídica. “No Lucro Presumido, se pingou receita [a empresa] paga, mesmo que tenha prejuízo contábil”, sintetiza o advogado Renato Nunes, sócio do Machado Nunes.

A advogada Ana Monguilod, professora do Insper e diretora da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF), afirma que em um contexto de queda de receita o Lucro Presumido pode se tornar prejudicial, principalmente se a companhia não teve ou teve pouca redução de despesas. “Vamos pensar na situação de um prestador de serviços cuja receita caiu, mas a folha [de salários] não caiu. Agora, como a receita ficou menor e ele não conseguiu diminuir as despesas, o Lucro Presumido se tornou desvantajoso”, afirma.

Lucro Real: maior complexidade

No regime do Lucro Real, por outro lado, a base de cálculo do IRPJ e da CSLL é formada após o cálculo do lucro líquido ajustado, que leva em consideração as despesas da pessoa jurídica. Dessa forma, é possível não pagar os tributos em caso de prejuízo fiscal.

Uma das explicações para o Lucro Real ser menos utilizado pelas companhias, segundo Renato Nunes, é o fato de ser necessária uma boa apuração contábil por parte das companhias para calcular o lucro líquido. “[O Lucro Real] é mais complexo, mais custoso, e traz um risco maior de erro e de divergência de interpretação”, afirma.

Nunes ressalta que a opção pelo regime de apuração é feita no momento do pagamento da primeira parcela do IRPJ e da CSLL, o que ocorreu no final de fevereiro para o Lucro Real anual e em abril para o Lucro Real trimestral e para o Lucro Presumido. Desta forma, teoricamente as empresas já deveriam ter escolhido um regime, que só pode ser alterado em 2021.

PLP

Procurada pelo JOTA, a Receita Federal não respondeu se há estudos para possibilitar a mudança do regime de apuração do IRPJ e da CSLL em 2020. Tramita no Senado, porém, o Projeto de Lei Complementar (PLP) 96/2020, que permitiria “como medida de proteção para enfrentamento da crise econômica ocasionada pelo novo coronavírus”, que empresas migrassem do Lucro Presumido para o Lucro Real ou para o Simples no ano-calendário de 2020.

De acordo com o texto do senador Izalci Lucas (PSDB/DF), a alteração valeria uma única vez, e não seria possível mudar a sistemática de apuração dos trimestres já encerrados. A proposta, porém, está parada desde 14 de abril.
“Com a perda abrupta de receitas decorrente das medidas tomadas para evitar a disseminação da doença, como a suspensão de atividades e a redução do contato social entre as pessoas, a sistemática do lucro presumido pode se mostrar mais gravosa para as empresas que por ela optaram. Diante disso, nada mais justo do que flexibilizar, ainda que de modo episódico, a regra que impõe o caráter definitivo desse regime durante todo o ano-calendário”, diz o parlamentar na exposição de motivos do PLP.

O projeto agrada tributaristas consultados pelo JOTA. Ana Monguilod, porém, ressaltou um ponto sobre o qual as empresas devem estar atentas caso a migração se torne possível: a alteração do Lucro Presumido para o Lucro Real, via de regra, gera mudanças no regime de recolhimento do PIS e da Cofins ao qual a companhia está submetida.

Isso porque empresas do Lucro Real em geral são obrigadas a obedecer o regime não cumulativo das contribuições, com uma alíquota mais alta que o cumulativo, porém com a possibilidade de tomada de créditos.

Segundo a advogada, a opção de saída do Lucro Presumido “não seria óbvia” a depender da atividade da companhia. “Muitos itens não geram crédito. Uma coisa que não gera é mão de obra contratada de pessoa física. Se o grosso [da despesa da companhia] é folha, não teria crédito”, diz.

Já a advogada Mírian Lavocat, sócia do Lavocat Advogados, lembra que o Lucro Real, em caso de possibilidade de alteração, se torna vantajoso à medida em que a companhia possui despesas que podem ser abatidas da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Isso porque a alíquota tende a ser maior se comparada à aplicada às empresas no Lucro Presumido.