O bloqueio das contas bancárias e penhora de parte da aposentadoria de um ex-funcionário e sócio minoritário de uma empresa de engenharia para arcar com dívidas trabalhistas foram derrubados por decisão da Seção Especializada em Execução do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4), no Rio Grande Sul. Na prática, o engenheiro teve seus bens penhorados porque tinha 0,079% das ações da empresa.
Em 2018, por decisão da 2ª Vara do Trabalho de Canoas (RS), foi penhorada 20% da aposentadoria de R$ 4,4 mil mensais dele, além de valores depositados em contas bancárias no nome dele. Isso aconteceu porque a empresa Sertep S.A. Engenharia e Montagem não quitara as dividas trabalhistas com um ex-empregado; assim, a execução foi redirecionada para os sócios.
Ele diz que nunca atuou como administrador ou sócio da empresa, na qual trabalhou por cerca de três décadas, até 1998, quando foi demitido. O engenheiro afirma que só possui os papéis da empresa porque recebeu remuneração baseada em ações quando ainda era empregado. A dívida trabalhista se refere aos anos de 1992 e 1993, quando ele já era sócio minoritário.
No caso de empresas de capital aberto, a solução é mais simples. A Lei das S.A. (6.404/1976) estabelece que os sócios não respondem pessoalmente pelas obrigações que a sociedade anônima contrair e que o acionista controlador é responsável pelos danos causados em razão de atos praticados com abuso de poder. Ainda, o administrador responde de maneira solidária com o acionista controlador caso haja atos ilegais.
Nesse caso, embora a Sertep tenha ações, ela tem o capital fechado, então essas regras não se aplicam. Por isso, segundo a desembargadora Cleusa Regina Halfen, relatora dessa etapa do processo, é possível o redirecionamento da execução contra os acionistas, independentemente de eles serem ou não gestores da empresa.
“Ainda que inexista vedação legal expressa à responsabilização do sócio minoritário pela integralidade das dívidas da sociedade, não se considera razoável, tampouco proporcional, que o sócio titular de quota inexpressiva do capital social, sem qualquer influência nos rumos ou no gerenciamento da empresa responda pelos débitos trabalhistas”, afirmou.
Ficou determinada a exclusão do nome do engenheiro eletricista do polo passivo da execução; com isso, devem ser restituídos os valores descontados da aposentadoria dele, bem como devolvidos os recursos bloqueados de suas contas.
Ao acompanhar o voto da relatora, o desembargador Marcelo Gonçalves de Oliveira ainda teceu críticas ao que considera uma “situação incômoda e injusta”, isto é, a inclusão de sócios com participação desprezível em execuções de dívidas.
Ele sugere que se leve em conta a posição que o acionista mantém no negócio seja usado como norte para definir se ele poderá arcar com as dívidas: “O potencial proveito econômico que o sócio tem na sua participação acionária, o potencial poder que ele tem com seu percentual de ações para as deliberações sobre o empreendimento. Ausente potencial, não há que se falar em responsabilidade, salvo em situações de fraude”, defendeu.
“Impossível ver qualquer proveito que ele [o engenheiro] possa ter tido com tão pequena participação acionária. Impossível imaginar que seu voto em assembleia pudesse determinar os destinos do empreendimento”, completou.
O argumento foi questionado pelo desembargador Janney Camargo Bina. Ele afirmou não enxergar amparo legal para afastar afastar a responsabilidade de sócios com pequena participação societária diante de créditos trabalhistas.
“A exclusão da responsabilidade de algum sócio pelo argumento de que possui participação mínima no capital social afronta as disposições legais que atribuem responsabilidade solidária e ilimitada a todos eles. Não bastasse isso, entendo que a criação de tal exceção autoriza manobras societárias para evitar a responsabilização de alguns sócios”, avaliou.
Porém, ele concordou com o voto da relatora, já que nesse caso se trata de um funcionário que se tornou sócio minoritário do empregador, “em nítida simulação que visa atribuir a condição de sócio a quem é de fato simples empregado, sem qualquer atuação empresarial, situação muito excepcional e que exige indícios robustos”.
O processo tem o número 0095300-42.1994.5.04.0202.