PANDEMIA

Teich admite que distanciamento é a medida mais eficaz enquanto Brasil estiver “navegando às cegas”

Ministro da Saúde diz que flexibilização será orientada apenas aos municípios que registrarem curva descendente de casos

Nelson Teich, ministro da Saúde, participa de videoconferência com senadores sobre coronavírus. (Foto: Leopoldo Silvao/Agência Senado)

Prometida para esta semana, a diretriz do Ministério da Saúde para flexibilização do distanciamento social esbarrou no aumento de número de casos e de óbitos por coronavírus registrados no País, que ultrapassou a China em número de mortes. Pela primeira vez desde que assumiu o cargo, o ministro Nelson Teich admitiu com clareza que o isolamento é necessário para o Brasil neste momento. 

Segundo o ministro, faltam dados sobre o percentual de contaminação da sociedade e sobre o potencial de transmissão relacionado a casos assintomáticos. Nesse sentido, o governo tem buscado ampliar a testagem para adotar estratégias, ainda segundo Teich, mais eficazes no combate à Covid-19.

“Os testes que a gente faz não permitem, hoje, saber exatamente qual é essa realidade. Sem esse conhecimento, você literalmente está navegando às cegas. Essa que é a grande verdade. Então, um isolamento que radicaliza é necessário porque você não sabe o que fazer. A única coisa que você sabe é que o distanciamento diminui o risco de contágio”, afirmou, nesta quarta-feira (29/4), em audiência pública no Senado. 

Alvo de questionamentos de vários senadores, o ministro avaliou que a questão deve ser tratada com profundidade e voltou a dizer que haverá orientações customizadas para diferentes cidades, estados e regiões. 

“O Ministério da Saúde nunca mudou a orientação original de manter o distanciamento. Onde a gente está vendo uma alteração em relação a isso, é uma decisão dos governadores. A nossa orientação, desde o começo, é o distanciamento”, afirmou o ministro.

Teich deixou claro que a aplicação da diretriz em formulação não deverá ser imediata, sendo um dos pré-requisitos para a recomendação a constatação do início de uma curva descendente de casos. O ministro tratou o isolamento como uma “ferramenta” que pode ser bem ou mal usada. 

“É importante que já tenha um planejamento prévio quando isso acontecer para que tenha critérios: quem sai, como sai, qual subgrupo sai. Então, o fato de a gente estar planejando agora não quer dizer que a gente vai sugerir uma flexibilização no momento em que a curva ainda está ascendente. Perguntar se fica em casa ou se não fica em casa é simples demais; é uma resposta simplista para um problema que é extremamente heterogêneo. Então, o ideal é que a gente tenha os testes: quem é positivo vai ficar; quem for mais velho vai ficar; pessoas que tiveram contato vão ficar. Vai depender da curva que existe em cada região, vai depender de quantos casos tiveram em cada região”, explicou. 

Politização do distanciamento

O ministro criticou, ainda, a polarização política em torno da questão, um dos pontos centrais dos embates públicos entre o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta e o presidente da República, Jair Bolsonaro. 

“Eu não vou sentar e discutir esse tipo de abordagem politicamente. Eu vou discutir o que é melhor para a sociedade. Eu vou discutir: ‘se eu faço isso, morrem x de Covid, mas dependendo do que eu fizer pode ser que morra muito mais gente de outras coisas’. Tem mais de 1 milhão e 300 mil pessoas que morrem no Brasil por ano. É por isso que eu digo: eu olho isso tentando enxergar o equilíbrio ideal para a sociedade. E aí realmente seria muito bom se a gente tentasse trabalhar as perguntas, as discussões e os trabalhos em cima de uma coisa mais técnica, mais voltada para a sociedade e não tentando criar em cima de polarização. Acho que seria o ideal para mim”, analisou. 

Centralização

Desde a chegada do novo secretário-executivo da pasta, general Eduardo Pazuello, o ministério passou a defender a centralização e distribuição de equipamentos aos estados e municípios. Aos senadores, Pazuello disse que o Centro de Operações Estratégicas (COE), sob sua gestão, trabalha com o recebimento de demandas dos gestores de forma ininterrupta, mas reforçou que os locais em situação mais crítica serão atendidos de forma prioritária.

“Não há nenhuma vantagem em um estado ter prioridade sobre os outros. Essa prioridade está representada pela total situação de calamidade que está vivendo. Nenhum estado, nenhuma cidade, nenhuma região está deixando de ser observado e deixando de receber o que foi combinado. Leitos estão sendo habilitados, recursos estão sendo repassados”, afirmou o número dois.

Após críticas de secretários de saúde, Teich passou a se reunir com governadores e defendeu a união de gestores e parlamentares no enfrentamento à doença. Segundo o ministro, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems) terão participação nas decisões da pasta.

“Hoje a gente teve reunião com o Conass e o Conasems justamente para trazê-los para as nossas reuniões estratégicas. Eles vão participar tanto da discussão dos problemas quanto das soluções. Isso é uma coisa que vale também para os senhores [senadores]. A gente vai trabalhar como um bloco. Hoje, não existe ‘nós’ e ‘vocês’. Hoje, a gente é uma coisa só”, disse.

Respiradores

Uma das maiores dificuldades do governo federal é na aquisição de respiradores, acompanhando o cenário mundial. O Brasil contava com a entrega de 15 mil unidades da China, mas a negociação herdada da gestão de Luiz Henrique Mandetta não se concretizou. Segundo Teich, a razão seria a recusa de depósito antecipado por parte do ministério.

O ministério conta, agora, com a entrega de 14,1 mil respiradores pela indústria nacional. “Isso é feito de uma forma faseada. Nesse espaço de tempo, o ideal é a gente evitar ter o mínimo de crescimento explosivo da doença para que a gente consiga ir tratando essa população. Os recursos são menores do que a gente gostaria que fossem, justamente porque a gente está dividindo com o mundo”, disse o ministro aos senadores.

Recursos financeiros

Nelson Teich afirmou ainda que, devido a restrições orçamentárias, o governo federal precisa focar em eficiência para abastecer o Sistema Único de Saúde (SUS).

“É muito difícil, principalmente num país como o nosso, que é um país mais pobre. Para vocês terem ideia, os Estados Unidos gastam mais de US$ 10 mil por pessoa por ano. No SUS, hoje, a gente não tem US$ 500 por pessoa por ano para gastar. É uma diferença enorme. Isso faz com que nosso foco em eficiência tenha que ser total”, disse.

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