
O secretário de Atenção Especializada à Saúde, Helvécio Magalhães, em entrevista ao JOTA deu detalhes sobre como vai funcionar o mutirão de cirurgias, exames e procedimentos no Sistema Único de Saúde. Promessa de campanha, a iniciativa tem como meta reduzir as filas para tratamento, que já eram preocupantes e se agravaram no período da pandemia.
Não há números certos sobre quantas pessoas aguardam atendimento. E esse é um dos pontos que o Ministério da Saúde pretende resolver. Hoje, afirma Magalhães, o sistema funciona “às cegas”, sem controle sobre quantas pessoas estão de fato na fila.
Embora considerado muito importante, o secretário reconhece que o mutirão, por si só, não resolve o problema. “Essas iniciativas já foram feitas no passado. E não tiveram resultados muito bons.”
Por isso, a ideia é inovar. Fazer num primeiro momento uma ação emergencial para reduzir a demanda reprimida e, ao mesmo tempo, estudar os motivos que levam ao represamento de cirurgias, consultas e exames. “Vamos fazer uma ação estruturante”, contou.
A seguir confira os destaques da entrevista, concedida no dia 26 janeiro.
Financiamento
No primeiro momento, serão destinados aos Estados, de forma antecipada, R$ 200 milhões — um terço do montante total reservado para a primeira etapa da ação, voltada para cirurgias.
A divisão de recursos será feita de forma proporcional à população. A quantia será liberada mediante a apresentação de um plano formulado por cada unidade da federação. “Alguns estados já têm plano pronto, porque eles já estavam fazendo as ações com recursos próprios. Agora, com reforço federal, poderão realizar muito mais”, disse o secretário. Entre os estados com dados já reunidos, afirmou Magalhães, estão Ceará, Bahia e Paraná.
Os planos, acertados em comum acordo entre estados e municípios, devem conter qual proposta de atendimento: quantas serão, de que natureza e em que serviços as ações deverão ser feitas. “Fazemos uma análise, homologamos e transferimos os recursos”, afirmou Magalhães.
Depois dos R$ 200 milhões liberados de forma antecipada, as demais parcelas serão distribuídas mais livremente. “A ideia é não engessar. Os recursos, repassados de acordo com per capita, serão enviados seguindo planejamento preparado com municípios. Se os Estados fizerem ações de forma contínua, os valores restantes poderão ser pagos mensalmente, na medida da produção.”
O parâmetro será a fila existente em 31 de dezembro. O secretário reconhece que o número não é preciso. Mas ressalta que um parâmetro era necessário. À medida que eles forem alcançando os primeiros resultados, novas metas poderão ser propostas e, desta forma, novos valores podem ser repassados.
“Um estado diz, por exemplo: queremos fazer 200 cirurgias até abril, tudo seguirá conforme um determinado planejamento”. A estratégia, de acordo com o secretário, foi feita de forma a simplificar ao máximo, levando em consideração as experiências bem sucedidas.
Tipos de cirurgia
O tipo de procedimento realizado ficará a critério dos planos estaduais. “Temos indicativos que cirurgias abdominais ortopédicas e oftalmológicas são as principais”, afirmou Magalhães. Há, contudo, uma recomendação do Ministério da Saúde para que uma atenção especial seja dada para cirurgias de câncer.
“Embora elas não sejam em grande volume, são decisivas”, completou o secretário. Ele observou ainda que muitos dos pacientes precisam ter outros tratamentos associados à cirurgia, como radioterapia ou quimioterapia. “A recomendação é de que gestores tenham um olhar cuidadoso para questões relacionadas ao câncer. Projetos nesta área terão prioridade.”
A grande maioria dos procedimentos, disse o secretário, deverão ser para hérnia, vesícula, catarata ou para problemas ortopédicos.
Participação da iniciativa privada
A exemplo do tipo de cirurgias, a participação da iniciativa privada será prevista nos planos feitos pelos estados em parceria com municípios. “Alguns estados têm experiência de abrir editais para participação do setor privado”, disse o secretário Magalhães.
Haverá liberdade para o gestor traçar o melhor modelo. Em alguns locais, a participação da iniciativa privada é essencial, afirmou. Há também uma discussão com a Confederação Nacional de Hospitais Filantrópicos. “Algumas alternativas são pensadas. Cirurgias feitas à noite, aos fins de semana. Há, sim, a possibilidade de se agregar o setor privado”, completou.
Hospitais Federais e Ebserh
O secretário de Atenção à Saúde afirmou também haver um esforço para participação de hospitais federais e instituições integrantes da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares. A iniciativa tem como objetivo reforçar mutirões.
“Os recursos para essa nova estratégia não estão definidos. Mas já orientamos a direção de hospitais do Rio de Janeiro e vamos nos reunir com a diretoria da Ebserh para pensar em novos projetos.”
Um olhar para o Norte
Um tema que merece atenção é o atendimento no Norte. O secretário avalia que será necessário um olhar especial para estados da região. “Provavelmente, para mutirões, teremos formatos diferentes, porque eles historicamente têm maior dificuldade para executar alguns projetos”, disse o secretário.
Uma das alternativas, afirmou, é deslocar equipes para atuar em instituições dos estados. Outra possibilidade, afirmou, é usar metodologia semelhante à Força Nacional do SUS, a exemplo do que está em prática com os yanomami.
“Talvez façamos algo parecido. Combinando com o gestor local. Ele prepara pacientes, monta a agenda, faz exames pré cirúrgicos e equipes são deslocadas para as ações. Esse conjunto de iniciativas certamente terá um impacto positivo.”
Uma reunião também deverá ser realizada com gestores sobre o tema.
Miranda afirmou estar no horizonte também firmar parcerias com o Proadi, o programa feito entre Ministério da Saúde e hospitais de excelência. “Talvez deslocar profissionais para fazer o atendimento, com preceptores e residentes.” Por enquanto, são ideias que exigem ainda amadurecimento. “O processo precisa ser pactuado com hospitais, movimento negociado com hospitais.”
Sobre a Força Nacional, o secretário avalia ser possível adotar estratégias de maior duração. Na iniciativa, a exemplo do que ocorre agora na crise com povo yanomami, o ministério paga deslocamento, diárias, para profissionais voluntários.
“É muito comum uma pessoa ser operada e o nome continuar na fila. E o contrário também ocorre: a pessoa se inscrever e seu nome sumir. Tem de tudo…. Por isso, precisamos ter um esforço dos três entes para arrumar essa fila, ter sistema, saúde digital, usar experiências de outros estados, do setor privado para a gente ter noção. Hoje, é como navegar às cegas.”
O secretário continua: “Jovens médicos que fazem especialidade na área cirúrgica têm muito interesse em trabalhar e às vezes encontram algumas barreiras. É possível arregimentar esses especialistas e o preceptor, profissional mais experiente, e realizar a cirurgia. Vamos fazer todos os esforços, inovar.”
O controle das filas
Embora não existam números precisos, o Ministério da Saúde trabalha com a perspectiva de que 2 milhões de pessoas aguardem o momento para fazer cirurgias já prescritas por seus médicos em serviços do Sistema Único de Saúde, além de exames e consultas.
“Precisamos de dispositivos, ferramentas tecnológicas que nos permitam mecanismos de regulação, de gestão da fila e transparência”, disse o secretário. E mecanismos para limpar a fila.
“É muito comum uma pessoa ser operada e o nome continuar na fila. E o contrário também ocorre: a pessoa se inscrever e seu nome sumir. Tem de tudo… Por isso, precisamos ter um esforço dos três entes para arrumar essa fila, ter sistema, saúde digital, usar experiências de outros estados, do setor privado para a gente ter noção. Hoje, é como navegar às cegas.”
A ideia é dispor de mecanismos que permitam, em nível nacional, identificar a ordem de entrada nas listas, por tipo de procedimento e que isso possa também ser acompanhado de forma local. “Precisamos de medidas estruturantes de médio prazo. E esse debate já teve início com Estados e municípios.”
Enquanto ações estruturantes não se concretizam, mutirões serão iniciados de forma emergencial. Há demanda tanto para cirurgias, exames de diagnóstico e consulta. A decisão de iniciar com cirurgias, disse, foi tomada sobretudo em virtude da urgência e, também, pelo fato de experiências semelhantes já terem sido adotadas no passado.
“É preciso reconhecer que há mais de 20 anos se fala em mutirões. E os resultados nunca foram bons, de forma geral. Mas há algumas experiências bem sucedidas, que estamos catalogando, estudando. Neste vácuo que o Ministério da Saúde teve nos últimos anos, Estados precisaram se organizar, fizeram policlínicas, consórcios. Vamos ver o que deu certo e tentar replicar.”