Diante da forte pressão do governo para um prazo de vista de sete dias para a votação do processo de privatização da Eletrobras, o ministro do TCU Vital do Rêgo jogou com o regulamento e deu um nó tático no governo. Após a leitura do relatório do ministro Aroldo Cedraz, que aponta para a necessidade de recálculo do preço mínimo pelo BNDES, Vital se manifestou. Criticou quatro pontos do texto apresentado pelo seu colega e apontou que, de acordo com o regimento, o plenário só poderia deliberar sobre um pedido de vista superior aos 20 dias previstos no regimento.
Com esse raciocínio, ele deixou claro que não abriria mão do prazo regimental, destacando que a vista de uma semana concedida no leilão de 5G no ano passado foi uma excepcionalidade.
Na sequência, o ministro Jorge Oliveira, uma espécie de líder do governo na Corte, manifestou pedido de vista de sete dias, que colocaria a votação em 27 de abril, no limite para viabilizar o certame em 13 de maio.
Mas Oliveira foi atropelado pelas manifestações de Benjamin Zymler e Bruno Dantas, que foram assertivos em dizer que só Vital poderia voluntariamente reduzir o prazo, e não caberia ao plenário se sobrepor ao regimento. O ministro Antonio Anastasia acompanhou essa leitura.
Percebendo a causa perdida, o próprio Jorge Oliveira recuou e disse que realmente a decisão por um prazo mais curto seria prerrogativa de Vital, e não caberia ao plenário forçar em contrário. Vital reiterou seu pedido de 20 dias, afirmando que não insistiria em uma votação para um prazo maior.
Com a leitura pacificada em plenário, a ministra Ana Arraes, presidente do TCU, acolheu o pedido de Vital do Rêgo e concedeu a vista de 20 dias, de forma que a votação poderá ser retomada a partir de 11 de maio. Como há outros trâmites a serem feitos após o TCU, como passar pela CVM, a vitória de Vital, na prática, inviabiliza o leilão em 13 de maio, a não ser que o governo mude tudo e resolva fazer a operação sem ter a aprovação do TCU — o que teoricamente é possível, mas altamente improvável de ocorrer.
O ministro Bruno Dantas, que nos bastidores atuou para tentar um prazo intermediário entre o governo e o impulso original de 60 dias que Vital do Rêgo planejava, afirmou que a perda da janela de 13 de maio não significa o fim da privatização neste ano.
Para Dantas, que também disse que nunca mais votará como fez no 5G para reduzir o prazo de vista, não há substancial perda se a operação for feita em julho e destacou que o argumento do governo para pressionar pela votação em 27 de abril não se sustentava. O futuro presidente da Corte deixou clara sua insatisfação com a pressão feita pelo governo, sobretudo pela imprensa, para viabilizar a votação na semana que vem.
A ver agora se o governo conseguirá colocar de pé essa operação para a próxima janela e como o próprio TCU vai se comportar à medida que o balanço de referência para a operação terá que ser trocado. O Ministério de Minas e Energia disse que não comentará a decisão. Por ora, o Ministério da Economia não se pronunciou. O fato é que os riscos de a privatização não ocorrer aumentaram substancialmente, ainda que não se possa descartar sua realização.