Por unanimidade, o Tribunal Administrativo do Cade arquivou um processo administrativo contra 18 cimenteiras suspeitas de recusar a venda de alguns tipos de cimento para concreteiras do Estado de São Paulo como o objetivo de forçar a compra de cimento do tipo CPIII - mais caro.
O caso começou a ser investigado em 2003, a partir de denúncia da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). O julgamento foi marcado pelo consenso entre os conselheiros sobre a ocorrência de bis in idem. Ou seja, se fossem condenadas algumas das empresas estariam sendo punidas de novo pela mesma conduta, uma vez que faziam parte do chamado Cartel do Cimento. Outro fundamento usado pelos conselheiros para arquivar o processo foi a ausência de provas para comprovar infração à ordem econômica na forma de paralelismo na atuação das empresas.
A conselheira Cristiane Alkmin foi a única a votar pela ocorrência de prescrição intercorrente - quando a administração passa três anos sem movimentar o processo administrativo. Seu voto foi seguido de discordâncias dos conselheiros Gilvandro Vasconcelos de Araújo, Alexandre Cordeiro e Márcio de Oliveira Júnior.
O Plenário seguiu a recomendação da Superintendência Geral e da Procuradoria Geral do Cade pelo arquivamento do processo contra Intercement Brasil S.A.; CCB Cimpor Cimentos do Brasil Ltda.; Ciplan – Cimento Planalto S.A.; Cia. de Cimento Itambé; Lafarge Brasil S.A.; Itabira Agro Industrial S.A.; Itautinga Agro Industrial S.A.; Cimentos do Brasil S.A. – Cibrasa; Itapicuru Agro Industrial S.A.; Itapissuma S.A.; Ibacip – Indústria Barbalhense de Cimento Portland S.A.; Itapetinga Agro Industrial S.A.; Itapessoca Agro Industrial S.A.; Itaguassu Agro Industrial S.A.; Empresa de Cimentos Liz S.A.
Em linha com o Ministério Público Federal, e em desacordo com a Procade e a SG, os conselheiros também arquivaram o processo contra a Votorantim Cimentos Ltda., Holcim Brasil S.A. e Cimento Tupi S.A. por ausência de provas sobre atuação concertada das empresas.
No caso das empresas envolvidas no Cartel do Cimento, houve consenso de que o Cade puniu as empresas por uma conduta mais abrangente, que incluía a recusa na venda de determinados tipos de cimento, além de mercado também mais amplo - que englobava todo o país.
Em seu voto condutor, Paulo Burnier apontou a existência de indícios de que as empresas adotaram uma atuação paralela no mercado, mas não foram obtidas provas para configurar o chamado "plus factor" - sejam provas diretas da atuação conjunta entre elas, como emails, telefonemas, mensagens, agendas etc - ou provas circunstanciais da conduta.
"Em que pese o paralelismo no comportamento das representadas e condições favoráveis, não constam nos autos provas diretas de que o paralelismo tenha sido concertado", afirmou Burnier. "Há indícios suficientes para abertura do processo administrativo, que que precisariam ser comprovados ou reforçados - o chamado plus factor. Em outras palavras seria necessário haver provas circunstanciais adicionais ao paralelismo para ser considerado suficiente para a condenação em ambito administrativo."
Divergência sobre prescrição intercorrente
A conselheira Cristiane Alkmin foi a única a divergir, apontando a existência de prescrição intercorrente no caso. O ato que interrompeu o prazo prescricional, considerado válido e pertinente por todos os demais conselheiros, foi a juntada aos autos de uma nota técnica da Superintendência Geral no dia 1º de abril de 2015.
Naquela data, a Nota Técnica acrescentou os autos do Processo Administrativo do Cartel do Cimento e abriu prazo para alegações das empresas investigadas.
O relator Paulo Burnier considerou que o ato interrompia a prescrição porque os autos do Cartel do Cimento estavam classificados como apartado restrito, sem acesso às partes. Adicionar os documentos ao processo julgado nesta terça-feira (18/10) permitiria o contraditório e a ampla defesa.
Na visão de Cristiane Alkmin, a inclusão dos autos do Cartel do Cimento não pode ser considerada um "ato inequívoco que importe na apuração dos fatos", por isso seu voto pela ocorrência de prescrição intercorrente.
A conselheira também fez ampla análise sobre a racional econômica envolvida na recusa da venda de cimentos do tipo CP-II e CP-V poderia ser vista como uma decisão "lógica" do ponto de vista empresarial, em busca de aumento de lucros.
Logo em seguida, Gilvandro Vasconcelos de Araújo votou pela inexistência de prescrição. Apontou que o fato de as empresas investigadas por paralelismo constarem no pólo passivo no Cartel do Cimento justifica a avaliação de que a juntada dos autos "tem total pertinência" para investigar o plus factor em um caso de paralelismo.
Ele também minimizou a análise da racional econômica no caso e disse que o plenário deveria focar em provas da conduta.
Alexandre Cordeiro também defendeu a inexistência de prescrição.
"A análise sobre a importância ou não da juntada dos documentos é feita pela SG e pela autoridade em momento posterior. No momento da juntada estou fazendo isso para saber se é ou não relevante", avaliou o relator. "A partir daí decido se são relevantes, o que caracterizou instrução processual e afasta prescrição intercorrente."