
O Supremo Tribunal Federal (STF) tem maioria para negar um pedido do partido Solidariedade para restringir o alcance de punições eleitorais por fraude à cota de gênero aos responsáveis pela conduta, de modo a livrar possíveis beneficiários que “concorreram de boa-fé”. O julgamento é realizado no plenário virtual e termina nesta sexta-feira (31/3), às 23h59.
A ação, ADI 6.338, tem como objeto dois artigos, um da Lei das Eleições e outro do Estatuto das Inelegibilidades, que tratam da política representativa de gênero no processo eleitoral. O pano de fundo, contudo, é um entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no sentido de ser necessária a cassação de todos os beneficiados pela fraude.
Para a legenda, a previsão viola o princípio da proporcionalidade na medida em que seria possível adotar soluções menos “drásticas” e ofende “as escolhas populares soberanas legitimamente manifestadas nas urnas, sem que se identifique qualquer bem jurídico de estatura constitucional para justificar tamanha restrição”.
O Solidariedade também argumentou que a medida, “se aplicada de forma cega e absoluta”, pode contribuir para a manutenção do conjuntura política atual e até mesmo ampliar a assimetria de gênero, com a diminuição da representatividade feminina em cargos eletivos.
O risco, alertou a sigla, é “de se instituir um eventual faroeste eleitoral, decorrente de ardis engendrados por candidatos e/ou partidos, os quais ver-se-iam estimulados a cooptar indivíduos, em geral mulheres, com o intuito canhestro de preencher fraudulentamente o percentual da cota de gênero em chapas adversárias”.
A relatora, ministra Rosa Weber, afirmou que, a rigor, a hipótese seria de rejeitar a petição inicial por “absoluta incongruência” entre a fundamentação e o pedido. A ministra explicou que, embora o partido ressalte durante toda a peça a necessidade de proteção da igualdade de gênero, pede no final algo “avesso à referida argumentação”.
Apesar disso, decidiu receber a ação por haver pedido certo e determinado em face de normas específicas. Além disso, ressaltou que o tema é de “extremo relevo social, econômico, político e jurídico”.
Em seu voto, a ministra traçou um longo panorama, da conquista do voto feminino à fraude na cota de gênero. Segundo ela, por muito tempo, as mulheres foram subjugada e excluídas da arena pública. E, embora a luta pelo fim da discriminação tenha dado frutos, ainda não terminou.
“Os números assustam e revelam que, apesar de uma pequena e gradual evolução nos últimos anos, a participação feminina na política ainda se mostra aquém do desejável, sendo necessário uma atuação mais energética do Estado para atingir melhores níveis de paridade entre os gêneros,” frisou Weber.
A magistrada declarou haver uma “nítida preocupação com o déficit representativo das mulheres na política” no plano normativo, mas a falta de uma sanção adequada e eficaz enfraqueceu esse quadro.
É, nesse sentido, que a ministra julgou o pedido improcedente. A ministra descartou a aplicabilidade da teoria do impacto desproporcional, “haja vista a necessidade de punição rigorosa das condutas fraudulentas e o imperativo legal de cassação de registro ou de diploma de todos os beneficiados”.
“Direito sem coerção é, no mínimo, ineficaz e perde seu caráter transformador de condutas. Dispor sobre cotas de gênero, mas não aplicar a devida punição a todos os beneficiados torna inócua e sem razão de ser a legislação”.
Até o momento, oito ministros acompanharam o voto da relatora: Ricardo Lewandowski, André Mendonça, Cármen Lúcia, Edson Fachin, Dias Toffoli, Alexandre de Moraes e Roberto Barroso e Gilmar Mendes. O ministro Luiz Fux declarou-se suspeito. Ainda falta votar o ministro Nunes Marques.