Transparência

STF mantém suspensão de MP que limitava Lei de Acesso à Informação

Plenário manteve liminar do ministro Alexandre de Moraes, derrubando trecho da MP 928/2020

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Sessão plenária do STF realizada por videoconferência. Crédito: Fellipe Sampaio/SCO/STF

O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve, nesta quinta-feira (30/4), a suspensão de dispositivo da Medida Provisória 928/2020, que suspendia prazos de resposta da Lei de Acesso à Informação (LAI). Por maioria, foi referendada decisão liminar proferida pelo ministro Alexandre de Moraes no dia 26 de março.

A MP 928 é questionada nas ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) 6347, 6351 e 6353, ajuizadas pela Rede Sustentabilidade, pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), respectivamente.

Editada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em 23 de março, a medida provisória prevê que ficarão suspensos os prazos de resposta a pedidos de acesso à informação nos órgãos públicos cujos servidores estejam sujeitos a regime de quarentena, teletrabalho ou equivalentes, e que dependam de acesso presencial de agentes públicos encarregados da resposta.

Ainda de acordo com a MP, não seriam válidos recursos contra a negativa de resposta. Caso o cidadão tenha seu pedido negado ou não respondido, deverá repetir o pedido em até dez dias após o fim da situação de calamidade pública – que está previsto para terminar apenas em dezembro.

Em seu voto, Moraes reiterou os argumentos que já havia exposto na liminar. O ministro disse que a Medida Provisória 928, ao alterar as regras da LAI,  trouxe restrições genéricas e abusivas à garantia constitucional do acesso a informação, afrontando os princípios da publicidade e transparência. “Qual a razoabilidade de, durante a pandemia, se restringir o acesso a informação? Nós temos mais de cinco mil municípios, desde o menor município até a União, essa restrição não tem qualquer razoabilidade”, disse o relator.

A Lei de Acesso à Informação foi instituída pela Lei 12.527, de novembro de 2011. O ministro destacou que a norma que trouxe alterações na LAI sequer chegou a produzir efeitos por causa da liminar concedida. “Estamos no dia 30 de abril. Não houve nenhum problema de acesso a informação relacionado à pandemia, nenhum problema de combate à pandemia por causa disso. Os problemas são outros, são graves, mas são outros. Nenhuma norma da OMS ou de qualquer outra organização disse que restringir o direito à publicidade e à transparência auxilia no combate a pandemia”, falou.

“A Constituição Federal consagrou expressamente o princípio da publicidade, um dos vetores mandatórios para os Três Poderes. A transparência, que os gestores públicos têm obrigação de seguir, principalmente num momento em que licitações não são exigidas para compras de inúmeros materiais, é uma importância maior ainda prestar as informações”, destacou Moraes. “A publicidade e transparência são absolutamente necessárias para fiscalização dos órgãos governamentais. O acesso à informação é verdadeira garantia instrumental do pleno exercício democrático”. 

Assim, votou por manter a decisão de suspender os efeitos do artigo 6º-B da Lei 13.979/2020, incluído pelo artigo 1º da Medida Provisória 928/2020. Moraes foi acompanhado por todos os outros nove ministros. Celso de Mello estava ausente.

Ao acompanhar Moraes, o ministro Ricardo Lewandowski disse que o princípio da transparência e publicidade deve ser ainda mais presente neste momento de combate à pandemia da Covid-19. “Exatamente nos momentos de crise é que temos que respeitar inescrupulosamente a nossa constituição. A informação é um direito do cidadão, a publicidade é um dever do estado. Conjugando-se esse direito e esse dever, nós temos exatamente os instrumentos necessários para que o povo brasileiro possa controlar os governantes”, falou.

A ministra Cármen Lúcia aproveitou o voto para elogiar o trabalho de Alexandre de Moraes. Na manhã desta quinta-feira, o presidente Jair Bolsonaro, durante entrevista no Palácio do Alvorada, criticou decisão do ministro de suspender a nomeação de Alexandre Ramagem para o cargo de Diretor-Geral da Polícia Federal.  “Cumprimento de forma muito especial o ministro Alexandre de Moraes que honra a magistratura brasileira, como honrou a advocacia, como honra sempre a carreira de magistério de Direito Constitucional pelo seu trabalho, pelo seu empenho, pela sua seriedade, pela sua responsabilidade, pelo seu vasto conhecimento que faz com que o Brasil saiba que há, sim, ótimos juízes que vêm das academias”, disse a ministra.

Em relação à Lei de Acesso à Informação, Cármen Lúcia disse que a norma “promoveu uma mudança de modelo de administração pública na esteira da Constituição Federal, que ainda sequer foi integralmente cumprida e acolhida, tal a seriedade e necessidade que havia dela”. Em sua visão, há um problema de informação sobre a administração pública no Brasil. “De sombras e trevas que perpassaram a história da administração pública, nós tivemos os lapsos que não foram poucos de falta de democracia. A LAI representou um passo importantíssimo para a administração pública, só fica contra ela quem, de alguma forma, não quer que se tenha acesso amplo e necessário”, concluiu.

O ministro Luís Roberto Barroso disse que a própria LAI já traz dispositivos que funcionam como “válvula de escape para momentos de emergência”, e que não havia necessidade de criar mais exceções para o acesso a informação aos cidadãos. “Essa MP fornece uma solução para um problema que não há, além de dar um cheque em branco em linha divergente com a Constituição”, disse.

Já o ministro Gilmar Mendes disse que a MP 928 “traz uma amplitude da limitação à Lei de Acesso à Informação”, comprometendo a publicidade dos atos normativos e a transparência, colocando em risco o direito à informação, à publicidade e à transparência. “Não há como considerar, antecipadamente, que no período em que perdurar a pandemia internacional a publicidade deva ser condicionada a entraves meramente burocráticos como saber ou não se o servidor está em regime de teletrabalho. Ademais, não é possível limitar, de antemão, o acesso de todo e qualquer informação de um setor que esteja envolvido no combate a pandemia, ainda mais sem possibilidade de recurso a essa decisão”, disse. 

Renda básica emergencial

O plenário também julgou referendo em liminar na ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO) 56, ajuizada pela Rede Sustentabilidade. Na ação, o partido alegou haver “omissão inconstitucional e consequente mora legislativa” dos presidentes da República, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal na instituição de renda mínima temporária durante a crise socioeconômica ocasionada pela pandemia ligada ao novo coronavírus. Por maioria, os ministros entenderam que a ação foi prejudicada por perda de objeto.

O relator, ministro Marco Aurélio Mello, havia negado o seguimento da ação por entender que a ADO não é instrumento cabível para sanar esse tipo de demanda. O ministro reiterou seu voto no plenário.

O ministro Edson Fachin abriu a divergência e entendeu que a ação seria cabível, mas que perdeu o objeto para concessão de liminar, já que após o ajuizamento, o presidente Jair Bolsonaro instituiu o Benefício Emergencial por meio da MP 936. Ainda assim, votou pelo prosseguimento da ação para que o plenário pudesse julgar, no futuro, o mérito do pedido relativo a criação de uma renda básica.

O ministro Luís Roberto Barroso, por sua vez, entendeu que a ação é cabível, mas que perdeu o objeto por superveniência da MP 936. Barroso foi acompanhado por Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Dias Toffoli. Assim, seu voto foi vencedor e o ministro ficou como redator para o acórdão.

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