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Desafios para a efetiva implementação da AIR no Brasil

Regular de maneira inadequada tem custado caro ao país

Poder legislativo agências reguladoras federação
Prédio do Congresso Nacional. Crédito: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Nunca se ouviu falar tanto em regulação quanto nos últimos anos no Brasil. O tema, que há duas décadas se restringia ao campo das agências reguladoras e era visto com uma dimensão restrita, ganhou força e corpo na ordem política e jurídica nacional. A razão por trás do frenesi em se discutir regulação é simples: regular de maneira inadequada tem custado caro ao país. Com base em dados de 2019, estima-se que o custo da ineficiência regulatória, anualmente, está na ordem de R$ 160 bilhões a R$ 200 bilhões, segundo apurado à época pela Secretaria Especial de Produtividade e Competitividade e divulgado em 2022[1].

A qualidade da regulação ganhou tração em 2017. Não por conta de uma norma, mas pela publicação das diretrizes gerais de análise de impacto regulatório (AIR), publicadas pela Casa Civil[2]. O documento, apesar de não vinculante, começou a consolidar no imaginário regulatório a necessidade de racionalizar a tomada de decisão, por meio de um processo baseado em evidências.

Em 2019, vieram as primeiras normas contendo a obrigatoriedade de AIR, em âmbito federal – a Lei de Liberdade Econômica (Lei 13.874/19) e a Lei das Agências Reguladoras (Lei 13.848/19). O decreto da AIR veio em 2020: generalista, com exceções autorizadas e de linguagem vaga. A verdade é que o decreto não teve o fôlego nem o conteúdo necessário para dar apoio a órgãos e entidades federais para implementação da AIR. Têm sido necessárias iniciativas setoriais, específicas e de capacitação das instituições para que o processo efetivamente vire rotina.

Em análise do Tribunal de Contas da União (TCU)[3] quanto à implementação do decreto, o diagnóstico foi que esta se desenrolou de maneira desordenada e sem coordenação do governo federal. Os números da consulta do TCU falam por si: 68% das instituições consultadas entendem que não houve qualquer apoio; 75% entendem que não possui pessoal qualificado para conduzir uma AIR; e 69% entendem não possuir dados ou informações necessárias para realização do processo.

O cenário identificado não é diferente daquele narrado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), na última revisão de política regulatória do Brasil, de junho de 2022[4]. As recomendações da OCDE foram no sentido de definir claramente as funções de supervisão regulatória em um único órgão, com a governança adequada e definir mecanismos claros de coordenação. A diretriz foi para construir uma política nacional consolidando efetivamente boas práticas regulatórias.

Como resposta, sobreveio o Plano Nacional de Política Regulatória, publicado no apagar das luzes de 2022, após realização de tomada pública de subsídios pela Secretaria de Acompanhamento Econômico[5]. A intenção do Plano, apesar de positiva, peca ao não endereçar de maneira mais direta os problemas institucionais de ordem prática para um avanço na condução de AIRs. É mencionada a criação de um “Programa de Consultoria Técnica”, mas pouco é desenvolvido acerca de seu conteúdo, por exemplo.

Pela fotografia trazida pelo TCU, será preciso – e muito – investir em capacitação contínua do quadro de pessoal das instituições. Mais que aprender a realizar AIR, será preciso entender os limites e possibilidades de cada setor quanto à coleta e à análise de dados. Guias, documentos, relatório de AIR publicados já se encontram disponíveis para acesso. Mas de nada adianta existir informação produzida, mas não ser possível aplicar o conhecimento na rotina administrativa.

Mais que novos planos, documentos e políticas, é preciso investir em conhecimento institucional e no aprendizado mão na massa do gestor. Para melhorar a qualidade da regulação, é preciso fazer AIR. Para conduzir AIR, é preciso evidências. São para tais desafios que as lentes do governo devem estar voltadas, investindo em potenciais parcerias, projetos-piloto e programas de capacitação contínuos para tornar a AIR rotina no Brasil.


[1] Dados disponíveis em: https://www.gov.br/economia/pt-br/acesso-a-informacao/reg/arquivos/tomada-de-subsidio-01-2022-v11.pdf

[2] Em 2017, publicamos no JOTA um artigo sobre as diretrizes gerais de análise de impacto regulatório, da Casa Civil.

[3] TCU. Acórdão nº 2325/2022 (Plenário). Rel. Min. Vital do Rêgo. Processo TC nº 033.944/2020-2.

[4] OECD Reviews of Regulatory Reform. Regulatory Reform in Brazil. Disponível em: https://www.oecd-ilibrary.org/governance/regulatory-reform-in-brazil_d81c15d7-en

[5] Disponível em: https://www.gov.br/economia/pt-br/acesso-a-informacao/reg/plano-nacional-de-politica-regulatoria/plano-nacional-de-politica-regulatoria_21122022.pdf