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Coronavírus e atraso farmacêutico

Fast-track regulatório e ponderação de riscos em tempos de pandemia

Anvisa aprovou os primeiros oito testes rápidos para o diagnóstico de Covid-19. Foto: Josué Mamacena/Fiocruz

Nos Estados Unidos, os primeiros testes em humanos para o desenvolvimento de uma vacina contra o novo coronavírus começaram no último dia 15 de março. Os estudos, realizados por um laboratório privado em parceria com a National Institute of Health, agência responsável por pesquisas em saúde pública, estão progredindo em velocidade recorde. Há notícia de que a fase de teste em animais, usualmente exigida antes da utilização de cobaias humanas, foi dispensada em um esforço de acelerar o processo.

A Coréia do Sul, por sua vez, tem sido elogiada pela celeridade na produção, em larga escala, de kits para diagnósticos rápidos do coronavírus. Criados por uma empresa de biotecnologia, os testes foram aprovados pelas autoridades sanitárias sul-coreanas em cerca de uma semana, enquanto o tempo médio necessário para o registro de produtos semelhantes no país costuma ser de um ano e meio. A celeridade permitiu que até hoje mais de 230 mil pessoas tenham sido testadas no país.

Os casos acima demonstram uma tendência das autoridades sanitárias de reduzir o rigor no controle do lançamento de vacinas e meios de diagnóstico que prometem combater uma das piores pandemias de que se tem notícia na história recente da humanidade. Qual a lógica, porém, que está por trás desta flexibilização regulatória?

Lançamentos farmacêuticos são submetidos a uma rígida regulação em todo o mundo. As nações costumam impor uma série de procedimentos complexos e morosos até que eles possam ingressar no mercado. Embora tenha encurtado nas últimas décadas, o prazo médio de desenvolvimento e aprovação de uma nova vacina nos Estados Unidos é estimado entre dez e quinze anos.

E é natural que assim o seja. Novidades na área da saúde envolvem sérias incertezas a respeito de sua eficácia e, mais importante, de sua segurança para o consumo humano. Não faltam exemplos de graves efeitos colaterais não antecipados pelas autoridades regulatórias. O caso da Talidomida e, mais recentemente, de remédios para emagrecimento demonstram o perigo.

Ocorre que o rigor na regulação de novos medicamentos obedece a uma ponderação de riscos. De um lado, sua aprovação célere aumenta a probabilidade de que consequências indesejadas não sejam previamente identificadas pelo regulador. De outro, restrições severas reduzem a velocidade do processo e podem causar a morte de pacientes que precisam do tratamento ou do diagnóstico e não têm condições de esperar.

O rigor regulatório das autoridades sanitárias, diante dessa ponderação de riscos, não pode ser estanque. Ele deve se adaptar, entre outros fatores, à gravidade e potencial transmissibilidade da doença que visa a combater. Os riscos são inevitáveis, de um lado e de outro. A demora tende a reduzir os malefícios decorrentes do medicamento, mas o atraso farmacêutico pode originar consequências tão ou mais catastróficas.

Embora não se possa renunciar a exames mínimos de eficácia e segurança, em caso de enfermidades severas ou altamente contagiosas, como o caso do atual coronavírus, o tempo ótimo do controle regulatório é reduzido e produtos que pretendam combatê-las merecem um fast-track regulatório.

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