
Ao Tribunal de Contas da União (TCU) compete realizar controle de legalidade dos valores pagos pela administração pública em decorrência dos contratos que celebra. Eventual conclusão pela existência de débito — isto é, pela ilegalidade de despesa — pode ensejar a aplicação de sanções aos responsáveis e sua condenação ao pagamento de dívida.
Mas como avaliar se valores despendidos pelo poder público por meio de contratos são corretos? Como aferir a existência de sobrepreço?
O acórdão 1267/2019-Plenário, rel. Min. Aroldo Cedraz, ajuda a entender o método que o TCU utiliza com frequência para analisar a juridicidade de preços nas contratações públicas.
O caso envolveu a apreciação de recursos de reconsideração contra acórdão do TCU que constatara sobrepreço em contrato de obra.
Antes de decidir se seria o caso de manter ou revisar as condenações anteriores, o relator fixou a premissa de que a análise de sobrepreço teria que “partir de uma referência”. Nas suas palavras, a adoção de referencial de preço permitiria, “ao se comparar orçamentos, verificar a existência de preços inexequíveis, subpreços e, também, sobrepreços”. Seriam “de mercado” apenas os valores que correspondessem aos de referência.
Para avaliar se os valores do orçamento da administração e da proposta vencedora corresponderiam aos “de mercado” — ou se teriam sido super ou subdimensionados — o Tribunal se valeu do Sistema de Custos Referenciais de Obras (Sicro 1).
O TCU reconheceu que, à época da contratação (1996), não havia a “obrigação legal de se considerarem os custos do sistema Sicro como limite máximo nas contratações de obras rodoviárias — o que veio a se firmar a partir da edição da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2009”. Contudo, isso não diminuiria “sua legitimidade como ferramenta adequada para verificação dos preços de mercado”.
Para o TCU, a admissão de “custo maior” no âmbito da Administração Pública — ou seja, superior ao “de mercado”, aferido pelo Sicro — imporia ao gestor “apresentar justificativas técnicas razoáveis em face dos princípios da economicidade e da eficiência, o que não foi feito no presente caso”. Assim, “tendo em vista os valores pagos não coincidirem com o valor de mercado da época”, concluiu que a administração teria sido indevidamente onerada.
A ratio decidendi é problemática, pois, mesmo nos casos em que o Sicro não era referência obrigatória, será presumido o sobrepreço se a administração não convencer o TCU de que havia motivos para superar os valores do Sicro.
O TCU é órgão de controle peculiar. Tem iniciativa, realiza investigações, segue ritos processuais próprios e julga. Cabe-lhe o ônus de demonstrar o porquê considera como excessivos os valores da administração e da proposta vencedora. Não há fundamento técnico para, sem base em lei, adotar a presunção de que é excessivo o que discrepe de uma tabela que venha a adotar a seu critério.
A mera afirmação, pelo TCU, de que o poder público não foi capaz de justificar a razão pela qual seus preços superaram os de tabela de referência a que não estava obrigado a observar é argumento insuficiente para condenar por sobrepreço. Afinal, só se pode constituir débito mediante a constatação de despesa ilícita.