“O Executivo mandar no orçamento é coisa de 2002. Nós estamos em 2022”, sentenciou um expoente do centrão dias após o revés na tentativa de tornar impositivo o pagamento das emendas de relator, na lei que traz as diretrizes do orçamento de 2023. Se política é ocupação de espaço, as projeções do bloco fisiológico no Congresso de que sairá ainda mais fortalecido das urnas em outubro alimentam a narrativa de que a obrigatoriedade dos pagamentos bilionários seria um caminho natural. Impositivo por natureza naquilo que o centrão oferece como ninguém em Brasília: criar dificuldades para vender facilidades.
A arquitetura traçada pelos operadores políticos estima um percentual baixo de renovação parlamentar, com menos de 40%. No caso da Câmara, o cálculo limita a bancada da oposição a até 150 deputados, o que preservaria o perfil majoritário de centro-direita na Casa. Portanto, se o script der certo, a aposta do centrão é que, sem a liberação dos recursos, o próximo governo teria mais dificuldade para impor a própria agenda.
A menos que o Supremo Tribunal Federal atravesse os planos, o prognóstico assusta até mesmo ministros bolsonaristas que admitem que o Congresso foi longe demais no apoderamento do orçamento público, asfixiando até a execução de despesas básicas dos ministérios. No caso do ex-presidente Lula, o esforço é pela formação de um eixo de governabilidade independentemente da adesão das principais siglas do centrão. O plano ideal, além das legendas de esquerda, inclui MDB, PSD e União Brasil.
A partida preliminar legislativa do jogo petista começou a ser jogada no Senado. Foi o PSD do presidente Rodrigo Pacheco quem liderou a ofensiva pela retirada da impositividade, diante da pressão pública com as declarações do senador Marcos do Val (Podemos-ES) de que teria recebido R$ 50 milhões em emendas pelo voto favorável ao político mineiro para a presidência do Senado. Já o MDB é quem terá a palavra final na elaboração do orçamento de 2023, relatado pelo senador Marcelo Castro, adversário de Ciro Nogueira (PP) no Piauí.
As peças estão na mesa, mas a regra do jogo vai depender do Brasil que acontecer daqui até outubro. Há um terceiro turno pela disputa do orçamento à espera do que restar de país depois do esgarçamento institucional que se agrava a cada contestação de Jair Bolsonaro sobre as urnas eletrônicas.
Se superar a crise entre Poderes, o próximo presidente terá que concentrar força na árdua tarefa de retomar o controle do orçamento dialogando com os atuais deputados e senadores que serão os responsáveis pela aprovação da peça financeira que será utilizada no primeiro ano da futura gestão. Tudo isso vai ocorrer em meio às articulações pela presidência das duas Casas, em que a negociação por apoio ainda segue o roteiro denunciado publicamente pelo senador Marcos do Val ao jornal O Estado de S. Paulo. Aliás, parte dos R$ 11 bilhões em emendas de relator controladas, na prática, pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), foram estrategicamente preservadas para serem liberadas depois que o país atravessar a eleição.