Em 2002, a escolha do empresário e ex-senador José Alencar para a vice de Lula selou a aliança do PT com o PL de Valdemar da Costa Neto. Mais do que acenar ao pragmatismo, a decisão era a vitória da tese de que, para enfraquecer a dependência no Congresso de legendas tradicionais, como o MDB, seria preciso buscar uma coalizão com siglas de menor relevância programática. O curso da história revelou que a estratégia estimulou a fragmentação partidária, resultando no fortalecimento do centrão, hoje protagonista no rumo do orçamento do governo.
Vinte anos depois, o PT busca reinventar a rota para obter governabilidade em uma eventual gestão. É, entre outros simbolismos, para essa direção que aponta a escolha do ex-tucano Geraldo Alckmin na chapa. Ou, como sintetizou um petista, a busca pela “persuasão, não cooptação”. Sem fatias volumosas de dinheiro em forma de emendas parlamentares para endereçar às bases ao longo do mandato de Jair Bolsonaro, restou a aposta de que “lula com chuchu” será o cardápio mais nutritivo que se pode oferecer para derrotar o atual ocupante do Planalto.
Colabora para o figurino de frente ampla a inviabilidade de uma alternativa que fuja da polarização. O pessimismo com uma mudança de cenário na chamada terceira via também fortalece a avaliação de operadores políticos experimentados de que piscar para Lula-Alckmin, ainda no primeiro turno, poderia garantir ao menos às legendas tradicionais de centro a preservação de sua força política nacional, a despeito da convicção de que a eleição de uma numerosa bancada federal ficará prejudicada, diante da força do centrão.
O mote de reconciliação nacional a partir de dois velhos personagens da cena política até então em polos antagônicos decidiu começar a testar força por Minas Gerais, primeiro destino de Lula após o anúncio oficial da pré-candidatura. Apesar do flerte com Gilberto Kassab, um impasse na disputa para o Senado tem distanciado o PT do palanque do pré-candidato do PSD ao governo mineiro, Alexandre Kalil.
A legenda centrista quer implodir os planos do petista Reginaldo Lopes, líder da bancada na Câmara, de concorrer na chapa ao Senado para garantir a reeleição do senador Alexandre Silveira (PSD-MG), que é braço direito do presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A boa interlocução de Silveira com Bolsonaro rendeu, no início do ano, um convite para assumir a liderança do governo na Casa. Ciente de que estava inclinado a aceitar, a direção do partido atravessou os planos.
Como o eleitor mineiro não costuma colocar os dois pés na mesma canoa, a exemplo dos votos cruzados em petistas e tucanos que predominaram em outras eleições, como “Lulécio” (2002) e “Dilmasia” (2010), cresce no PT a aposta no “Luzema” em outubro.
Ao contrário das legendas de centro mais programáticas, o PSD espera sair fortalecido das urnas, e pode ser um aliado importante nos planos de Lula em reduzir a dependência do centrão no Congresso. É nesse sentido que a importância do desfecho no palanque regional se impõe.
Até porque o desempenho dos candidatos no segundo maior colégio eleitoral do país costuma servir de bússola para antecipar quem será o próximo presidente da República. E como ensinou Tancredo Neves, a esperteza, quando é muita, come o dono.