Defesa do consumidor

Procons: fim ou recomeço?

Quem sabe ameaça do fim possa impulsionar mudança e, com esta, surja melhora do importante serviço que desempenham

Foto: Paulo H. Carvalho/Agência Brasília

Se você, consumidor como eu, nunca foi, ligou ou pediu algo ao Procon de sua cidade, bem-vindo ao time. Esse texto pode lhe interessar. Não somos poucos e o número de nossos integrantes cresce cada vez mais.

O que cresce também é o gasto com os Procons. O do DF – vou falar do DF, pois moro aqui –, só no primeiro semestre do ano de 2020, teve uma despesa de R$ 5.175.159,42[1], embora, pareça-me, as variáveis em questão (número de usuários diminuindo x despesa com o prestador do serviço – Procon) devessem ser inversamente proporcionais.

Mas não é sobre despesa pública que quero falar. É sobre o futuro dos Procons: fim ou oportunidade de um novo começo?

É verdade que o órgão tem suas funções, importantes, registre-se, para além das demandas individuais, como fiscalização, informação, criação e estímulo de programas voltados à defesa do consumidor. Ocorre que, no fim, a tentativa do Procon, o símbolo de sua existência, é ajudar o consumidor, a nós consumidores.

Só que nós, em relação às nossas pequenas causas, acabamos dando nosso jeito de resolver o problema. Tentamos reclamar com o fornecedor uma primeira vez e, quando não é a consciência deste, quase sempre acabamos nos juizados especiais de todo jeito. Não poucas vezes, então, como tudo vai desembocar lá, na justiça, cortamos caminho e vamos direto aos juizados, sem Procon mesmo.

É por isso que há, parece-me, um campo muito importante para atuação dos Procons, que, se reformulados, poderiam ser uma verdadeira mão na roda para nós consumidores, o que justificaria ainda mais os dispêndios financeiros para sua existência. Estou falando da resolução online de conflitos.

Por muitos ainda desconhecida, a ferramenta do governo federal hospedada no site consumidor.gov.br está dando o que falar entre os fornecedores e consumidores. Baseada em algumas fases da tecnicamente nominada de resolução online de conflitos, o site possibilita a comunicação direta entre os consumidores e as empresas participantes. Estas, ao aderirem ao programa do site, comprometem-se a receber, analisar e responder as reclamações de seus consumidores em até 10 dias.

É simples mesmo, funciona e facilita nossa vida: não precisamos sair de casa para reclamar, o que, em épocas de pandemia, julgo ser bastante importante; além disso, não ficamos horas em uma chamada telefônica falando com inúmeros robozinhos, até educados por sinal, mas que, ao final, desligam na nossa cara, ou não resolvem o nosso problema, ou utilizam largo espaço de nosso tempo até passar a chamada para um atendente que possamos chamar de irmão, um humano; como irmão que é, nem sempre esse atendente está com aquele bom humor acima da média, que, também, às vezes, irrita ainda mais quem já está irritado do outro lado da linha com o tempo gasto para resolver um problema que nem deveria existir.

São infinitas as conjecturas, mas, creio, entenderam o que eu quis dizer: basta entrar no site, registrar a reclamação, esperar e, ao final, você ainda pode avaliar o fornecedor, que é observado pelo grande olho do governo, no caso, o federal. Isso dá segurança ao consumidor. O problema é que nem todas as empresas querem participar.

A ferramenta é meio que um up date, uma atualização, de algo que, em alguns países, funciona mais que aqui e acaba por reduzir as demandas judiciais: os chamados métodos alternativos de resolução de conflitos, alternativos por não precisarem do Poder Judiciário (a conciliação, a mediação e a arbitragem, são exemplos desses métodos alternativos).

Aqui no Brasil ainda não colou muito. A partir do momento que se “onliniza” as alternativas de resolução de conflitos fora do judiciário, a chance de ser uma ideia em franca ascensão é grande. E o motivo é óbvio: a facilidade.

Somos hiperconectados, jovens ou não. Além do mais, nada melhor que você resolver sua própria pendenga com o seu fornecedor ou prestador de serviço, ao invés de entregar para um sujeito externo, a sua excelência senhor juiz, o poder de decidir. Sem contar que a decisão deste senhor, não poucas vezes, desagrada gregos e troianos.

A resolução consensual de conflitos, agregada à característica online, é um grande facilitador e informador. Isso porque maximiza a autonomia do consumidor, que passa a se sentir mais empoderado em suas decisões; ademais, o consumidor pode ter acesso direto a mais conhecimento sobre seus direitos e, ainda, pode resolver rapidamente seus conflitos, sem precisar aguardar cinco meses para a primeira audiência judicial, a de conciliação.

Do outro lado, o do fornecedor, as ferramentas de resolução consensual não são ruins também. É uma oportunidade para este mostrar que está disposto a resolver os problemas e erros que fazem parte do empreender – afinal, vivemos errando em nossas vidas também, e o importante é aprender.

Eu me sentiria mais tranquilo em contratar com alguém assim, responsável. Além disso, resolvido o problema, os custos com a contratação de aparatos jurídicos pode reduzir muito a despesa que a empresa teria, caso tivesse de enfrentar um processo judicial.

Isso sem contar o fato de que, quem é sério mesmo, prefere saber logo do problema, pois, sabendo, poderá resolvê-lo de imediato e evitar que este se propague a outros consumidores.

Voltemos aos Procons. Depois de tudo o que disse, o leitor deve estar se perguntando: mas por que o Procon-DF ainda não instalou essa ferramenta, esse tal de online dispute resolution? – em inglês para ficar mais chique.

Eu também não sei e é por isso que resolvi escrever. Saber da iniciativa federal eles sabe, pois no site do Procon-DF eles dizem: “o registro de reclamação no Procon-DF é realizado de forma presencial”, mas você pode ir no site do governo federal, o consumidor.gov, para registrar também[2], se a empresa tiver aderido ao programa, claro.

Como assim a reclamação é registrada apenas de forma presencial? Aqui, se não fosse um artigo, colocaria aquele emoction com carinha de quem não entendeu nada.

Seja como for, quem sabe a ameaça do fim, um tanto trágica é verdade, possa impulsionar os Procons à mudança e, com esta, surja a melhora do importante serviço que desempenham.

Só fica uma última dica final: se a Constituição Federal permite que os estados, assim como o DF, legislem sobre o consumo, pode ser que seja a hora de inovarmos o ordenamento jurídico, isto é, de fazer uma lei nova – sim, gostamos muito de uma lei, mas que essa seja efetiva! – para determinar a criação dessa forma online de resolução de conflitos aqui no DF e, ainda, quem sabe, aproveitar para dizer nessa lei que todas as empresas registradas no DF precisam estar cadastradas nesse sistema.

Quem sabe… Tudo isso resolvível #decasa.

 


[1] Cf. http://www.transparencia.df.gov.br/#/despesas/orgao

[2] Cf. https://www.procon.df.gov.br/para-registrar-reclamacao/

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