Tributação

Efeitos da decisão que suspendeu a redução das contribuições ao Sistema S

Questões processuais que circundam o caso, especialmente sobre a abrangência da decisão: nacional ou local

Crédito: Divulgação Fecomércio RS

Como não é novidade para ninguém, desde o início deste ano, o mundo está vivenciando uma grave crise socioeconômica, por conta da pandemia de Covid-19, que surgiu na China e, após cerca de 04 (quatro) meses, alcançou todos os países e tem devastado suas sociedades e economias.

No Brasil, os primeiros casos da doença começaram a surgir no final de fevereiro e, em 20 de março, o Governo Federal[1] decretou estado de calamidade pública e, com isso, apenas as atividades essenciais estão em funcionamento e a população – em sua maior parte – está confinada em suas casas, conforme orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS).

Para o sistema de saúde, a situação é catastrófica, já que, considerando a rápida disseminação da doença e das graves consequências aos pacientes infectados, os hospitais rapidamente estão chegando à sua capacidade máxima.

Por outro lado, a crise também tem tornado a situação das empresas bastante crítica, o que motivou o Governo a editar diversas medidas tributárias, com a finalidade auxiliar as empresas nesse momento tão delicado.

Em 31 de março de 2020, o Governo Federal editou a Medida Provisória 932, que reduziu temporariamente (até 30 de junho deste ano) as alíquotas das Contribuições aos serviços sociais autônomos (Sistema S) em 50% (cinquenta por cento), o que, apesar de não resolver a situação das empresas, já representa uma redução dos dispêndios mensais.

Ocorre que, no último dia 8 de maio de 2020, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), por meio de decisão liminar, suspendeu os efeitos da referida Medida Provisória 932/20.

Desde então, muito se tem discutido acerca da abrangência de tal decisão, especialmente por estarmos próximos ao dia 20, data de vencimento das referidas Contribuições.

A decisão foi proferida em medida judicial proposta pelo Sesc e Senac do Distrito Federal, com o objetivo de declarar a inconstitucionalidade da Medida Provisória 932/20, sob a argumentação de que teria havido desvio de finalidade, já que a Medida foi editada em meio à atual crise, além de retrocesso social, já que tal Medida traria impactos severos, por exemplo, ao ano letivo das escolas do Senac.

O objetivo do presente artigo não é tratar sobre o mérito da questão, mas sim sobre as questões processuais que circundam o caso, especialmente em relação à abrangência da decisão liminar: nacional ou local.

A Constituição Federal determina[2] que as ações coletivas ajuizadas contra a União na Seção Judiciária do Distrito Federal têm abrangência nacional, isto é, os seus efeitos não ficam restritos, nesse caso, aos limites territoriais da ação.

As instituições que integram o chamado Sistema S, dentre as quais o Senac e o Sesc, são serviços sociais autônomos, vinculados a entidades sindicais patronais, patrocinadas por recursos recolhidos do próprio setor produtivo beneficiado, e, conforme já sedimentado pelo Supremo Tribunal Federal[3], têm natureza de pessoa jurídica de direito privado.

Ou seja, apesar de tais instituições serem administradas e patrocinadas por entidades de classe e organizações sindicais, não adquirem a sua natureza.

Contudo, a Constituição Federal[4] autoriza apenas as organizações sindicais, entidades de classe ou associações a demandar em nome de seus membros ou associados.

Conclusão: o Sesc/DF e o Senac/DF não têm legitimidade processual para ajuizar qualquer medida judicial em nome das demais unidades da Federação.

Aliás, tanto é assim que os Regimentos Internos de tais instituições[5] são claros no sentido de que as administrações regionais somente podem atuar na jurisdição no estado federativo correspondente.

Não temos dúvidas, pois, de que o Sesc/DF e o Senac/DF carecem de legitimidade processual para demandar em nome das demais unidades da Federação, de modo que a liminar deferida pelo TRF1 tem efeitos limitados ao Distrito Federal.

Para além da questão da legitimidade processual, destacamos que o meio processual adotado pelo Sesc/DF e Senac/DF também não foi o mais acertado.

Isso porque, como comentamos linhas atrás, o pedido da inicial é bastante genérico e tem por objetivo declarar a inconstitucionalidade da MP 932/20, o que, como sabemos, não pode se dar por meio de controle difuso de constitucionalidade (aquele em que há análise de caso concreto pelo juiz).

Isto é, a discussão acerca da constitucionalidade de lei em tese – o que nos parece aplicar à presente discussão – deve se dar por meio de controle concentrado, cujo controle é exclusivo do Tribunal do Pleno do Supremo Tribunal Federal.

Ou seja, também em razão da via processual eleita (controle difuso de constitucionalidade), a liminar concedida pelo TRF1 não tem efeitos erga omnes, isto é, apenas as partes processuais é que estão vinculadas a essa determinação judicial (de um lado, Sesc/DF e Senac/DF e, de outro lado, a União).

De todo modo, não podemos nos esquecer de que, logo após a edição da MP, a Confederação Nacional dos Transportes (CNT) ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6373, distribuída para a relatoria do ministro Ricardo Lewandowski, com o objetivo de declarar a inconstitucionalidade de redução das alíquotas em relação ao Sest Senats.

Nesse caso, em uma análise preliminar, entendemos que, aí sim, há legitimidade processual para demandar em nome de seus membros e, além disso, optou-se pela via processual adequada (controle concentrado de inconstitucionalidade).

Mas, também nesse caso, apenas se está discutindo a Contribuição ao Sest Senat, permanecendo fora da discussão as demais instituições do Sistema S (Senai, Sesi, Sebrae, Senar, Sesc, Senac e Sescoop), de modo que, se já não bastassem as dificuldades decorrentes da atual crise, os contribuintes ainda vão ter que ter atenção redobrada em relação a quais alíquotas estão efetivamente reduzidas.

 


[1] Decreto Legislativo nº 06, de 20 de março de 2020.

[2] Constituição Federal, artigo 109, § 2º.

[3] STF, RE n.º 789.874/DF, Tribunal Pleno, rel. Ministro Teori Zavaski, j. 17/09/2014, UPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RE 789.874.  Min. Rel. Teori Zavaski, julgado em 17/09/2014, disponibilizado no DJ 18/11/2014.

[4] Constituição Federal, artigo 5º, LXX.

[5] Senac/DF. Disponível em: <https://www.df.senac.br/institucional/>.

Sesc/DF. Disponível em: <https://sescdf.com.br/institucional/>.

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