A regra constitucional é clara. O artigo 155, parágrafo 1°, inciso III, da Constituição Federal, demanda a existência de lei complementar federal para que os Estados possam cobrar o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) sobre doações e heranças instituídas no exterior.
Apesar do texto constitucional ser expresso ao exigir regulamentação da matéria mediante edição de lei complementar federal, a grande maioria dos estados, por meio de normas estaduais ordinárias, insistia na cobrança do ITCMD sobre as heranças e doações de bens situados no exterior.
E como já era esperado, o poder judiciário tem sido incansavelmente acionado pelos contribuintes para que o direito violado fosse reconhecido. E funcionou. Em fevereiro de 2021, depois de muita espera e reiteradas controvérsias sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os estados não detinham competência para cobrar o ITCMD sobre doações ou bens heranças provenientes do exterior enquanto não houvesse lei complementar autorizando tal cobrança. Esse entendimento foi firmado no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) nº 851.108/SP, com regime de repercussão geral reconhecida sob o Tema 825.
Em um novo capítulo desse mesmo tema, ao julgar Ações Diretas de Inconstitucionalidade ajuizadas pela Procuradoria-Geral da República contra dispositivos de leis estaduais e aplicar o precedente firmado no julgamento do RE nº 851.108/SP, o STF reafirmou o seu entendimento de que o ITCMD, nas doações e heranças provenientes do exterior, não pode ser regulamentado pelos Estados diante da inexistência de lei complementar federal sobre a matéria.
Por motivos necessários de segurança jurídica e de uniformização de entendimento, a Suprema Corte modulou os efeitos da sua última decisão para que tenha eficácia a partir da data do acórdão proferido no âmbito do julgamento do RE nº 851.108, publicado em 20 de abril de 2021. Em termos práticos, essa data foi considerada como marco inicial para produção dos efeitos das decisões que declararam inconstitucionais as leis estaduais que previam a incidência do ITCMD sobre as heranças e doações de bens situados no exterior. Ou seja, a partir desse marco não há cobrança ITCMD sobre doações e heranças advindas do exterior no sistema tributário brasileiro.
Apesar da notória vitória dos contribuintes, é uma questão de tempo até que uma lei de abrangência nacional sobre a matéria seja editada pelo Congresso Nacional. Até porque o STF adicionou um novo capítulo ao tema ao julgar, no dia 03 de junho de 2022, procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) nº 67 proposta pela Procuradoria Geral da República. Em resumo, foi estipulado ao Congresso Nacional o prazo de 12 meses para adotar as medidas legislativas necessárias para regulamentar a cobrança do ITCMD em questão.
No entanto, até que uma lei estabelecendo as regras para a cobrança do ITCMD sobre doações e heranças de bens no exterior seja editada, há uma janela de oportunidade, que deverá ser analisada e aproveitada pelos contribuintes, ainda mais diante da segurança jurídica existente.
O momento exato da regulamentação da matéria é incerto, mas essa janela poderá se fechar em breve. É muito provável que a pressão dos estados no Congresso Nacional já tenha começado, ainda mais pelo cenário de crise fortemente agravado nos últimos anos.