Aconteceu novamente. Primeiro foi com Dilma Rousseff, agora foi com Bolsonaro. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reconhece que houve irregularidades, ilícitos nas campanhas eleitorais, mas não avança para cassar o mandato do presidente da República – por uma soma de razões jurídicas e razão políticas.
Agora, no caso Bolsonaro-Mourão, a razão alegada objetivamente é a falta de provas do envio em massa de mensagens de Whatsapp patrocinadas por empresas com o intuito de desequilibrar as eleições. E politicamente ninguém no TSE imaginava possível cassar um presidente a apenas um ano das eleições.
O tribunal, por unanimidade, rejeitou o pedido de cassação da chapa Bolsonaro nesta quinta-feira. Pedido que foi feito pelo adversário Fernando Haddad e sua coligação logo depois das eleições. Mas os ministros, a despeito da absolvição, quiseram mandar recados, quase em tom de ameaça, para Bolsonaro e demais candidatos.
O ministro Alexandre de Moraes foi o mais enfático ao dizer que “todo mundo sabe o que ocorreu” e que o TSE não vai permitir que isso ocorra novamente em 2022: “Se houver repetição do que foi feito em 2018, o registro será cassado e as pessoas que assim fizerem irão para a cadeia por atentarem contra as eleições e contra a democracia no Brasil”.
O ministro Edson Fachin, próximo presidente do TSE, disse que o julgamento tinha um efeito prospectivo. Servia de alerta para os candidatos em 2022. “A Justiça Eleitoral está preparada paras os desafios do futuro que se avizinha”, ele disse. Reconheceu o “descompasso” (palavra que usou) entre a tecnologia e os instrumentos de que dispõe a Justiça. “Entretanto, isso não significa que eventuais condutas se que valem desse descompasso estão além do campo de atuação do Poder Judiciário”.
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O ministro Luís Felipe Salomão, relator das ações, visou criar uma tese jurídica objetiva para que o TSE possa aplicar nas eleições de 2022 e em diante. A proposta, que foi aprovada, prevê a aplicação das sanções para aqueles candidatos que promoverem suas campanhas usando Whatsapp, Telegram, etc para realizar ataques aos adversários e disseminação de notícias falsas.
Mas a despeito de todos os recados, da união institucional do TSE contra esse tipo de prática, fica a pergunta diante da própria decisão da Corte Eleitoral: como provar que o ilícito aconteceu? O tribunal reconheceu como fato notório que o WhatsApp foi utilizado na campanha de Bolsonaro para disseminar fake news, mas nem o PT, nem a imprensa, nem a Polícia Federal foram capazes de produzir as provas necessárias. A dificuldade de hoje, portanto, será a mesma de 2022. A despeito de todo e qualquer recado enfático do TSE.
O TSE, de fato, tenta cercar a campanha de 2022. O tribunal não quer repetir o erro de 2018, reconhecido pelos próprios ministros, de assistir passivamente às campanhas feitas pelas redes sociais. Por isso, o TSE foi se atualizando e preparando instrumentos para aplicar em 2022.
O inquérito das fake news no Supremo e a investigação contra os ataques promovidos por Bolsonaro às urnas no TSE servirão de ferramentas mais céleres de atuação. O TSE de 2022 não é mais o mesmo TSE que ignorava as redes em 2018. Mas as campanhas eleitorais também serão diferentes. Também se aperfeiçoaram. A tecnologia sempre abre espaço para outros meios. As plataformas de redes sociais e de envio de mensagens não dão ao TSE as respostas que este desejaria – com retirada imediata de conteúdos falsos, ataques a adversários e instituições, nem armazenam mensagens que depois poderiam servir de provas.
Além do que, em 2022, haverá um desafio adicional. Bolsonaro estará no cargo e se valendo dele durante a campanha. O TSE tem jurisprudência numerosa sobre o abuso do poder político e econômico de quem se vale de sua posição para se reeleger. Mas, numa campanha curta, o prejuízo pode não ser remediado.
O TSE busca, verdadeiramente, fechar as portas para os abusos cometidos no passado. Mas as promessas podem não se realizar. Pelos próprios limites da Justiça Eleitoral. Em 2018, antes das eleições, o então presidente do TSE, Luiz Fux, disse que o tribunal não ia tolerar a proliferação de fake news. Todos sabem o que aconteceu em 2018.
Agora, depois de absolver a campanha de Bolsonaro, o tribunal cassou um deputado estadual que fez uma live para atacar a legitimidade das eleições – algo que Bolsonaro fez insistentemente nos últimos anos. Ou seja, o TSE e também o STF vêm tirando do ar bolsonaristas – cassando mandatos de figuras periféricas, determinando a retirada de perfis do ar, prendendo apoiadores, como Roberto Jefferson e Daniel Silveira. Bolsonaro, no entanto, ainda permanece intocado.