A mobilização dos servidores por reajuste salarial neste ano feita hoje não foi suficiente para alterar a situação das ainda praticamente inexistentes negociações entre as categorias do funcionalismo e o governo federal. O movimento presencial foi fraco, embora seja necessário dizer que os servidores foram muito bem sucedidos em atrair a atenção da mídia, o que impõe atenção ao Executivo e à classe política em ano eleitoral.
A área econômica acompanhou o movimento de longe e não se manifestou oficialmente. Nos bastidores, a visão é de que o movimento teve adesão muito baixa e não altera em nada o cenário, que está totalmente atrelado às futuras avaliações e movimentações políticas que serão feitas pelo presidente Jair Bolsonaro. Até o momento, o chefe do Executivo não deu ordens expressas para o time do ministro Paulo Guedes sobre o tema.
A área econômica é totalmente contra reajustes. Aceitou, na pressão e a contragosto, a ideia de reservar recursos para reestruturação das polícias, mas foi exatamente isso que funcionou como rastilho de pólvora para todo o movimento que se iniciou nas demais categorias.
Agora, o time de Guedes aproveita a confusão para recomendar que ninguém ganhe nada, especialmente as polícias, mas também carreiras como auditores da Receita Federal, AGU e todo o resto. A leitura é que os servidores em grande medida são bem remunerados, não perderam seus empregos e podem fazer mais um ano de sacrifício. Há a visão de que até se pode discutir temas pontuais no futuro, como o bônus da Receita, com custo fiscal bem menor, mas que isso não deveria ocorrer agora. Além disso, movimentos mais generosos de reajustes só poderiam ocorrer se houver a contrapartida de uma reforma administrativa (o que, diga-se, hoje é altamente improvável).
No lado dos servidores, ainda que haja um reconhecimento de que a adesão ficou bem aquém de outros movimentos do passado, a visão é que o objetivo foi alcançado. Ao JOTA, o presidente do Fonacate, que reúne os sindicatos das carreiras de Estado, Rudinei Marques, explicou que o tema foi bastante acompanhado pela mídia e redes sociais e que o governo não teve como ignorar sua existência.
Uma informação muito importante destacada por Marques é que, ainda que o movimento tenha enviado ao governo e divulgado à imprensa que a defasagem pela falta de reajustes desde 2017 seja de 28,15%, há plena consciência de que todas as restrições fiscais impõem que a luta seja por bem menos, algo em torno de 10%, que reporia a inflação de 2022. Assim, na realidade a briga salarial teria um teto que seria da ordem de R$ 12 bilhões para este ano, porque ninguém espera que eventuais aumentos ocorram antes de junho. Para os anos seguintes, o custo dobraria. Na conta do governo, porém, o impacto seria maior, já que cada ponto porcentual de reajuste pode elevar em mais de R$ 3 bilhões a despesa com pessoal ao ano.
Novas mobilizações devem ocorrer na semana que vem e nos próximos meses. É cedo para apostas sobre o desfecho.
Um adendo, chamou atenção hoje que os servidores da Receita Federal ficaram mais distante da mobilização geral, claramente tentando mostrar que a briga deles é pelo bônus e não por reajuste no salário normal pela inflação. Isso até pode adoçar a área econômica, porém não muda o fato de que a medida também significa ampliação de renda de uma das mais privilegiadas categorias do serviço público federal.