Análise

Governo Bolsonaro monta força-tarefa para reduzir danos após crise em Manaus

Planalto teme que agravamento da pandemia em capitais afete popularidade e vê avanço de conversas sobre um impeachment

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Presidente da República Jair Bolsonaro acompanhado do senhor Eduardo Pazuello, Ministro de Estado da Saúde, assina o termo de posse. Crédito: Isac Nóbrega/PR

Um resumo da análise de Fábio Zambeli, enviada aos assinantes do JOTA PRO:

  • Ministros são orientados a culpar governador e prefeito por desvio de verbas enviadas pela União;
  • QG do Planalto teme que agravamento da pandemia em outras capitais afete popularidade do presidente;
  • Blindagem política envolve eleição no Congresso, mas aliados revelam apreensão com cerco a Flávio e Carlos;
  • Mobilização de Huck e Doria preocupa bolsonaristas, que enxergam flanco aberto para “fato novo” na corrida por 2022

O núcleo político do governo de Jair Bolsonaro reconhece, em conversas internas, a gravidade da crise sanitária em Manaus e já considera alta a probabilidade de que o episódio da asfixia da rede de atendimento de saúde local tenha impacto negativo para a popularidade do presidente.

Ministros se reuniram na manhã desta sexta-feira para tentar colocar de pé uma operação de redução de danos à imagem do governo. A tese que vem sendo advogada pelo Planalto é a de que a União fez os repasses de recursos necessários ao Estado e a Manaus, mas as medidas no âmbito regional não foram eficientes.


O governo Bolsonaro também insistirá na tese de que o quadro dramático visto em Manaus não era previsível, visto que a origem seria uma variante do coronavírus “mais transmissível”.

O argumento foi vocalizado pelo vice-presidente Hamilton Mourão e vem sendo replicado em todas as redes de mobilização bolsonarista no ambiente digital. 

A ala militar do governo busca agir numa contenção de danos, mobilizando esforços logísticos e operacionais para transportar cilindros de oxigênio aos hospitais de Manaus e remover pacientes que possam ser atendidos em outras unidades da Federação.

O agregador de agregador de pesquisas de popularidade do JOTA já mostrou um viés de alta na avaliação negativa do governo Bolsonaro em janeiro. A parcela da população que atribui nota negativa (ruim/péssimo) a Bolsonaro passou de 36,2% para 39,3%.

Bolsonaro e Manaus: conversas em Brasília

Os ministros mais próximos de Bolsonaro demonstram apreensão com as conversas que começam a ganhar corpo em Brasília, que, no limite, tratam da governabilidade e das eventuais providências políticas e institucionais que possam ser adotadas no âmbito do Legislativo e do Judiciário para responsabilização do presidente pela calamidade sanitária.

Em privado, interlocutores do governo nos dois Poderes alegam que o próprio STF estipulou o papel do Executivo como “repassador” de recursos, o que supostamente restringiria o raio de ação da Presidência da República em medidas operacionais adotadas pelos entes federados.

A extensão do prejuízo do episódio desta semana na aprovação popular de Bolsonaro ainda depende, segundo esses mesmos auxiliares do presidente, da extensão da crise na rede de atendimento. Se o quadro de colapso vier a se repetir em capitais do Sudeste, por exemplo, a deterioração será inevitável, de acordo com a avaliação dos articuladores políticos do governo.

A orientação expressa de Bolsonaro aos seus ministros e assessores é “responder contra-atacando”. O presidente quer fixar a mensagem de que teria havido desvio de recursos federais nos estados e municípios.

A blindagem política passa essencialmente pela mobilização da base governista legislativa, que está totalmente envolvida na eleição de Arthur Lira para a presidência da Câmara e de Rodrigo Pacheco para a presidência do Senado.

Ao novo comando da Câmara, caberia a apreciação e a eventual deliberação sobre pedidos de impeachment do presidente que chegam ao Legislativo. Ainda que não exista hoje nenhum sinal de que tal procedimento tenha respaldo dos congressistas, a previsão de recrudescimento da crise de saúde, com amplo reflexo econômico, transforma o tema no mais crucial para a segunda metade do mandato de Bolsonaro.

Em outro flanco, operadores do governo também atuam na blindagem jurídica do presidente, visto que existe uma preocupação dos familiares do presidente com medidas tidas como “midiáticas” contra Flávio e Carlos Bolsonaro –o primeiro investigado no caso da rachadinha e o segundo, indiretamente envolvido nas apurações sobre disseminação de fake news e organização de atos antidemocráticos.

Na visão de ministros da área política, essa seria uma maneira de potencializar o desgaste ao presidente com ampliação de investigações e operações policiais que melindrem o seu entorno. 

Sinal amarelo

O Planalto acendeu o alerta para as iniciativas de potenciais rivais na eleição de 2022. O que mais preocupou os bolsonaristas foi a convocação de um panelaço para a noite desta sexta, logo endossado pelo apresentador de TV e presidenciável Luciano Huck.

A reunião de João Doria com Rodrigo Maia e Baleia Rossi, no Palácio dos Bandeirantes, também foi observada como um gesto agudo de antagonismo ao governo com consequências substantivas para o debate político.

Os aliados do presidente indicam que as articulações do “centro político”, caso obtenham adesão da classe artística, de uma parcela do PIB e do universo jurídico-judicial, possam criar um “fato novo” capaz de afetar o sentimento dos eleitores, alimentando a hostilidade a Bolsonaro fora da “bolha da esquerda”.

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