A crise diplomática gerada após o deputado Eduardo Bolsonaro (sem partido) culpar a China pelos danos causados pela pandemia de coronavírus fez com que o presidente da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados, Fausto Pinato (PP-SP), estreitasse o contato com a Embaixada da China no Brasil para evitar retaliações do maior parceiro comercial do país.
“A pergunta que eu faço é a seguinte: o que nós vamos ganhar com isso?”, questionou o deputado Fausto Pinato. “Pior ainda foi o ministro de Relações Exteriores (Ernesto Araújo), ao invés de vir com uma pauta propositiva, apoiar o filho do presidente.”
Pinato participou do webinar promovido pelo JOTA para discutir os impactos do coronavírus nas instituições. O deputado não poupou críticas à política do Itamaraty que, em sua avaliação, podem afetar as relações comerciais dos produtores brasileiros.
O parlamentar disse que há “falta consciência e estratégia” nas decisões do governo. “Eu aplaudo o presidente Bolsonaro quando há uma aproximação com os Estados Unidos, também aplaudo quando se aproxima de Israel”, destacou o parlamentar. “Agora o que não pode ser aplaudido é quando ele se aproxima dos Estados Unidos e quer chutar a China, ou quando se aproxima de Israel e quer chutar os árabes, que são nossos parceiros econômicos”.
Também participou do webinar do JOTA o diretor sênior de políticas públicas e chefe do grupo de trabalho anticorrupção do Americas Society/Council of the Americas, Roberto Simon. Para ele, em termos estratégicos, não faz sentido o Brasil, assim como os Estados Unidos, ter uma postura de embate com China.
“O Trump faz críticas à China porque ele governa os Estados Unidos e o custo político dessa atitude para os americanos é muito baixo”, avaliou Simon. “Já nós, temos a China como principal parceiro econômico e temos uma vulnerabilidade ao país asiático muito maior. Não faz nenhum sentido comprar essa briga”.
Coronavírus e investidores externos no Brasil
Simon também alertou que Brasil e México são os países na América Latina menos mobilizados com relação ao coronavírus. “No domingo (15/3), houve manifestações no Brasil enquanto na Argentina o presidente já tinha anunciado que todas as escolas fechariam, e já tinha fechado boa parte das fronteiras. O Peru tinha decretado estado de calamidade no dia anterior e o Chile imposto quarentenas mandatórias”.
Para Simon, o investidor compara o Brasil com o México, a Turquia e a Indonésia. “Na perspectiva comparada, a reação à crise no Brasil é extremamente preocupante”.
Para o deputado Fausto Pinato, o que se observa é uma incapacidade de reação do governo. “O vírus não escolhe ideologia, o vírus escolhe pessoas, seja de esquerda, de direita, de centro. É preciso ter um espírito público de estadista e patriótico, não um espírito irresponsável, que beira a insanidade”.
Simon destaca ainda que há dúvidas sobre como vai ser a postura do presidente Jair Bolsonaro quando perceber que estamos diante de um quadro grave, que vai tirar muitas vidas e afetar a situação econômica do país.
“Será que no ambiente que a gente tem de mídias sociais e de guerra de versões isso vai se associar diretamente ao presidente? Ou será que a tropa online do presidente vai conseguir mudar a narrativa?”, questionou Simon. “Vai ser difícil não ligar o que esta por vir com as decisões que estão sendo tomadas hoje. Já vemos vozes que estavam sempre ao lado do presidente se distanciando, e vemos protestos pela primeira vez em maior escala”.
O deputado diz acreditar que “a população sente que o país não tem um líder para liderar”. E vai além: “o Brasil precisa combater dois vírus: o coronavírus e o vírus do Olavo de Carvalho”.