Na última semana, o Planalto acendeu sinal vermelho. A apertada aprovação, em primeiro turno, da PEC dos Precatórios fez ressurgir o debate sobre a real dimensão da base governista na Câmara e a capacidade efetiva do presidente Arthur Lira (PP-AL) mobilizar o plenário para votações que exigem maioria qualificada. Mesmo com acordos fechados na undécima hora e das manobras regimentais para permitir até o voto remoto de congressistas em viagem ao exterior, o governo conquistou 312 apoios – apenas quatro acima do mínimo para reforma constitucional.
Embora o tema seja complexo, com o agravante da dificuldade de quórum presencial numa semana de feriadão em Brasília, o resultado gera alguma apreensão no Planalto. O índice calculado pelo JOTA semanalmente indica que a taxa de governismo passou de 70,3% para 67,2% nos últimos 30 dias. Isso significa que os deputados estão deixando as pautas do Planalto e seguindo a orientação de voto do líder do governo em apenas 67% das votações. Logo após Arthur Lira assumir a presidência da Câmara, no início do ano, o índice chegou a 87%, mas vem caindo desde então. A média no ano de 2021 está em 73,6%.
O índice de governismo do JOTA foi criado em 2018 pela equipe de cientistas de dados do JOTA Labs para comparar historicamente o apoio dos deputados a todos os governos desde Fernando Henrique Cardoso. O mapa interativo, disponível aos assinantes do serviço, permite uma consulta sobre o comportamento de cada deputado.
A média da frequência nas votações em 2021 é de 349 deputados. Mas, considerando a presença dos deputados nas votações nominais no Plenário (virtual/presencial) dos últimos 30 dias, esse número cai para 288 deputados. Ou seja, não apenas o grau de adesão ao presidente Jair Bolsonaro tem minguado, mas também a capacidade de trazer as bancadas para o Plenário — mesmo que virtual.
O índice permite saber o tamanho da base de apoio ao governo hoje. Somando os deputados com índice superior a 80%, o governo contaria com uma base de 342 parlamentares com maior probabilidade de defender as propostas de interesse do Executivo.
Como o JOTA adiantou em uma conversa com assinantes na última semana, a PEC dos Precatórios foi analisada num momento de baixo apoio parlamentar ao governo Bolsonaro.
O líder do governo na Casa, Ricardo Barros (PP-PR), mantém o otimismo quanto ao cenário de segundo turno, marcado para a próxima terça-feira. O líder calcula que a base governista mantém uma trajetória ascendente, apesar das turbulências políticas que naturalmente impactam a sua dimensão. Barros afirma que hoje conta com o respaldo de 387 integrantes na Casa — no ano passado, ele avaliava esse contingente em 384 congressistas. “Mas, sempre precisamos de uma margem para fazer frente aos ausentes e aqueles que têm peculiaridades impeditivas em suas bases”, acrescentou.
Base porosa
O cruzamento do índice de governismo com o resultado da votação mostra que a média de apoio ao governo entre os 312 deputados que votaram a favor da PEC dos Precatórios, no primeiro turno, é de 88,6%. Por outro lado, entre os 144 deputados contrários, a taxa de adesão é de 47,3%.
A figura permite entender melhor o resultado apertado e que contou com votos de parlamentares de siglas de esquerda como o PDT e o PSB, que tradicionalmente fazem oposição a Bolsonaro na Casa. Na imagem, os pontos em destaque indicam os deputados com menor e maior taxa de governismo no geral.
Na outra mão, um contingente de 27 deputados com índice de governismo acima de 80%, que não votaram com o governo. Esses são parlamentares que em condições normais de temperatura e pressão seguiriam a orientação do líder do governo na Casa.
Reflexos em 2022
A vitória inicial do governo na votação da PEC dos Precatórios com o apoio decisivo de 17 deputados ligados a partidos da oposição — e com taxa de governismo de até 50% — mexeu até mesmo com o cenário eleitoral de 2022. O pré-candidato Ciro Gomes (PDT), tornou público o seu descontentamento com a posição paroquial de membros da bancada do seu partido suspendendo sua pré-candidatura na disputa presidencial do próximo ano. Ele tenta pressionar os correligionários a serem coerentes com a legenda e com a posição do candidato na votação em segundo turno da PEC, marcada para amanhã.
No passado, quando o partido de Ciro Gomes desistiu de lançar sua candidatura na disputa presidencial de 2010, a principal beneficiada com a decisão do partido foi a candidata do PT, Dilma Rousseff, que passou a pontuar próximo dos 50% de votos válidos.