retrospectiva 2021

As derrotas e vitórias de Bolsonaro no Congresso em 2021 e as perspectivas para 2022

Cientistas políticos avaliam que este ano foi o ‘mais fácil’ do mandato do presidente na relação com o Legislativo 

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O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Crédito: Marcos Brandão/Senado Federal

Este foi o ano mais “fácil” do presidente na relação com o Legislativo, apesar de alguns tropeços no meio do caminho nessa relação, como ocorreu quando os senadores resolveram instalar a CPI da Covid-19 e ir para o enfrentamento contra o governo.

Esta é a avaliação de cientistas políticos ouvidos pelo JOTA para avaliar a relação do presidente Jair Bolsonaro (PL) com a Câmara e o Senado neste ano e apontar quais foram as principais derrotas e vitórias do governo e as perspectivas para 2022. 

O ano mais “fácil” para o governo tem relação direta com a troca nos comandos da Câmara, agora com Arthur Lira (PP-AL) no lugar de Rodrigo Maia (sem partido-RJ), e do Senado, com Rodrigo Pacheco (PSD-MG) em substituição a Davi Alcolumbre (DEM-AP). 

O Palácio do Planalto encerrou 2021 com duas grandes vitórias no Congresso: as aprovações de André Mendonça ao Supremo Tribunal Federal (STF) e da PEC dos Precatórios, meio encontrado para abrir espaço fiscal para o Auxílio Brasil. É essa a aposta bolsonarista para elevar os índices de popularidade do presidente no ano eleitoral. 

“Lira, como presidente da Câmara, deu essa tranquilidade a Jair Bolsonaro que Rodrigo Maia não dava”, afirma o cientista político Paulo Baía, professor da UFRJ. “A partir do comando de Lira e Pacheco, não houve um domínio de Jair Bolsonaro sobre o Congresso, entretanto, o Congresso cedeu ao presidente o que ele precisava, incluindo a aprovação de André Mendonça ao Supremo Tribunal Federal. O Congresso não se submete totalmente à fala de Bolsonaro, mas ele também não se contrapôs ao presidente. Foi uma legislatura ambígua essa de 2021”, completa.  

Na campanha presidencial, aliados de Bolsonaro torciam o nariz para o centrão. Mas se renderam a ele para buscar governabilidade. “Com Arthur Lira no comando da Câmara, o centrão voltou a ter o protagonismo que tinha com Eduardo Cunha. O centrão nadou de braçada em 2021, e isso vai ter desdobramentos em 2022”, avalia Baía. 

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No meio do caminho, apesar de toda a crise institucional que se instalou com declarações de Bolsonaro que eram vistas como ameaças à democracia, o Congresso não deu sinais de que poderia entrar numa queda de braço com o presidente e, muito menos, avançar num eventual processo para tirá-lo do poder. “A maior vitória de Bolsonaro foi a Câmara e o Senado darem a tranquilidade para que ele fizesse o governo a seu estilo, falasse o que falasse, sem ser ameaçado constantemente por um processo de impeachment”, analisa o professor da UFRJ. 

É consenso que o meio de o governo Bolsonaro buscar a governabilidade mudou neste ano. De início, o presidente não tentou governar com o apoio de partidos, mas optou por apostar nos votos em varejo, o que, claro, dificulta a previsibilidade nas votações.

“Como ele não compôs o governo [com apoio dos partidos], não tem como esperar [o número de votos]. Então, cada coisa que Bolsonaro precisa [aprovar no Congresso], precisa construir apoio, e isso fica muito caro. Nos primeiros anos de mandato, ele não conseguiu montar esse apoio. Nesse terceiro ano talvez tenha sido o momento em que ele foi mais bem sucedido nessa construção”, avalia Graziella Testa, professora da Escola de Políticas Públicas e Governo da FGV. 

Na Câmara, sobretudo, Bolsonaro apostou na centralização de Lira, de quem recebeu apoio para o encaminhamento dos projetos. As emendas do relator – criadas por Bolsonaro e aplicadas a partir de 2020 – também ajudaram e muito na governabilidade. Trata-se de um mecanismo criado pelo Orçamento Impositivo que dá ao relator da Lei Orçamentária Anual (LOA) o direito de encaminhar emendas que precisam ser priorizadas pelo Executivo. Essas despesas não são claramente discriminadas nos sistemas de controle da execução orçamentária. Por isso, ganharam a alcunha de “orçamento secreto”.

“Em relação aos primeiros anos, Bolsonaro realmente encontrou alguma forma de ver sua agenda aprovada ainda que não seja absoluta, ainda que não seja uma boa governabilidade, e nem barata. É uma governabilidade excepcionalmente cara. O presidente passou boa parte do ano sem partido político e com uma perspectiva eleitoral em 2022 e isso o tornou cobiçado pelos partidos. Facilitou um pouco essa governabilidade”, opina Graziella. “É esperado que 2022 seja um ano conflituoso, mas não acho que será pior do que foram os dois primeiros anos do mandato do presidente”, completa. 

Fora a própria relação de Bolsonaro com o Congresso, Graziella alerta para pautas que estão sendo articuladas pelos parlamentares para o próximo ano. Uma delas é sobre o grupo de trabalho que está avaliando a reforma do regimento interno na Câmara. “Isso pode ter impactos muito importantes e é preocupante porque boa parte do que está sendo discutido no grupo, e foi colocado como sendo o objetivo de deliberações, são ações que Arthur Lira poderia tomar sozinho. Ele não precisaria colocar um grupo de trabalho para discutir”, diz a professora da FGV, explicando que mudanças assim aumentam a centralização em torno do presidente da Casa e reduzem a participação da sociedade civil nas discussões. 

Para Maria Teresa Kerbauy, professora do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e de Ciência Política da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), o governo Bolsonaro se alinhou com o Congresso em 2021 na tentativa de evitar o impeachment. Porém, medidas como as reformas administrativa e tributária, que atenderiam a uma agenda liberal do ministro da Economia, não avançaram. 

Com relação às eleições de 2022, segundo Kerbauy, a distribuição do orçamento secreto será muito importante para a definição dos candidatos à Câmara. Até o momento, ainda não é possível fazer previsões das votações para essa Casa. 

A cientista política explica que, na literatura da ciência política brasileira, havia um consenso de que as eleições municipais não tinham influência nas eleições presidenciais e estaduais. Porém, Kerbauy observa uma alteração desse olhar para as próximas eleições devido à discussão sobre os arranjos federativos e ao fim das coligações.

Eleições de 2022

Na avaliação de Maria do Socorro Braga, coordenadora do programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFSCar e do Núcleo de Pesquisa dos Partidos Latino Americanos (Nepla), os líderes do Congresso apoiaram o governo em 2021. O presidente da Câmara se mostrou mais atrelado ao Executivo, enquanto Rodrigo Pacheco se manteve mais afastado. 

Mas, em 2022, especialmente na campanha eleitoral, essa relação dependerá da capacidade de Bolsonaro em manter ou ampliar sua base eleitoral atual, que gira em torno de 25%. Caso o presidente não a mantenha, espera-se que Lira e outros partidos do centrão apoiem candidaturas com maior poder de vitória. Já Pacheco se encontra em um partido dividido, com alas que apoiam o atual presidente e outras que querem independência para lançar candidaturas próprias. 

Braga aponta que o presidente tentará usar a máquina estatal a seu favor para diminuir os efeitos da crise na economia e manter seu eleitorado. A agenda moral é outro ponto de destaque para Bolsonaro. Com a nomeação de André Mendonça para o STF, ele obteve um trunfo junto ao segmento evangélico. “É um eleitorado super importante para qualquer candidato, mas, com certeza, Bolsonaro tem vantagens para ampliar essa base”, afirma. 

Além dos evangélicos, Bolsonaro também terá de entrar novamente em acordo com os militares. Em 2018, eles foram relevantes para a campanha bolsonarista, tendo indicado inclusive o vice da chapa, Hamilton Mourão (PRTB). Mas, para Braga, o presidente e seus comportamentos políticos se chocam com uma ala dos militares que esperam outra atitude. Esse conflito tem levado à saída de vários fardados do governo. 

Esse ponto, no entanto, é delicado e ainda pode se alterar, já que um dos objetivos do apoio dos militares a Bolsonaro foi, segundo a professora, não deixar ao PT nenhuma possibilidade de retorno. “Quanto maior a tendência do Bolsonaro se manter enquanto único candidato que derrotaria Lula, maior a tendência de eles manterem o apoio.”

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