
Três ministros do Superior Tribunal de Justiça votaram nesta quarta-feira (2/12) pela abertura de inquérito para apurar a prática de crimes pelo desembargador Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira no caso em que ele destratou um guarda municipal em Santos (SP). A análise da situação foi submetida à Corte Especial do tribunal, e, até o momento, cinco ministros votaram, sendo dois a favor do arquivamento e três pela instauração do procedimento. O julgamento foi interrompido pelo pedido de vista da ministra Laurita Vaz.
O caso veio à tona após a divulgação, em julho, de um vídeo no qual Siqueira destrata um guarda municipal que exigiu o uso da máscara de proteção à Covid-19. Nas imagens o desembargador chama o guarda municipal de analfabeto e rasga a multa aplicada por ele.
A discussão sobre a abertura ou não de inquérito contra o desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) está no STJ por conta do foro privilegiado do magistrado. Se o tribunal permitir a abertura do inquérito, o procedimento pode resultar em ação penal contra o desembargador. Em outubro, o ministro Raul Araújo, em decisão monocrática, arquivou o pedido de abertura de inquérito. Para ele, não há crime na conduta do magistrado e ele deve ser responsabilizado nas esferas administrativa e cível, mas não na penal.
O Ministério Público Federal (MPF) recorreu da decisão do ministro e, por isso, a discussão chegou ao colegiado. Para o MPF, o desembargador cometeu abuso de autoridade, infração de medida sanitária e desacato a funcionário público.
Durante a sessão da tarde desta quarta-feira (2/12) o relator defendeu o arquivamento por entender que não há elementos que justifiquem a abertura de um inquérito. “O desembargador evocou sua condição de agente público para se liberar da obrigação de usar máscara por estar na firme convicção da inexistência de lei dando suporte à imposição e, por isso, embora de forma reprovável e repulsiva, exerceu seu direito de resistência”, afirmou durante a leitura do voto nesta quarta. O ministro Napoleão Nunes Maia Filho acompanhou o relator.
O ministro Francisco Falcão divergiu de Araújo por entender que o inquérito deve ser aberto e as investigações devem ocorrer. “Esse é um dos episódios mais vergonhosos da magistratura. O relator não poderia ter arquivado de pronto, deveria ter trazido à Corte, por isso, dou provimento ao agravo do MPF”, afirmou Falcão. A ministra Maria Thereza de Assis Moura e o ministro Luís Felipe Salomão também entenderam pela necessidade de apuração dos fatos e abertura do inquérito.
O presidente do STJ, ministro Humberto Martins, que não votou, lembrou que quando foi corregedor do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) o órgão deliberou providências sobre o caso, inclusive pedindo atuação do MPF. A ministra Laurita Vaz informou que pretende analisar o caso até a próxima sessão da Corte Especial, prevista para 16 de dezembro.
Medidas administrativas
Em julho de 2020, o desembargador Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira, do Tribunal de Justiça de São Paulo, foi flagrado humilhando um guarda civil municipal de Santos, no litoral de São Paulo, após ser multado por não utilizar máscara enquanto caminhava na praia. Um vídeo foi feito e circulou em redes sociais e no noticiário. Nas imagens, o magistrado chama o guarda municipal de analfabeto, rasga a multa, joga o papel no chão e supostamente telefona para o secretário de Segurança Pública do município, com o objetivo de intimidar o guarda e mostrar influência.
Em agosto, do CNJ instaurou Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra o desembargador, com afastamento das funções. Por unanimidade de votos, o colegiado acompanhou o entendimento do corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, relator do caso, que considerou que há indícios suficientes do cometimento de infrações disciplinares pelo desembargador.
Na ocasião, o corregedor entendeu necessário o afastamento do magistrado de suas funções, em razão da gravidade dos fatos, da possibilidade de reiteração da conduta e por sua permanência configurar ameaça às “aspirações dos jurisdicionados de serem julgados por magistrados que não só sejam, mas também transmitam à sociedade, pelo seu comportamento funcional e social, a imagem de agentes políticos probos e imparciais”, concluiu o ministro Humberto Martins.